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Por Gilson Moura Henrique Junior
Pra discutir anarquismo e organização social na conjuntura atual é preciso primeiramente definir um quadro de raro crescimento da anarquia como ideologia no interior da sociedade brasileira desde os primeiros anos do século XX, arrisco dizer.
A partir do entendimento da dimensão histórica do crescimento do ideário anarquista na sociedade brasileira após décadas de hegemonia quase absoluta do pensamento socialista partidário podemos começar a avaliar os desafios desse tipo de crescimento para coletivos e organizações anarquistas.
Primeiro porque se esse crescimento efetivamente atua no rastro do vácuo que a cooptação dos partidos de esquerda pela institucionalidade deixa, ele também compete com a ocupação deste vácuo por forças conservadoras.
Além disso, a ocupação de espaços da esquerda partidária nas periferias, comunidades, universidades e sindicatos torna anarquistas e autonomistas inimigos prioritários das forças partidárias de esquerda, até mais inimigos que as forças conservadoras, dado quea lógica de exercício da política a partir da ocupação de espaços é eixo central da metodologia de efetivação da política partidária. Perdendo espaço dentro do seu campo clássico de atuação, a esquerda partidária passa a ter de disputar capital político em duas frentes, no espaço externo a seu terreno prioritário de atuação com a direita tradicional e no interior de seu espaço “natural” de ocupação com a esquerda não partidária.
Acostumada à hegemonia absoluta, aesquerda partidária atua de forma flagrantemente truculenta na disputa poíltica no interior de seu campo, utilizando detodas as manobras possíveis para realizar a manutenção desta hegemonia. Para completar, ao ler que capital político se reflete em voto e a ocupação do aparato institucional e estatal é objetivo estratégico e não só tático (seja no parlamento ou em sindicatos,grêmios e DAs), a esquerda partidária acaba entendendo que a defesa do Estado e da “república” é objetivo a priori, com esse entendimento entra em conflito com a ideia de revolução e passa a uma contradição inerente entre discurso e prática,onde defende ruptura no discurso e na prática atua na manutenção do status quo, usando como álibi a defesa do estado de direito como parte da defesa dos direitos humanos fundamentais.
Essa contradição fica mais gritante quando essa defesa do estado de direito como parte da defesa dos DH acaba por pouco fazer para protegê-los quando as vítimas das violações de DH são inimigas deseus objetivosem seu próprio campo,e ai começa o debâcle.
Esse débâcle da esquerda partidária ocorre com sua degeneração ética, moral e política. E não ocorre apenas aqui.
A omissão internacional dos partidos socialistas com relação à perseguição do estado a anarquistas é o fundo do poço da forma partido e a cereja do bolo cuja receita é conciliar na institucionalidade enquanto ataca toda força política contra hegemônica fora da institucionalidade.
Hoje os partidos socialistas (do Syriza ao PSOL, do Bloco de esquerda de Portugal ao PODEMOS) são a medida entre a conciliação com a direita pra tentar uma vaga no estado e o serviço sujo de ser sócia do estado da criminalização da esquerda não partidária. No fim das contas a esquerda partidária mundo afora elegeu a esquerda não partidária como inimiga e a centro direita liberal como aliada.
Hoje a esquerda partidária é parte do capital e não apenas na utilização do estado para construir seus nichos de poder e na conciliação com a direita liberal paragarantir direitos no plano comportamental ou que não incorrem diretamente com corte de classes claro. A esquerda partidária também é parte do capital ao estruturar-se de forma fordista na sua organização interna.
Ao tornar-se uma reprodução do estado e da organização fordista em sua organização interna a esquerda partidária concorre para a manutenção das desigualdades, da hierarquia, da concentração de poder e da opressões. Reproduzindo em seu interior a hierarquia, a divisão de classes, a especialização e a separação entre tipos diferentes de trabalho (divisão entre intelectuais e base operária e trabalhadora),típicas do fordismo e da hierarquia do capital, a esquerda partidária atua como linha auxiliar rebelde da hegemonia de pensamento capitalista.
Por isso nela o peso da defesa do estado e da república, da centralização e da hierarquia, é superior que a defesa da descentralização, da desierarquização, da desestatização e da produção nuclear do poder, dinamitando a hierarquia. Por issoquequem defendealgo similar étornado inimigo,enquanto liberais são mais que aliados, são co-formadores de política e programa.
Assim é cristalino que a defesa difusa dos DH, direitos LGBT, do feminismo e racismo, apartados de sua discussão enquanto elemento de luta para superação transversal e estrutural do arcaísmo da sociedade e infectado obviamente pela questão de classe, torna-se eixo central da política que a esquerda partidária leva a cabo, sem jamais discutir tudo isso com o necessário corte de classes e com a necessária horizontalização para que o Estado, fiador de todas as opressões, deixe de existir junto com toda a hierarquia.
Quando vemos o debate sobre direitos LGBT praticamente centrado na defesa do direito ao casamento; o debate sobre prostituição centrado na defesa do direito liberal das mulheres a se prostituírem; o debate sobre racismo pautado basicamente na defesa de reparação pelo estado; o debate ambiental centrado em sustentabilidade, e não na superação do capital como um todo (Da sanha produtivista à centralização causadora da ruptura metabólica do meio ambiente), que permite que se denuncie danos ambientais sem mexer com combustíveis fósseis, matriz energética e centralização da produção com o parte fundamental do debate ambiental; e toda discussão sobre indígenas e quilombolas passando ao largo de todo processo de sua identidade cultural e visão política, da lógica não hierárquica de muito de suas organizações e de percepções díspares da cultura hegemônica, quando vemos tudo isso o que vemos é a aliança política entre esquerda e liberais na produção de política, com abandono inclusive de toda pauta de debate da própria esquerda socialista que inclui nisto tudo a revolução e a superação sistemática do capital,dentro e fora de todas estas questões.
E no que a anarquia (E o autonomismo e toda ideologia libertária horizontalizante) pode ser alternativa ideológica à esta esquerda? Primeiro deixando de centrar-se no combate ao voto, reproduzindo com sinal inverso a ideologia do Estado como parte estrutural do debate político. Em segundo lugar deixando de entender-se de forma iluminista como salvadora da humanidade e percebendo a diversidade da produção teórica e de ação política sobrevivente e alternativa aos mantras quase teológicos do marxismo-leninismo. Dai em diante anarquistas, autonomistas,etc devem exercitar a ação horizontalizadora e desierarquizante das ideias produzidas dentro deste marco ideológico. Construindo núcleos de ação popular nas diversas localidades, classes,bairros,etc e atuando de forma a produzir do local pro geral uma ideia de sociedade sem amos,nem um pouco interessada na construção de figuras públicas para eleição de prefeitos, deputados ou outros cargos mantenedores das finanças da burocracia.
Base teórica pra construir essa política não falta, além de não ser refém de leituras estanques do início do século XX.
O importante é perdermos o medo de sair pras ruas e ocupar espaços abandonados enfrentando o estado em todas as suas formas, fugindo da ditadura de uma suposta unidade filha dileta da centralização hierarquizante que busca uma síntese opressora vivida e construida por consensos falsamente construídos ou por votações manobradas.
É fundamental construir coletivamente saídas que contemplem cada localidade e que sejam ferramentas de avanços locais que concorram para unidades percebidas horizontal e coletivamente sem perda de direitos e de propostas,cujo consenso ou sua ausência sejam resolvidos sem a hierarquização repressora.
Não há receita de bolo, cada povo,cadarua,cada cidade tem seus modos de ver,sentir e agir. Transformá-los em um Estado, um país,um Estado-Nação,falantes de uma só língua, já foi uma violência opressora. Dar a eles saídas que não são deles seria outra.
É preciso que sejamos alternativa, até para resistirmos à opressão coletiva do estado e de seus aliados,partidos de esquerda incluídos.