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Anarquia ou Barbarie

~ A anarquia é a percepção ecológica da sociedade, é o entender a participação livre de cada membro da coletividade como fundamental para a existência, para o exercício da verdadeira cidadania que é viver na coletividade respeitando a diversidade. Anarquia é coletivamente sermos o poder, é todos nós decidirmos em conjunto, de forma horizontal o que fazermos em nossas vidas e em nossos bairros, cidades….

Anarquia ou Barbarie

Arquivos de Categoria: Anarcosindicalismo

Há muitas Anarquias! Leia sobre elas, pergunte menos nas redes sociais.

03 quinta-feira mar 2016

Posted by litatah in Anarco Ecologia, Anarco Feminismo, Anarco Primitivismo, Anarco Punk, Anarco-Comunismo, Anarcosindicalismo, Anarquia, Anarquia Verde, Anarquismo Especifista, anarquismo no Brasil, Anarquismo no Paraná, Análise de Conjuntura, Partidos, Institucionalidade,, Correntes da Anarquia, Imaginário e Plano Simbólico, Municipalismo Libertário, Plataforma, Sem categoria

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anarquia, anarquia e ordem, anarquia ou barbarie

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Por Gilson Moura Henrique Junior

Perguntas genéricas como “anarquista pode comer carne de porco?” ou “anarquista trabalhar pra comer é incoerência?” não vão muito longe, não ajudam exatamente a dirimir dúvidas sobre anarquia ou a melhor forma de militância anarquista. Pior, no fundo é preguiça, porque não procura ler sobre anarquia, quer só a solução fácil.

 
Claro, há trocentas pessoas entre bem intencionadas ou carentes de serem messias dos novatos para responder as perguntas, e ambos ai se satisfazem com o papel de transformar o debate meio bobo em algo parecido com conscientização, só que no fim todos ganham apenas a satisfação momentânea do ego.
 
Anarquia é muita coisa, anarquistas são muitas coisas. Tem anarco sindicalismo, anaco primitivismo, anarco ecologia, anarco feminismo, anarcos queer, plataformistas, makhnovistas, municipalistas libertários, anarco new age e por ai vai.
 
Anarquia não é um sistema de crenças, nem um sistema politico centralizado em dogmas fáceis, em regras rígidas, a ordem na anarquia é a diversidade de saídas, percepções e construções.
 
Há anarco veganos, há quem não vincule anarquia à forma de alimentação.
 
Há federalistas, há isolacionistas, há milhares de formas de se organizar de forma anarquista.
 
Há ao anarco individualismo, há as zonas a Defender, dá pra ser anarquista sozinho ou em coletivos, e até em federações.
 
Há anarquistas autoritários, como há anarquistas libertários.
 
Dá até pra ser anarquista machista ou liberal se chamando anarquista ou anarquista de estilo de vida, que tem pouco ou nada de anarquista,mas fala que é pra ficar bem na fita da rebeldia.
 
Não deveriam haver anarquistas não anarquistas,mas os há também.
 
Confuso? Não, porque anarquia não contempla uma definição unitária e autoritária de si mesma e nem fica fiscalizando quem a pratica pra ver se seguiu Bakunin direito.
 
Dá até pra ser anarquista sem ler sobre anarquia, é o anarco preguiçoso, muito comum nas redes sociais. Ele também é anarquista, poderia ser um anarquista melhor se lesse as diversas tendências anarcas e se organizasse, sozinho ou coletivamente, pra produzir ações anarquistas.
 
Ah, não se esqueçam, esperar uma sociedade anarquista no futuro é que nem esperar papai Noel, anarquismo é aqui e agora. Essa busca de uma sociedade futura que um dia virá após um evento escatológico semi religioso chamado Revolução tem mais chance de dar certo em partidos socialistas.

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PEDAGOGIA LIBERTÁRIA, EDUCAÇÃO POPULAR E ANARQUISMO*

28 quinta-feira jan 2016

Posted by litatah in AIT-SP Núcleo de Lisboa, Anarcosindicalismo, Anarquia, Educação Libertária, Internacional anarquista, portugal, Teoria

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AIT-SP Núcleo de Lisboa, Educação, educação libertária, pedagogia libertária, Teoria, teoria anarquista, teorias anarquistas

educacion-libertaria-5Fonte: AIT-SP Núcleo de Lisboa

Ao abordar  o tema PEDAGOGIA (ou PEDAGOGIAS) LIBERTÁRIA não podemos  deixar de o ligar à sua génese ANARQUISTA e à figura de Ferrer Guardia e à sua ligação ao movimento anarco-sindicalista do  início do século 20.  Mais do que qualquer outra, a ideia de uma escola moderna, e de  uma educação baseada no racionalismo e na desmontagem de todas as superstições religiosas sociais e políticas, a iniciativa de Ferrer  Guardia ia a par do desenvolvimento de um proletariado combativo e organizado contra a exploração capitalista e a opressão do Estado – e tinha como alvo a educação integral das crianças filhas do proletariado, fora das mordaças das igrejas e dos poderes do Estado e do Capital. E foi por isso, no seguimento dos grandes levantamentos operários e populares, sobretudo na Catalunha, que Ferrer Guardia foi condenado à morte e fuzilado, aliás, no mesmo ano (1906) em que é criada a anarco-sindicalista CNT – Confederación Nacional del  Trabajo. À monarquia  espanhola e aos privilegiados latifundiários e senhores da indústria, não convinha uma escola que ensinasse aos proletários e seus filhos, que não é no “Céu”, depois de mortos, que há que alcançar qualquer “paraíso” mas sim aqui na Terra, onde as desigualdades, as opressões , as injustiças existem…-e que há que lhes pôr fim.

Com efeito, nesse período, não apenas em Espanha mas em muitos outros países –e em Portugal também – o desenvolvimento do movimento anarquista e das organizações operárias, como os sindicatos revolucionários (UON primeiro e CGT mais tarde), associações populares, cooperativas, ia a par da criação de escolas operárias nesses organismos de base, de círculos de estudos sociais, de grupos de alfabetização, dos quais, os principais centros industriais  como o Porto, Lisboa, Setúbal , foram férteis. Nesse mesmo período, em Inglaterra foi criada a “Pleb´s League”, a Liga dos Plebeus, com o objectivo expresso de cultivar e instruir o proletariado inglês daquele tempo, a braços com a exploração infame a que a “democrática” burguesia britânica o submetia, com jornadas de trabalho de sol a sol, com trabalho infantil, com aviltantes e terríveis condições de trabalho…

A par do desenvolvimento das lutas sociais foram-se sempre desenvolvendo entre os meios laborais experiências de (auto-)educação popular, desde as experiências da escola de Goulai-Poulai, na Ucrânia, animada por Tolstoi em meados do século 19, à Alemanha dos anos 20 com as Comunas Infantis em Berlim e Hamburgo, ligadas ao desenvolvimento da FAU-D (Freie Arbeiter  Union – Deutschland , secção alemã da AIT ) como de resto, na mesma época, em Inglaterra, na Suiça, na Itália, na França, na Áustria e na Holanda, e nada disso está separado de movimentos operários – que tentam contrabalançar o crescendo nacionalista, fascista e nazi.

Seguir-se-ão as experiências  de redes de educação popular , durante a ocupação nazi da França, animadas pelo autodidata Freinet, e mais tarde, a alfabetização e educação popular nas favelas brasileiras, impulsionadas através das ideias da Pedagogia do Oprimido, de Paulo Freire, às escolas dos “assentos” dos Sem Terra, nas ocupações de terras do Brasil e nas ocupações no México do ZPLN e dos Magonistas.
Algumas destas experiências decerto que escapam por vezes à classificação de LIBERTÁRIAS  no sentido ideológico do termo, mas abrem brechas na chamada “educação institucional”- sempre tendente a formatar crianças e adultos nos “valores” dominantes ( a competição, o afastamento da lutas sociais, o egoísmo social, etc.).

Algo profundamente ligado ao conceito de EDUCAÇÃO LIBERTÁRIA é o AUTO-DIDATISMO organizado,  e as várias experiências surgidas na Suécia  (O. Olssen) e na Alemanha após a II Guerra Mundial e durante os anos 60 e 80: os Círculos de Estudos, organizados pelas próprias pessoas interessadas num dado tema e que tanto serviriam para apreender  em pequeno grupo uma qualquer técnica como para conhecer uma qualquer obra literária. Um seu desenvolvimento na  Berlim “alternativa” dos anos 80  foram também as “Bolsas de Aprendizagem” (Lernen Boerse),  orientadas segundo uma “velha” máxima  de B.Brecht, que dizia que “se o que não sabe é um ignorante, o que sabe e não passa aos demais aquilo que sabe é um criminoso”…

Muitos outros exemplos se poderão dar ainda de movimentos activos de educação e pedagogia libertária e educação popular no mundo inteiro. Também hoje, aqui e agora , frente à “crise” que banqueiros e governantes impõem que seja a maior parte da população pauperizada a pagar, frente ao aumento do ”intox” oficial (consome, consome, “empreendedorismo”,  lixa-o-parceiro-do-lado-para-

teres suce$$o, etc, etc…) nos tentam a todas e todos fazer aceitar as soluções vindas do alto da burra ou do alto do Estado.  E enquanto nos preocupamos com que nós e os nossos filhos possamos ter o último modelo de “té-lé-lé”, ELE$, os de cima e os de sempre, vão-nos roubando o tempo e a vida! É tempo de os recuperarmos! É tempo de ler mais e ver menos TV!
É tempo de criarmos entre nós CIRCULOS DE ESTUDOS LIBERTÁRIOS, GRUPOS DE AR LIVRE E AVENTURA COM OS MAIS NOVOS – a par de todas as iniciativas populares e laborais com que possamos “meter o pauzinho nas engrenagens que nos apertam”…
Por nós, tentamos dar alguma ajuda nesse sentido.
*Texto de Zé P. (militante anarco-sindicalista)
Dez.2015

Círculo de Estudos Sociais Libertários – c/ Sindicato de Ofícios Vários da A.I.T.-SP, Porto

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Aos pintores da União dos Operários em Construcção Civil

11 segunda-feira jan 2016

Posted by litatah in Anarcosindicalismo, Anarquia, História, Marques da Costa, Núcleo de Pesquisa Marques da Costa, syndicalismo revolucionario, União dos Operarios em Construcção Civil

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A BATALHA (anarco-sindicalista, anarco-sindicalismo, “Movimento Operario” de “O Paiz, História, história da anarquia, História do Anarquismo, História Social, jornal A Pátria, Marques da Costa, Núcleo de Pesquisa Marques da Costa, sindicalismo revolucionario, syndicalismo revolucionario, Teoria, teoria anarquista, teorias anarquistas, União dos Operarios em Construcção Civil

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Fonte: Núcleo de Pesquisa Marques da Costa – Memória é Luta!

Néo-Syndicalistas, portadores de formulas velhíssimas, que a pouco e pouco vão sendo universalmente rejeitadas.

Anda mouro na costa!…

Aquelles que se têm esforçado por manter incolumme o syndicalismo revolucionario tantas vezes “aggredido”, quantas tem sido alvo de sordidas mystificações, são concitados pelo presente brado de alerta! , a occupar seu posto de combate e a assestar suas armas contra os que neste momento se preparam para uma nova incursão.

Sim, nova incursão!

Não é a primeira vez que se premedita levar por deante tentativas de deturpação dos principios e finalidades do syndicalismo revolucionario.

A differença só existe nisto: antes essas tentativas de deturpação opportunista provinham do elemento burguez, agora são outros os interessados na “falsificação”,,, do systhema.

Mas vejamos quaes são as poderosas razões do nosso alerta!

No “Movimento Operario” de “O Paiz”, está sendo publicado o seguinte manifesto:

“Organização de syndicatos por officio – Aos Pintores – O estado de estagnação em que se encontram os trabalhadores da Construcção Civil é de tal ordem, no que concerne à organização, que nos obriga a meditar sobre os meios mais practicos a empregar, para obtermos um organismo que corresponda  “in totum” à aspiração dos trabalhadores.

A experiencia nos indica que nesta industria o Syndicato de officios, com a organização da respectiva federação a seguir, dará melhores resultados que até hoje tem dado organizados em União.

Por estarmos convictos de que assim é, e não nos conformando com o estado de desorganização em que nos encntramos nesta industria, é que, nós, antigos militantes nos constituímos em comité para organizarmos o Syndicato dos Pintores e Annexos.

Para organizarmos o syndicato, que está nos moldes syndicalistas-revolucionarios, contamos com a boa vontade dos companheiros e rogamo-lhes para que estejam attentos à convocação que faremos publicar nos jornaes diarios desta cidade, em muito breve tempo e em local que indicaremos.

Assim organizados por officio, crearemos alma nova, seremos o que já fomos!

Sem desfallecimento para a organização do Syndicato dos Pintores e Annexos – O Comité.”

Como se vê, os membros desse comité, que demonstram ser velhos conhecedores dos methodos de organização profissional e industrial, não revelam o seu nome, o que neste caso seria de importancia capital, afim de incutir na classe a que se dirigem a necessaria confiança para o desejado exito da arrojada iniciativa.

Entretanto, está-se a ver donde virão os elementos que pretendem fundar “um organismo que corresponda “in totum” à aspiração dos trabalhadores”.

A União dos Operarios em Construcção Civil, que é, indubitavelmente, uma das poucas associações que têm sabido no Brasil, manter-se fieis interpretes do syndicalismo revolucionario, tem em seu seio a grande maioria dos pintores que já foi possivel organizar no Rio de Janeiro; em embora soffra, como realmente soffre, o effeito da grande crise que neste momento assoberba todas as organizações operarias do paiz, nada provou, até agora, que a organização por industria dê resultados tão insatisfatorios que os pintores sintam necessidade de se organizarem profissionalmente, fora do local da União.

Nós estamos daqui a adivinhar os intuitos dos néo-syndicalistas, que devem ser os mesmos intuitos dos federalistas de Estado…Mas não queremos ir longe, por agora, para que não torçam as nossas previsões.

Desejamos, todavia, prevenir os incautos, e vamos fazel-o de modo que fique patenteado a maneira pela qual os membros desse “comité syncicalista revolucionario” podem dar provas das suas boas intenções, dos seus propositos que nós presumimos serem nada mais nada menos que divisionistas, antilibertarios portanto.

Na U.O.C.C. observa-se a mais rigorosa autonomia de acção. Cada qual pode tomar a iniciativa que lhe aprouver – correndo apenas o risco de ter ou não o apoio dos seus companheiros.

Se o referido comité está sendo composto de syndicalistas revolucionarios, tão estudiosos da questão syndical que até já concluiram haverem de promover a organização por profissões, não é crível que tenham estado até agora alheios ao único organismo que, desde 1917, tem sido o coordenador da acção de todos os “pintores revolucionários”. Se fizerem, em qualquer tempo, parte ativa da União dos O. em Construcção Civil, por força tomaram conhecimento dos reaes principios de liberdade que a orientam e, “ipso facto”, sabem que jamais foi vedado ali o direito de reunião parcial.

Ao contrario. Na U.O.C.C. sempre se admitiu a constituição das secções profissionaes (que a nosso ver estão peremptoriamente constituidas, reunindo-se, ou não, conforme as necessidades circumstanciaes o exijam). Logo, tal comité é suspeito, só pode ser formado por elementos que pretendam fazer da organização operaria o que esta já tem sido nas mãos de certos aventureiros políticos.

E não me dirijo propriamente à classe dos pintores, a quem se pretende ludibriar sob o pretexto de que só por syndicatos profissionaes será possivel conseguir o bem estar almejado por todos os productores da terra. Não. Dirijo-me aos pintores que teem sabido occupar o seu logar na vanguarda dos syndicalistas revolucionarios, certo de que elles saberão impedir a consumação dessa obra de divisionismo que se está tramando nos escuros corredores do politicismo obreiro.

Marques da Costa

Artigo publicado na Secção Trabalhista do jornal A Pátria (Rio de Janeiro), no dia 13 de julhode 1923.

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A greve geral de 1917

11 quarta-feira nov 2015

Posted by litatah in Anarco-Comunismo, Anarcosindicalismo, Anarquia, Greve Geral de 1917, História

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Greve Geral de 1917, História, história da anarquia

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Fonte: Historiando

Por Ligia Lopes Fornazieri

Nas primeiras décadas do século XX, houve um crescimento das cidades brasileiras acompanhado pelo aumento da atividade industrial. Algumas cidades concentravam fábricas e serviços, reunindo centenas de trabalhadores. Como nos centros urbanos havia mais liberdade e uma maior circulação de idéias, a possibilidade de organização e de reivindicação dos trabalhadores crescia em relação àqueles que se concentravam nos meios rurais.

Apesar de ter sido limitado, o movimento dos trabalhadores na Primeira Repúblicateve alguns momentos de grande mobilização e um deles foi a greve geral de 1917, que se tornou um ato simbólico e único nesse período.

Para entender o desenrolar deste episódio, é importante caracterizar a situação da cidade de São Paulo no começo do século.  O impulso na transformação da cidade em grande centro urbano se deu entre 1890 e 1900, sob o influxo da imigração estrangeira e graças, em grande parte, à expansão cafeeira.

Algumas greves foram deflagradas desde o início do século, como a greve dos ferroviários da Companhia Paulista de 1906; a greve ocorrida no Rio de Janeiro em 1907; e em 1912, houve também uma onda de greves na cidade de São Paulo. Todos esses movimentos tiveram em comum um conjunto de reivindicações: estabelecimento da duração da jornada de trabalho em 8 horas diárias, aumento salarial, melhoria nas condições de trabalho, etc. Vale lembrar que até 1930, não havia uma regulamentação sobre as condições de trabalho nas indústrias.

Os protestos realizados pelos trabalhadores em São Paulo e no Rio de Janeiro tinham algumas diferenças, mas compartilhavam características comuns: falta de continuidade dos movimentos e fragilidade de organização. Por conta disso, durante algum tempo, historiadores e sociólogos chegavam mesmo a negar a existência de um movimento operário antes de 1917.

Em São Paulo, o anarco-sindicalismo gozava de um certo prestígio junto à classe operária. O sindicato anarquista representava um esboço da sociedade que pretendia instaurar: sociedade sem Estado, sem desigualdade e organizada em uma federação de trabalhadores. Assim, para os anarquistas, as lutas por reivindicações imediatas eram simples instrumentos da grande ação revolucionária que deveria mudar toda a sociedade. As conquistas dos trabalhadores deveriam ser obtidas sem o auxílio do Estado, qualquer vantagem assegurada em lei seria uma derrota para os trabalhadores.

Nos primeiros meses do ano de 1917 começaram a aumentar as manifestações dos trabalhadores a fim de melhorias na condição do trabalho, especialmente no setor têxtil. Como era nesse setor que se concentravam os maiores capitais, as greves só alcançavam repercussão quando se generalizavam nessa área ou nos serviços dos portos e do transporte ferroviário.

O período entre 1917 e 1921 (quando muitas greves aconteceram no Brasil) foi marcado no mundo todo por crises, por conta do desajuste sócio-econômico causado pela Primeira Guerra Mundial (1914-1918) e pelo impacto da Revolução Russa (1917). Por essas razões houve uma onda revolucionária que se estendeu por grande parte da Europa.

É certo que houve um grande aumento do custo de vida no Brasil e, em especial na cidade de São Paulo, o preço dos alimentos e dos serviços básicos cresceu bastante nesse período. Apesar disso, é difícil avaliar qual foi o impacto preciso dessas condições na deflagração das greves que marcaram o período de 1917 a 1921. Ainda que não se duvide da enorme importância da queda do salário real como fator do desencadear da greve de 1917, ele não explica porém, isoladamente, a eclosão do movimento grevista. Entre 1922 e 1925, os trabalhadores também foram atingidos pela inflação, sem que isso significasse um aumento das mobilizações operárias.

Para alguns historiadores, a revolta se iniciou por conta de fatores internos às fábricas. Os trabalhadores, apesar de guiados por um espírito de revolta que tinha como alvos os grandes capitalistas, não pretendiam mudar a sociedade, mas sim melhorar suas condições de vida.

O centro dos atritos foi o Cotonifício Crespi, grande fábrica de fiação e tecelagem de algodão, localizada no bairro da Mooca, contando com mais de 2.000 trabalhadores, sendo a sua grande maioria composta de mulheres. Após algumas resoluções patronais, em junho de 1917, como o prolongamento do trabalho noturno, os trabalhadores passaram a reivindicar melhorias dentro da fábrica. A recusa patronal em negociar causou enorme insatisfação entre os operários, resultando numa greve de mais ou menos 400 trabalhadores, que pediam a abolição das multas, regulamentação do trabalho de menores e mulheres, modificação no regime interno da empresa e abolição da contribuição “pró-pátria” (espécie de imposto cobrado aos trabalhadores italianos a fim de contribuir com seu país de origem durante a guerra).

Alguns dias depois, em outra empresa têxtil, a Estamparia Ipiranga, também foi deflagrada uma greve abrangendo cerca de 1.600 operários e reivindicando praticamente as mesmas exigências dos grevistas das Crespi.

Algumas prisões de grevistas causaram enorme comoção entre os trabalhadores e entre a população e passaram a acontecer passeatas e manifestações pedindo a liberdade dos grevistas presos.

Em 7 de julho, a greve alcançou outra grande empresa fora do setor têxtil: a fábrica de bebidas Antarctica, situada também no bairro da Mooca. Ao mesmo tempo, começaram a acontecer choques entre as forças policiais e os grevistas. Choques que se acirraram quando um grupo de grevistas, no dia 9 de julho, se deslocou para a fábrica têxtil Mariângela, localizada no bairro do Brás. Em frente a essa fábrica iniciou-se um conflito que acabou com um tiroteio do qual saíram feridos dos dois lados, sendo que os operários foram os mais atingidos. Um sapateiro anarquista chamado Antonio Martinez morreu em decorrência desses conflitos.

A morte do sapateiro Antonio Martinez causou grande comoção e seu enterro foi assistido por centenas de grevistas

Nesse momento a greve já atingia 35 empresas contando com cerca de 15.000 trabalhadores parados. Nesse contexto, a morte de Martinez causou uma comoção tão grande que a paralisação de algumas fábricas se tornou uma greve generalizada na cidade de São Paulo. O número de grevistas, entre 12 e 15 de julho (ponto alto da greve) passou de 25.000 para 45.000.

A ação policial também se intensificou e os choques entre a população e a polícia só aumentaram, sendo que o maior centro de manifestações foi o bairro do Braz, onde se concentravam as fábricas e as casas operárias.

Ao mesmo tempo em que acontecia uma extensa mobilização militar, as ações populares pareciam não seguir um rumo determinado. Apesar disso, formou-se umComitê de Defesa Proletária, formado por líderes sindicais e de associações populares, que procurava unificar os trabalhadores em torno de um programa que exigia melhorias de trabalho e de vida. Exigia-se aumento de salário, abolição de trabalho noturno para mulheres e crianças, jornada de 8 horas, respeito ao direito de associação, libertação dos grevistas presos, permanência no emprego dos participantes da greve, medidas para baixar os preços dos gêneros de primeira necessidade, redução dos aluguéis, entre outras reivindicações.

Mas o Comitê encontrou grandes dificuldades de se fazer ouvir. Os trabalhadores se recusavam a tratar diretamente com os patrões ou com o governo. Assim, quem acabou se encarregando de mediar os conflitos foi um Comitê de Jornalistas, formado em 13 de julho. Em 15 de julho, o Comitê operário acabou aceitando a proposta patronal que cobria apenas algumas reivindicações iniciais. Ainda assim, as negociações foram encaminhadas pelos empresários individualmente. Assim, cada empresa definiu os termos de cada acordo.

A volta ao serviço foi gradativa, crescendo a cada dia de acordo com as negociações com cada empresário. Ainda em 22 de julho, há algumas paralisações, mas estas têm rápido encerramento.

Muitos relatos foram escritos dando conta dos acontecimentos desse mês de julho na cidade de São Paulo. A maioria deles afirma um caráter espontâneo na luta dos trabalhadores. Mas as análises posteriores têm procurado encontrar causas para essa grande greve, amenizando a espontaneidade que teria marcado essas mobilizações.

A análise dessa greve ainda é complicada por conta da falta de fontes. Apenas os já citados relatos e os jornais da época constituem documentação para o estudo da greve de 1917. Ainda assim, podem-se perceber indícios de uma tensão que crescia entre a classe trabalhadora desde o início do ano de 1917.

Embora a deflagração da greve tenha sido espontânea, inevitavelmente em seu curso deveria haver um núcleo organizatório, que foi o Comitê de Defesa Proletária. Entre as lideranças anarquistas houve uma certa incapacidade em assumir um verdadeiro papel dirigente e dificuldade em encontrar vias para garantir o cumprimento das pequenas conquistas. Os empresários também se encontravam desorganizados, mas contavam com o Estado oligárquico como um protetor.

Ainda assim, essa greve de 1917 foi um grande marco para a classe trabalhadora na Primeira República. Serviu como um símbolo para as futuras gerações e mostrou, para o governo, a força operária e a necessidade de melhoria nas condições de vida da população pobre.

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A NECESSIDADE DA ORGANIZAÇÃO E A CRÍTICA AO “ANARCOFOFISMO”

19 segunda-feira out 2015

Posted by litatah in #resisteIzidora, AIT, Anarco-Comunismo, Anarcosindicalismo, Anarquia Verde, anarquismo no Brasil, Análise de Conjuntura, Partidos, Institucionalidade,, Anti Capitalismo, Anti Civilização, Anti Consumismo, Anti Fascismo, Anti Homofobia, Anti Machismo, Anti Misoginia, Anti Transfobia, Antirracismo, Bandeiras de Luta, Black Block, CAB, CNT-FAI, Coletivo Libertário Évora, Comunicação, Comunicação Libertária, direitos, Direitos LGBT, Educação Libertária, Experiências anarquistas, Funk, GEAPI - Grupo de Estudos Anarquistas do Piauí, Imaginário e Plano Simbólico, Makhnovistas, Manifestações, Militarização das periferias, Mobilização Indígena, Mobilização Quilombola, Moradia, Municipalismo Libertário, Organização de base, Organizações Anarquistas, Plataforma, Prática, Questão racial, Racismo, Racismo ambiental, Sem categoria, Teoria

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Fonte: Coletivo Libertário Évora

 

“E com o bucho mais cheio comecei a pensar
Que eu me organizando posso desorganizar
Que eu desorganizando posso me organizar
Que eu me organizando posso desorganizar
Da lama ao caos, Nação Zumbi.

Todos conhecem a máxima “anarquia é ordem”, mas nem todos os anarquistas se propõem a vivenciá-la. Uma necessidade básica de sobrevivência e resistência é a organização; foi a partir da tentativa de auxiliarem-se mutuamente que surgiram os primeiros agrupamentos humanos; é pela organização que os animais evoluíram, e foi visando a organização que se desenvolveram as trade-unions e sindicatos.

A organização no anarquismo é essencial. A luta contra o capitalismo, o Estado e todas as formas de opressão exige uma organização. Não falo da formação de um “exército anarquista”, uma estrutura hierarquizada, autoritária; estas características mantém as ferrugens das engrenagens sociais atuais, e é justamente nestes pontos que a organização anarquista se difere.

Utilizando-se da ferramenta de análise histórica, a dialética, podemos chegar a conclusão de que o extremo oposto à democracia burguesa, o Estado, e ao capitalismo é a anarquia. O caos, em nossa concepção, é a atual condição da sociedade, pautada em um gerenciamento autoritário, hierarquizado (sempre privilegiando o “topo da pirâmide”), individualismo, consumismo extremado e alienação das faculdades humanas pelos pilares Estado/capital.

Concebendo a ordem social fundamentada em uma abstração antihumana (o Estado), e um sistema econômico que sobrevive das desigualdades sociais, uma organização anarquista vem a ser gerida de forma oposta à esta.

A arbitrariedade das obrigações advindas de cima para baixo, a autoridade, o poder do homem sobre o homem, uma vez negadas pela prática, desenvolve uma arranjo antiautoritário; esta por sua vez sobrevive de acordo com a consciência de cada indivíduo partícipe do processo de composição deste sistema, assumindo para si a responsabilidade do autogoverno. Este autogoverno de indivíduos-coletivos, negará também a disciplina imposta, coercitiva. Existirá sim, pela autodisciplina, a percepção da função do indivíduo dentro da sociedade e sua importância para o pleno desenvolvimento desta. Não é preciso Reis, Presidente ou deuses ordenando as necessidades da organização. Os indivíduos pertencentes, por eles mesmos, gerenciarão suas próprias forças e decidirão de forma horizontal a melhor forma de utilizá-la.

Também o individualismo é substituído pelo coletivismo/coletividade. Novamente, não falamos em homens e mulheres alinhados em fila, repetindo as mesmas palavras, industrialmente organizados. O que é tratado é uma substituição das formas de relacionamento humano, antes baseados no eu, na competição desumana, alternada para uma configuração de respeito e cooperação mútua. Não negamos obviamente a individualidade do ser humano, suas capacidades e desejos particulares, porém pautados nos pressupostos acima mencionados.

O combate incessante ao Estado e a economia atual. Lutar contra o Estado, sem pautar o anticapitalismo, ou lutar contra o capitalismo e preservar a estrutura do Estado, é ultraliberalismo ou socialismo autoritário. Ambos não são anarquistas.

A batalha contra o Estado é a luta contra a estrutura burguesa, que privilegia a classe dominante (em quaisquer sistemas sociais onde este exista), que usurpa as características humanas amarrando todos os indivíduos sob sua tutela e autoridade, esmagando tudo o que se opõe à máquina estatal com a violência de seu corpo repressivo, as falácias de seus sistemas de comunicação e as ilusões do voto.

Lutar contra o capitalismo é lutar contra as desigualdades sociais; contra a má distribuição das riquezas, contra a propriedade privada, contra as meritocracias, e todas as formas de opressão fortalecidas por este sistema econômico: O machismo, o racismo, a homofobia, e as estruturas de governo que são lançadas como última alternativa de manutenção do capital, como o nazismo e o fascismo.

Derrubar o Estado é derrubar o capital. Derrubar o capital é derrubar o Estado. Ambos são faces da mesma moeda, e preservar um ou outro, preservará também as injustiças sociais.

Uma organização que carregue em si estas lutas, possui o anarquismo como norte teórico e prático.

Desta forma, uma organização anarquista tende a ser antiautoritária, anti hierárquica, anticapitalista, anti estatal, autogovernada, cooperativa, respeitando as possibilidades e capacidades individuais, colaborando com as demais lutas libertárias no mundo.

Obviamente o texto não se encerra em si, e longe de ser uma fórmula definitiva para a autonomia dos movimentos anarquistas, múltiplos por si só em táticas e teorias, é antes um apelo aos que já se reivindicam anarquistas, a virem compor grupos ácratas já organizados, e caso na localidade não haja um grupo, que seja fundado. A urgência deste posicionamento é uma necessidade desde muitos séculos, e que no Brasil foi gritante no forjar das barricadas de junho de 2013.

Resistir e combater as  opressões é hoje questão de sobrevivência da humanidade, e este combate não se dará da noite para o dia, e muito menos de forma espontânea entre os povos. Creio particularmente que uma das finalidades da militância anarquista seja a de auxiliar indivíduos da sociedade atual a perceberem as amarras que cerceiam sua liberdade, e impedem o seu desenvolvimento, e além disso, resistir à elas.

O convite perdura, para os que já reconheceram as injustiças sociais e concebem os males que o Estado e o Capitalismo são por si só, para que participem ativamente da construção de órgãos anarquistas.

UMA CRÍTICA AO “ANARCOFOFISMO”

Muitos se declaram anarquistas, e negam a necessidade da organização. É este o anarquismo hiper abstracionista, que considera um pecado mortal até estudar a teoria libertária, pois esta cerceia a liberdade de pensamento, ou que dogmatiza o anarquismo, e que este significa liberdade total e absoluta (desconsiderando outras questões arraigadas à temática, como autodisciplina e respeito mútuo). Sectaristas, veem a luta anarquista como uma forma de autoritarismo contra a burguesia, umanarcofascismo. A inércia política é uma característica forte deste “anarquismo”; isto é, quando os seus idealizadores se declaram anarquistas, pois alguns creem que estas definições limitam o anarquismo. Autodissolvem-se em uma micro fração cujo vegetismo social é apropriado de bom grado pelos opressores. Que governo não deseja um anarquismo assim? Não combativo, não organizado, repartido em si mesmo, abstrato? Se comparado às lutas laborais de meados do século XIX e início do século XX, ou mesmo as recentes insurreições populares em todo o globo, este “anarcofofismo” não passa de uma piada de mau gosto. Assim alertamos aos companheiros sobre este discurso cancerígeno, aquoso, deturpador da realidade e inebriante, assim como as artimanhas sociais para manter o status quo coletivo, e declaramos que é algo a ser revisto, caso desejemos construir com nossas próprias forças uma sociedade livre, em igualdade, cooperação e horizontalidade.

Anarquismo é ordem.

Anarquismo é luta.

Edgar Rodrigues (pseudónimo) – GEAPI

aqui: http://anarquistas-pi.blogspot.pt/2014/03/a-necessidade-da-organizacao.html

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O Anarquismo no Brasil

16 sexta-feira out 2015

Posted by samuelvfm in Anarcosindicalismo, Anarquia, anarquismo no Brasil, História

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anarcossindicalismo, anarquismo no Brasil, história da anarquia, movimento operário

Apresentação

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Angela Roberti (UERJ/UNIGRANRIO) // Edna Santos (UERJ)
Rio de Janeiro, verão de 2012/2013.

Fonte: O Anarquismo no Brasil

         No período compreendido entre o final do século XIX e início do XX, o Brasil foi palco de experiências transformadoras: mudou o sistema político e o regime de trabalho, obras foram executadas, cidades modernizadas, a entrada de imigrantes foi ampliada, a circulação de ideias e mercadorias foi intensificada, o ambiente político foi renovado, a atmosfera intelectual foi potencializada e novas relações, tensões e lutas se impuseram produzindo conflitos e estranhamentos.

Nessa época de transição efervescente, o país começou a viver o lento, porém definitivo, processo de expansão das relações capitalistas, permitindo, de um lado, a formação e a ascensão da burguesia, e de outro, o aumento quantitativo do proletariado, demarcando, em cidades como Rio de Janeiro e São Paulo, nas primeiras décadas do século XX, os contornos da chamada “questão social”.

Paulatinamente, o estabelecimento desse campo de forças sinalizou a necessidade de organização de formas de ação das crescentes classes trabalhadoras. Tornou-se inevitável a aproximação entre esses grupos e o ideário anarquista, reforçado no país com a presença cada vez mais significativa de imigrantes, muitos dos quais ligados às atividades urbanas, com destaque aos setores comercial e oficinal.

O anarquismo, portanto, foi uma tendência hegemônica no início do movimento operário no país, com atuantes e combativas correntes organizatórias da classe trabalhadora urbana, principalmente, no eixo geográfico Rio de Janeiro-São Paulo, em fins do século XIX e décadas iniciais do século XX.

A história do anarquismo no Brasil encontra-se, portanto, fortemente vinculada à constituição do movimento operário, aparecendo, por sua vez, associada à problemática da industrialização e da urbanização que se acelerou nessas cidades no início do século XX, dando visibilidade ao drama da existência dos trabalhadores diante das péssimas condições de vida e de trabalho a que estavam sujeitos.

As péssimas condições que caracterizavam o mundo do trabalho mantinham correspondência direta com o cotidiano do trabalhador fora do espaço da produção, estendendo-se por sua vida cotidiana. Os níveis salariais baixos contrastavam com o aumento do custo de vida, em especial com a alta constante dos gêneros alimentícios e dos aluguéis. O precário poder de consumo refletia-se no deficiente padrão alimentar e na insalubridade da maior parte das moradias. As deficitárias condições de saúde e higiene, assim como o difícil acesso à educação e até mesmo ao lazer, selavam o drama da existência operária no período de sua constituição social e cultural.

O movimento operário no Brasil, bem como os princípios e as ações libertárias, encontraram nas péssimas condições de vida e de trabalho a que os trabalhadores estavam submetidos um terreno fértil para se disseminar. Esse contexto de dificuldades agitava as cidades brasileiras, sobretudo Rio de Janeiro e São Paulo, embalando o movimento operário em geral e fermentando a militância anarquista em particular, de modo a impulsionar os anarquistas a agirem e interagirem enquanto sujeitos históricos, verdadeiros testemunhos de uma época historicamente determinada.

Por intermédio da publicação de jornais, boletins, panfletos e livros, da organização de grupos, conferências, comícios e agitações populares e da participação ativa e permanente no movimento operário, o anarquismo, nas suas diversas orientações, expandiu-se no país, tornando-se, nas duas primeiras décadas do século XX, a corrente mais forte no interior do movimento operário. Muito cedo, portanto, passou a incomodar os poderes estabelecidos, atraindo, por conseguinte, a atenção policial.

Os libertários atuantes no Brasil implementaram, também, um conjunto de atividades culturais como parte de um amplo projeto de mobilização, conscientização e engajamento dos grupos de explorados e oprimidos. Escolas anarquistas foram fundadas, círculos de estudo organizados, conferências proferidas, folhetos e panfletos publicados e lidos, romances e folhetins editados, poemas declamados e musicados, peças teatrais encenadas e charges publicizadas. Enfim, foi incrementado todo um conjunto de práticas sociais e culturais com o intuito de melhor difundir as ideias e ideais dos libertários e sua crença na capacidade de homens e mulheres criarem um mundo novo, diferente, igualitário, solidário, livre, auto-gestionário por excelência e, por isso mesmo, acreditava-se, mais feliz.

Nos últimos anos, pesquisas sobre o mundo do trabalho e investigações acerca das mulheres trabalhadoras contribuíram para fazer o anarquismo sair da sua invisibilidade, outorgando-lhe importância para a história do movimento operário e das lutas sociais e políticas no país. A organização de diversos arquivos e centros de pesquisa sobre o tema abriu possibilidades para a descoberta de múltiplas e ricas experiências libertárias, confirmando essa valorização e tendência. Essa produção, entretanto, não tem seu alcance nas salas de aula de História dos ensinos mais básicos, permanecendo restrita, muitas das vezes, apenas aos pesquisadores interessados no tema.

A proposta para a produção de um material multimídia sobre o Anarquismo no Brasil voltado para a docência do ensino básico público é uma iniciativa do Laboratório de Pesquisa e Práticas de Ensino (LPPE) do Instituto de Filosofia e Ciências Humanas (IFCH) da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ) em parceria com o Programa de Pós-Graduação em Letras e Ciências Humanas (PPGLCH) da UNIGRANRIO e celebra tais inquietações. Da mesma forma, procura atender às necessidades de um campo pouco abordado no ensino de História nas escolas, que envolve, inclusive, o processo de formação da classe trabalhadora no Brasil e suas lutas sociais e políticas no cenário que caracterizou os anos iniciais da vida republicana do país.

Colocado o desafio, as organizadoras desse material, inicialmente, entraram em contato com especialistas e estudiosos do tema a fim de sensibilizá-los para o projeto, de modo a fazê-los contribuir com artigos voltados à reflexão do anarquismo em diversas perspectivas. Felizmente conseguimos a adesão de diversos colegas e companheiros que têm procedência institucional diversa, áreas de formação e atuação múltiplas e perspectivas teórico-metodológicas diferentes, mas que se mostraram ansiosos por explorar as experiências individuais ou coletivas de homens e mulheres anarquistas, conhecidos ou anônimos, frequentemente ignorados ou mencionados apenas superficialmente.

Nesse sentido, o material ora apresentado reúne algumas experiências de pesquisa sobre o anarquismo no Brasil em variadas dimensões, com o propósito de ampliar os limites do tema no âmbito escolar e estimular novas possibilidades de investigação e diálogo.

Distintos quanto à formulação das questões, os estilos da escrita, a tipologia das fontes, o recorte temporal, a delimitação temática, os artigos traduzem algumas inquietações e indagações presentes entre os profissionais envolvidos com pesquisa e a docência, muitos dos quais inseridos, também, direta ou indiretamente, nos meios libertários.

O material multimídia encontra-se organizado em um movimento triplamente direcionado: [1] um conjunto de sete textos cujo eixo temático é o anarquismo em variadas dimensões; [2] um roteiro histórico-geográfico a partir de pequeno vídeo contemplando alguns dos lugares privilegiados dos encontros coletivos e das trocas, materiais e simbólicas, que se davam entre os militantes anarquistas na cidade do Rio de Janeiro; [3] uma expressiva entrevista que traça um panorama histórico do anarquismo no Brasil das origens aos dias atuais.

Duas partes dividem este material: os textos e os vídeos. Na primeira parte, contamos com sete textos. O cientista político Wallace Moraes, em Significado de Anarquismo, nos contempla com um texto fundamental e introdutório sobre a acepção das palavras anarquia e anarquismo, bem como suas principais ideias-força. Rafael Viana da Silva, Adenildo Daniel da Silva e Alexandre Samis, pesquisadores na área de História, em Sindicalismo e Anarquismo no Brasil, refletem sobre os primeiros tempos da militância, com destaque para as relações entre a luta operária e o movimento anarquista.Sublinham um pouco do jogo político que marcou associações, congressos operários, organizações anarquistas, greves e repressões, ressaltando a crise do sindicalismo e a perda do vetor social do anarquismo nos anos 1930 e suas manifestações nas décadas de 1940 e 1950. No artigo intitulado Anarquismo e Imigração, o historiador Carlo Romani e o pesquisador Milton Lopes, são responsáveis por explorar as experiências dos imigrantes, em especial italianos, portugueses e espanhóis, no movimento anarquista brasileiro, destacando sua contribuição nas lutas sociais do período e suas iniciativas libertárias originárias, como a fundação de colônias (Cecília, Cosmos e Guararema). Mulheres na Militância Anarquista, da historiadora Angela Maria Roberti Martins, nos apresenta algumas das inserções das mulheres no movimento anarquista que marcou a Primeira República no eixo geográfico Rio-São Paulo, destacando a contribuição feminina para a luta política travada e as atividades socioculturais implementadas no período. Enfatiza que as mulheres anarquistas tiveram uma participação ativa nas lutas sociais e políticas da época, projetando-se como testemunhas reveladoras da experiência feminina do anarquismo no Brasil. Com o graduando Antônio Felipe da C. M. Machado, o historiador Rogério C. de Castro e o pedagogo Silvério Augusto M. S. de Souza, responsáveis pelo texto Movimento educacional e pedagógico anarquista, somos conduzidos pelas iniciativas inovadoras dos libertários no âmbito da educação, na base da qual se prima pela autonomia e a emancipação do sujeito. Visitam precursores da educação libertária, mostrando que o projeto educativo libertário está intimamente ligado a um projeto de sociedade anti-autoritário, a partir de práticas baseadas no princípio da horizontalidade e de um clima de solidariedade capazes de fazer despontar a espontaneidade e a criatividade, responsáveis pela emancipação do sujeito e pela transformação social. O historiador Carlos Augusto Addor em Rio de Janeiro, 1918 – Insurreição Anarquista, explora a insurreição planejada por alguns militantes anarquistas que pretendiam reproduzir na capital federal da República brasileira a experiência russa: a Revolução Social pela via insurrecional. Propõe que apesar de traída, sufocada e derrotada essa experiência de insurreição anarquista produziu, em médio prazo, efeitos positivos para os trabalhadores, uma vez que as autoridades não podiam mais ignorar as reivindicações operárias, percebendo mesmo a necessidade e a urgência de atendê-las. A historiadora Mariana Affonso Penna e o pesquisador Renato de Souza Doria arrematam essa primeira parte discutindo o movimento anarquista na contemporaneidade no texto Anarquismo social no Rio de Janeiro Contemporâneo. Conferem visibilidade às manifestações e organizações libertárias na virada desse último milênio, em especial a partir da década de 1990, destacando o ascenso de uma onda global de protestos anticapitalistas, no interior dos quais encontram-se os anarquistas.

Finalmente, a segunda parte exibe dois vídeos: o primeiro, com o pesquisador Renato Ramos, foi filmado no centro histórico da cidade do Rio de Janeiro e, através de um roteiro histórico-geográfico, privilegia alguns dos lugares dos encontros coletivos e das trocas que se davam entre os militantes. Portadores, portanto, de um significado e de uma memória, esses lugares podem ser considerados rastros da experiência libertária entretecida pelos militantes na cidade antiga, lócus privilegiado da diversidade humana e cultural que os diferenciava e identificava. O segundo vídeo consiste em uma entrevista com o pesquisador e militante libertário Alexandre Samis. Filmado na Biblioteca Social Fábio Luz por Gabriel Amorim, o vídeo apresenta um panorama do movimento anarquista no Brasil, dividido em quatro momentos: I) das origens do anarquismo no Brasil, em fins do século XIX, até ± 1930; II) de ± 1930 a ± 1980; III) de ± 1980 a ± 1990; IV) O anarquismo na contemporaneidade, com três dimensões distintas: a inserção em favelas; a atuação junto aos sindicatos e as demais atividades do anarquismo contemporâneo.

Nessa perspectiva, o propósito central desse material multimídia, produzido pelo LPPE, é mostrar algumas das manifestações do movimento anarquista no país. Destacam-se, no conjunto, as principais idéias e experiências libertárias de homens e mulheres que se dedicaram a exprimir a eterna rebeldia humana a respeito da autoridade, da opressão, da exploração, da injustiça e da desigualdade, questões das mais fundamentais ao ser humano, e ainda sem solução, o que faz o tema permanecer instigante e a reflexão necessária. Que essa constatação possa incitar a reflexão e (re)alimentar o sonho da igualdade com liberdade em todas as dimensões, dando à vida seu sentido pleno.

Para terminar, sublinhamos nosso reconhecimento e nossa gratidão a todas e todos que direta e indiretamente contribuíram para a realização intelectual e artística deste material multimídia. Aos integrantes do Núcleo de Investigação Social da Universidade Federal Fluminense (NIS-UFF) e do Núcleo de Pesquisa Marques da Costa (NPMC), agradecemos pelas contribuições. Contrariando a lógica do tempo, ultrapassando as exigências do produtivismo acadêmico e superando as adversidades internas e externas a este trabalho, formamos uma equipe que se responsabilizou pela reunião e organização dos textos, produção dos vídeos, revisão dos originais, pesquisa de imagens e disposição e criação gráfica. Toda essa produção não seria possível sem a estimulante convivência no LPPE (IFCH-UERJ), entre funcionários, pesquisadores e alunos; esses últimos, sempre responsáveis por nos instigar e manter vivo nosso entusiasmo.

Boa leitura!

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[França] Nem velhos, nem traidores. Documentário sobre “Action Directe”

05 segunda-feira out 2015

Posted by litatah in Action Directe, Agência de Notícias Anarquistas - A.N.A, Anarco-Comunismo, Anarcosindicalismo, Anarquia, Anti Capitalismo, Anti Civilização, Anti Consumismo, Anti Fascismo, Anti Homofobia, Anti Machismo, Anti Misoginia, Anti Transfobia, Atos, Bandeiras de Luta, Correntes da Anarquia, Ditadura, Fascismo, França, História, Imaginário e Plano Simbólico, Internacional anarquista, Mártires da Luta, Perseguição política, Perseguição política a anarquistas, Repressão, Revolução, ZAD- Zonas a Defender

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Action Directe, estado repressor, Freança, História, história da anarquia

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Fonte: A.N.A.

Nos anos 70, anarquistas franceses lutaram com seus amigos revolucionários catalães contra a ditadura franquista e o capitalismo. Apoiaram as greves mais radicais e criaram a editora Mayo 37 para difundir textos marxistas, situacionistas, conselhistas, assembleários e anarquistas. Para financiar suas ações subversivas, multiplicaram os assaltos a bancos. Criaram o MIL (Movimento Ibérico de Liberação). Depois das detenções e já auto dissolvidos, uns continuaram sob a sigla GARI para a liberação dos presos de Barcelona e contra a ditadura.

Action Directe é fundada em 1977 por militantes de diversos grupos libertários e comunistas GARI (Grupos de Acción Revolucionarios Intenacionalistas), NAPAP (Noyaux Armés pour l’Autonomie Populaire). Sua luta comum consistia em atacar o Capitalismo selvagem, o neoliberalismo incipiente e o império estadunidense sob sua nova forma globalizada, um sistema de morte, que como as estatísticas nos demonstram hoje, aumentava ano após ano a pobreza no mundo, as desigualdades e as injustiças. Um sistema que provoca milhões de mortes inocentes ao ano e aumenta as desigualdades e o poder das multinacionais, em especial as de armamento.

Action Directe realizou mais de 50 ataques, tais como um assalto com metralhadoras ao edifício da federação de empresários em 1º de maio de 1979, assim como ataques a edifícios governamentais, do exército, companhias em complexos industrial-militares e a símbolos do estado criminoso de Israel. Também realizaram assaltos ou “expropriações” e execuções dos representantes de multinacionais, como a do general René Audran (responsável pelo tráfico de armas e negócios com os Estados Unidos) em 1985 e a Georges Besse, presidente da Renault em 1986.

Em 21 de fevereiro de 1987, os principais membros de Action Directe, Jean-Marc Rouillan, Nathalie Ménigon, Joëlle Aubron e Georges Cipriani foram presos e mais tarde condenados a prisão perpétua. Régis Schleicher havia sido previamente preso em 1984. Joëlle Aubron foi liberada em 2004 por enfermidade terminal e morreu em primeiro de março de 2006 por causa de sua enfermidade.

Título original: Ni Vieux Ni Traitres

Direção: Pierre Carles e Georges Minangoys

Ano: 2005

Duração: 100 minutos

Para ver o documentário (com legendas em castelhano), clique aqui:

https://www.youtube.com/watch?v=lmWZYXMkjaE

Tradução > Sol de Abril

agência de notícias anarquistas-ana

na rua deserta
brincadeira de roda
vento se sujando de terra

Alonso Alvarez

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Liberdade ou Morte! O grito de Sacco e Vanzetti ao proletariado internacional

17 quinta-feira set 2015

Posted by litatah in Anarcosindicalismo, Anarquia, História, Mártires da Luta, Perseguição política, Perseguição política a anarquistas, Presos Políticos, Presos políticos, Repressão, Sacco e Vanzetti, Todo Apoio aos 23, Violência

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23 presos, História, história da anarquia, História do Anarquismo, História Social, História Social; Louise Michel, manifestantes presos, presos, presos político, presos políticos internacionais, repressão, repressão internacional, repressão política, Sacco & Vanzetti

Sacco-Vanzetti

Fonte: UNIPA

No dia 23 de agosto de 1927, à 87 anos atrás, os anarquistas italianos Nicolás Sacco e Bartolomeu Vanzetti foram assassinados, sentenciados a pena de morte na cadeira elétrica pela justiça do Estado norte-americano. Naquele dia, o proletariado do mundo inteiro derramou lágrimas de sangue e de ódio aos exploradores do povo, sabendo terem perdido gloriosos camaradas da luta revolucionária. Os dois anarquistas foram alvos do maior escândalo jurídico norte-americano, sentenciados sem qualquer prova concreta, com diversas testemunhas falsas (algumas desmascaradas no meio do processo), sob uma forte atmosfera de revanchismo político reacionário e racista.

Tal como outros tantos trabalhadores de sua época, Vanzetti e Sacco começaram o envolvimento com a militância através da solidariedade natural pelo sofrimento dos explorados. O jovem Sacco, filho de camponeses pobres italianos, emigrou para a “América” em 1908, aos 17 anos. Viveu períodos de grandes dificuldades (chegando a passar fome, desemprego e muita miséria), trabalhou em diversas fábricas, sendo que em uma fábrica de sapatos conheceu sua companheira, com quem teve seus dois filhos. Sacco chegou a participar da Federação Socialista Italiana, mas logo se envolveu com a prática sindicalista revolucionária e anarquista. 

Bartolomeu Vanzetti, por sua vez, teve um envolvimento quando jovem com ideias religiosas e humanistas, gostava muito de estudar, e logo se desligou de qualquer instituição religiosa. Emigrou para os Estados Unidos aos 20 anos, fato que levou a uma profunda transformação em sua vida. Segundo Vanzetti, na América viu “todas as brutalidades da vida, todas as injustiças e as depravações em que se debate tragicamente a humanidade”. E decidiu dedicar-se física e intelectualmente, chegando a estudar importantes teóricos de sua época como Bakunin, Marx, Kropotkin, Gorki, Mazzini, Tolstoi, Leopardi, Darwin, dentre outros. Leu grande parte destas obras nas madrugadas, após longas jornadas de trabalho na fábrica, debruçado sobre um livro à luz de velas. Vanzetti se tornou um convicto anarquista e importante liderança no movimento operário.

A conjuntura dos Estado Unidos nesse período era de forte repressão aos imigrantes e movimentos reivindicativos. O contexto internacional de disputas com a União Soviética fortaleciam a política de combate com mãos de ferro contra qualquer tentativa mais ousada do movimento operário. O imperialismo externo era completado com uma forte tirania interna. A atmosfera saturada de ódio era também fomentada e explorada pelo próprio Ministro da Justiça, A. Mitchell Palmer, e estava entranhada nas instituições oficiais. Antes de Sacco e Vanzetti outras lideranças haviam sido assassinadas pela polícia. No dia 4 de maio de 1920 (um dia antes da prisão de Sacco e Vanzetti), um editor do jornal anarquista “Il Domani”, Adrés Salsedo, após ter passado por torturas e interrogatórios, foi jogado pela janela do edifício do Departamento de Justiça de Nova Iorque.

O movimento operário norte-americano tampouco era um antro de burocratas e pelegos que estamos acostumados na atual conjuntura de crise de organização do proletariado. As duas primeiras décadas do século XX foram um momento de auge do sindicalismo revolucionário em diversos países da América e Europa. Vanzetti e Sacco participaram de greves, motins, passeatas e sabotagens em defesa dos direitos do povo. Viviam um período importante de influência da teoria e ideologia anarquista no movimento de massas, onde a ação direta, a expropriação, a autodefesa popular e a estratégia revolucionária eram combinados com um grande número de jornais, forte agitação e propaganda e centros culturais.

No noite de 5 de maio de 1920, Nicolás Sacco e Bartolomeu Vanzetti foram presos no bairro operário de Brockton em uma batida policial que buscava prender outra pessoa. De início não foram acusados de nada, passaram apenas por um interrogatório político. A acusação veio logo após. Vanzetti e Sacco foram acusados de assassinato seguido de roubo. A grande imprensa imediatamente passou a divulgar a prisão dos “bandidos italianos” e a sua filiação anarquista como prova moral de propensão à criminalidade e delinquência. Passaram por um longo processo jurídico, com procedimentos abertamente viciados, manipulados e sem precedentes nos anais judiciais. Muitos estudos jurídico foram feitos posteriormente, e os escritos de Sacco e Vanzetti são também uma denúncia contundente ao processo armado.

Save_Sacco_and_VanzettiA campanha de ódio dos juízes e da imprensa reacionária foi contraposta pela ocupação de praças no mundo inteiro por milhões de pessoas pela liberdade dos anarquistas italianos. Uma das maiores campanhas de solidariedade já vista foi feita: manifestações, motins, atentados à embaixadas norte-americanas, dentre outras formas de pressão sobre os governos e carrascos. Apesar de toda a pressão internacional, Sacco e Vanzetti foram assassinados friamente sob os olhos do mundo. Apenas em 23 de agosto de 1977, há 50 anos de seus assassinatos, o governo de Massachusetts promulgou, cinicamente, um documento os absolvendo.

Na condição de trabalhadores, imigrantes e anarquistas Sacco e Vanzetti tiveram de enfrentar não apenas o ódio dos capitalistas e do Estado, como também a xenofobia presente na sociedade americana. No entanto, encontraram solo fértil de ação e solidariedade na ideologia anarquista e no sindicalismo revolucionário, defensores do classismo e do internacionalismo. O amor pela liberdade, pelo livre desenvolvimento das potencialidade humanas, pela igualdade e o fim das classes sociais, alimentaram as convicções destes dois grandes homens.

Aproveitamos a data para divulgar um texto de Sacco e Vanzetti: “Liberdade ou Morte”. O texto é uma prova das virtudes e potência ideológica desses dois anarquistas, que mesmo após receberem a sentença de morte, não cederam um milímetro em suas convicções, se mantiveram firmes nas fileiras do anarquismo revolucionário até o último segundo de suas vidas, não se arrependeram nem se intimidaram frente aos carrascos do Estado. Em tempos de forte repressão que estamos vivendo, e que anunciam se aprofundar, esse texto é uma importante mensagem de convicção ideológica que ultrapassa o tempo e as fronteiras, é um alimento para a luta revolucionária e para os corações e mentes de cada filho do povo. Sacco e Vanzetti Vivem e Vencerão!

***

Liberdade ou Morte

Nicolás Sacco e Bartolomeu Vanzetti

Aos companheiros, aos amigos e ao proletariado revolucionário

Muitas vezes, durante nossa prisão, lhes dirigimos a palavra através das grades que nos privam da liberdade e dos mais elementares e inalienáveis direitos.

Não para pedir vossa solidariedade – ela veio espontânea, generosa e imediata, e se afirmou cada vez mais a medida que a magistratura e os oficiais de justiça revelavam o propósito de matar-nos por qualquer meio e a todo custo – os temos dirigido a palavra senão por fé, por paixão, por gratidão e por orgulho.

Por fé: e lhes dissemos que só vocês podem nos arrancar do carrasco e nos devolver à vida que é liberdade, ação, amor e ódio; que de vocês e não da lei, esperávamos justiça.

Por paixão: e gritamos para vocês com o ânimo indignado, do sadismo desta perseguição, as mentiras e a duplicidade demonstradas e usadas contra nós pelo juiz Webster Thayer e pelo procurador Katzmann. E denunciamos a trama construída pela polícia – ordenados por aqueles – para criar, com a corrupção, a ameaça e a vingança, todos os falsos testemunhos da acusação, sem os quais teria sido impossível, não apenas nos condenar, mas até nos acusar; e lhes dizemos que os jurados – em menos de 4 horas, depois de um processo que havia durado 8 semanas – encontraram o modo de nos condenar à penas capital.

Depois, quando o veredito de morte lhes foi informado, vocês, companheiros e trabalhadores, souberam rugir a ira e a dor que queimavam em seus peitos, preparando-se para todas as audácias e desafiando as pontas das baionetas dos inconscientes irmãos soldados, e a brutalidade dos juízes mercenários. Vocês que tomaram as ruas e as praças de cada cidade do mundo, gritando na cara dos representantes e servidores de nossos juízes, de nossos carrascos e perseguidores, que vocês não estão dispostos a deixar cumprir impunemente nosso assassinato.

E a explosão da dinamite libertadora se uniu ao vosso imenso grito, titânica voz de dor, de vontade, de perdição e de redenção. E nós dissemos que a esse grito e a essa explosão devemos nossa vida. As feras sentiram a pele queimar e afrouxaram o nó. De outra maneira teriam se apressado em nos entregar ao carrasco que, no silencio de uma noite má, haveria nos amarrado e queimado sobre a fogueira sem chamas do século XX.

Mas vocês que, durante a mais cega reação da história, souberam cumprir um gesto tão belo e tão poderoso de solidariedade, como poucos nos relembram a história do proletariado, vocês não se desarmaram – confiantes e decididos: a arma em punho.

E não por uma vaidosa necessidade, senão por impulso do coração, temos exteriorizado nossa gratidão e orgulho de pertencer a vossas falanges, sacras ao devir humano. Por impulso do coração! … e temos, com conhecimento, repetido mal o que alguns de vocês disseram como mestres, o que vocês todos sabem.

Agora, porém, queremos lhes dizer nosso pensamento sobre nossa presente situação, – situação incerta, obscura, penosa, cheia de incógnitas. E fazendo isso, acreditamos cumprir um dever com nós mesmos, com vocês e com a grande causa comum. Nossa impotência forçada, desviando-nos das responsabilidades próprias de cada militante, nos impõe o rigor do silêncio sobre coisas que nos dizem respeito, seja como homens, seja como revolucionários – mas não como seres vis. Examinemos então, juntos, nossa situação atual e a de todos os prisioneiros de nossa guerra.

Ao fazer isso, nos encontramos obrigados a começar … desde o início e a nos repetir. É uma necessidade, mas não é um mal, porque enquanto a dor e a vingança durem e invadam tudo, convêm repetir…

Vocês sabem: desde quando, devido ao desleixo dos primeiros advogados encarregados de nossa defesa, Katzmann y Thayer tiveram a primeira, fácil e importante vitória no processo Plymouth, em detrimento de um de nós, as coisas mudaram bastante, e mudaram mais depois do processo de Dedham. Sem dúvida mudaram para melhor. A mesma imprensa burguesa que no tempo de nossa detenção fazia contra nós um verdadeiro linchamento moral, agora e desde muito tempo, mudou de ton. Ela, quase unanimemente, declarou injustificável o veredito de Dedham.

A defesa obteve a retratação de duas importantes testemunhas de acusação, e descobriu que um terceiro, Goodridge, não é Goodridge, e que este, antes de ser um mentiroso, foi um ladrão, um trapaceiro e um bígamo. Além disso, a defesa encontrou um novo testemunho na pessoa de Roy E. Gould, o qual se encontrava presente no assalto, viu os autores, e nega nossa presença no lugar. Obtiveram muitas outras evidencias em nosso favor, evidencias que, por brevidade, deixamos de expor, mas de tal valor suficiente para assegurar, em um caso comum, a revisão do processo.

Mas devemos, por isso, esperar justiça?

Absolutamente, não. – Lhes disse com magistral sapiência o próprio juiz Thayer a cerca de um ano. Lembrareis que ele fixou a audiência requerida pela defesa para pedir novo processo, para a véspera do natal. Ele já havia decidido nos recusar o processo, e escolheu com espírito cristão a véspera do natal, para alegar aos nossos e a nós, com seu compreensível não. Recordareis também sua negação. Discurso famoso, digno dele. Duas peças de imposturas, de cólera, de vaidade, e de má fé. Naquele discurso Thayer fez uma citação jurídica de um colega seu mijada fora do penico; Ei-la aqui, senão textualmente, ao menos em seu conteúdo: os jurados podem negar-se a acreditar nos testemunhos de defesa, ainda que sejam mais numerosos que os da acusação; e podem basear seu veredito de culpabilidade acreditando em apenas um entre todos os testemunhos da acusação.

Thayer preparou outro discurso para quando nos rejeitar novamente o processo, porque ele sente a necessidade de cobrir o espírito com a letra, mas se quisesse apressar-se poderia justificar sua nova negação repetindo, simplesmente as palavras já proferidas e que nós transcrevemos.

Então, dirão vocês, porque vocês pediram a defesa legal? Nós a requeremos, e vocês a financiaram, por boas razões.

Presos pela violência, acusados e constrangidos pela violência a um processo, tivemos que recorrer a defesa legal, a qual é a única reconhecida pela lei, para ser tutelados em nossos direitos, e para demonstrar, ao rigor da lei, nossa inocência. Mas não acreditamos jamais que a defesa legal fosse capaz de alcançar a justiça. Não, nós conseguimos demonstrar nossa inocência. Na mais indulgente hipótese, o jurado não poderia nos condenar mais do que usando a dúvida contra nós. E o mencionado discurso do juiz é todo um esforço para justificar a ação do jurado.

Mas é cansativo falar disso. Vocês, companheiros, amigos e trabalhadores, sabem muito bem porque nos declararam culpados.

E o silencio dos jurados, depois do processo disseram que eles haviam jurado um ao outro não falar do que se passou na câmara de deliberações – isso fala por si mesmo.

Para ser liberados devemos abrir outro processo, e devemos sair absolvidos. Por outro lado, o fato de abrir outro processo não é decisivo para nossa liberdade?

E devemos dizer-lhes que a defesa legal, por si só, é impotente? Deveremos falar-lhes de Mooney e de Billings, dos Mártires de Chicago, de Joe Hill, dos prisioneiros políticos, dos recentes processos aos mineiros e das últimas prisões? Devemos dizer-lhes que dos Thayer e os Katzmann, que administram a justiça de classe, não se deve esperar mais do que o mal? Que os homens com imagem de “bom moços” do condado de Dedham, que nos condenaram, e da figura de “bom moço” dos homens dos outros condados, que condenaram aos demais, não desapareceram, absolutamente, da face da terra? E que é absurdo, ridículo, esperar a justiça da lei de classe de nossos mortais inimigos?

Não, companheiros; Se o inimigo que pode ganhar tudo matando-nos, adverte que o pode fazer impunemente, estejam certos, não nos terão mais entre vocês. Nos matarão, ou nos farão morrer, átomo a átomo, entre os muros de suas bastilhas, como já fizeram com os outros.

E farão assim com os demais reféns. E os reféns aumentarão. As prisões transbordarão dos mais fortes campeões do trabalho e da liberdade. E seu martírio será o martírio da própria liberdade. Corrupto, traído, confuso e aterrorizado, o miserável ignorante se corvará à violência e a astúcia do ignorante rico e na ruína geral nós seremos arrastados e nossos filhos serão escravos, escravos miseráveis de outros e de si mesmos.

Companheiros! Trabalhadores! Vocês permitirão isso? Nós somos impotentes agora. Nosso destino e o de vocês, assim como o destino de nossos filhos, está em vossas mãos, e não nas mãos do inimigo.

A nós não resta nada mais do que olhar o cadafalso ou a ainda mais horrenda prisão perpétua, sem desânimo e sem se desesperar.

Quando ainda éramos adolescentes conhecemos a separação dos nossos ente queridos, a cólera dos patrões e a maldade do mundo de bem. Aos vinte anos preferimos o estudo e a luta, aos fáceis amores e a taberna. E na longa experiência que sabe de toda miséria, toda dor, todo insulto e toda humilhação, amadureceu em nós essa fé que desafia e vence todos os inimigos e qualquer adversidade; a fé que a luta e o valor temperam e não abatem. E sabemos a muito tempo, o que a causa necessita e a que o inimigo serve…

Pela defesa da existência e o triunfo do ideal, estávamos decididos ao sacrifício supremo. Mas esperávamos cair em batalha, a peito aberto e com arma ao punho, cara a cara com o inimigo execrado.

Atroz ironia: se sonhava cair como leões e a realidade nos prepara a morte del topo. E, no entanto, nos conforta a certeza de que, ainda assim dessa forma, nosso sacrifício não é vão, senão que amadurece e apressa a invocada hora do grande revide.

Soubemos encontrar a força para resistir à pena cotidiana, e na não-pior das hipóteses, saberemos olhar na face do carrasco que nos amarre e lançar ao mundo dos grandes ladrões e dos grandes assassinos nossa extrema maldição.

A prisão perpétua significa um martírio mais longo e mais atroz que o da execução imediata. Pensem também que essa é a pena mais rentável à burguesia, porque economiza o gasto do carrasco e lhe dá o produto de nosso trabalho.

Quanto a nós, deem-nos Liberdade ou Morte!

A vocês, companheiros e trabalhadores, nossa saudação!

Agora e sempre pela Revolução Social.

Janeiro, 1923.
Nicolas Sacco e Bartolomeu Vanzetti.

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(Artigo) A democracia representativa é um ônibus de transporte público

04 sexta-feira set 2015

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democracia_representativa

Fonte: Rede de Informações Anarquistas – R.I.A

Passageiros e passageiras sabem o itinerário do ônibus mas não sabem dirigir, motorista sabe o caminho mas não sabe onde cada passageiro vai descer. O motorista para atentamente no ponto após um pedestre fazer sinal para subir e também quando um passageiro aperta o sinal luminoso para descer… Em tese…

Na prática os passageiros do banco direito à frente xingam a cada curva pra esquerda, reclamam a cada ponto parado, criminalizam os passageiros do “fundão” que estão tocando funk e pagode, reclamam de crianças viajando sentadas, dizem que já tem idade suficiente para viajar em pé e afirmam que crianças tem pagar passagem. Preferem os bancos altos e argumentam que adoram olhar a vista de cima. Passam a viagem inteira fazendo piadas de português, negros, homossexuais e pobres.

Os passageiros do banco direito ao fundo não se incomodam tanto quanto os da frente com o pagode do fundão já que em suas regiões pagode é algo comum, reclamam de tudo mesmo que não saibam do que estejam reclamando, seguram suas bolsas e mochilas com força com medo do rapaz em pé com celular na mão tocando funk.

Os passageiros dos bancos esquerdos à frente brigam para sentar no banco alto mas afirmam que todos os bancos deveriam ser iguais, reclamam que o motorista não sabe dirigir e afirmam que seriam melhores condutores, defendem o pessoal do pagode do fundão mas não sabem cantar pagode.

Os passageiros dos bancos esquerdos ao fundo reclamam que por diversas vezes fizeram sinal para o buzão parar, xingam porque querem descer a qualquer custo e tomar outro rumo, brigam com as pessoas dos bancos altos e reclamam que todos no ônibus são omissos ao não reclamarem que o motorista não para nos pontos sinalizados, alguns puxam a saída de emergência na possibilidade de pular com o buzão andando, mas desistem da ideia já que os passageiros dos bancos esquerdos à frente caguetaria para o motorista.

O motorista atropela todo mundo que cruza seu caminho, passa voado pelos quebra-molas, bate em todos os demais carros da rua e atravessa todos os sinais vermelhos.

O motorista não para em nenhum ponto para ninguém descer e dirige insanamente sorridente por dois motivos: o motorista é surdo e é o único no buzão que ganha direito para estar ali.

Em meio a tudo isso existem pessoas que só andam de bicicleta.

Por colaborador da Rede de Informações Anarquistas – R.I.A

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[Grécia] Duas palavras sobre o Fundo Solidário da União Sindical Libertária de Atenas

03 quinta-feira set 2015

Posted by litatah in Anarcosindicalismo, Anarquia, Fundo Solidário, Fundo Solidário da União Sindical Libertária (ESE) de Atenas, Grécia, Internacional anarquista, Mártires da Luta, Notícias, Entrevistas, Atos, Manifestos, Perseguição política, Perseguição política a anarquistas, Presos Políticos, Presos políticos, Rafael Braga, Repressão, Syntagma, Todo Apoio aos 23, Violência

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Fonte: A.N.A.

Publicamos a seguir o texto que nos foi enviado pela União Sindical Libertária (ESE) de Atenas sobre seu Fundo Solidário.

Há cinco anos está em funcionamento o Fundo Solidário da União Sindical Libertária (ESE) de Atenas. A ideia de criar um Fundo Solidário estável surgiu quando em 31 de outubro de 2009 arrecadamos em um concerto 1060 euros para os gastos judiciais dos 6 membros da ASI (Iniciativa Anarcossindicalista da Sérvia) detidos e processados naquela ocasião. Em 15 de maio de 2010 arrecadamos mais 561 euros. Este foi o ponto de partida para a criação do Fundo Solidário.

Trata-se de um fundo utilizado para apoiar única e exclusivamente pessoas físicas, ou seja, trabalhadores, desempregados e imigrantes que se encontram em situação de necessidade por terem sido despedidos, por estarem desempregados, por estarem enfermos ou terem sofrido um acidente ou por qualquer outro motivo de caráter social. Também utiliza-se para apoiar trabalhadores em greve ou em luta, como uma forma de apoiar suas mobilizações. As ajudas solidárias que normalmente se oferecem são de 200 euros. Não se faz colaborações a coletivos que encontram-se em luta (por exemplo, para gastos de propaganda). Este tipo de solidariedade é coberta pelos fundos regulares da ESE.

O Fundo Solidário é abastecido pelas contribuições sistemáticas realizadas por seus amigos e colaboradores, assim como das quotas pagas pelos membros da ESE Atenas e do dinheiro arrecadado com a edição da Agenda dos Trabalhadores da ESE e com diferentes atos realizados durante o ano.

As colaborações solidárias são realizadas após debater cada caso particular proposto na Assembleia Geral da ESE Atenas.

Desde maio de 2010 até 31 de julho de 2015 concedemos apoio que totalizaram 7952 euros. Entre as colaborações realizadas, cabe destacar as feitas a trabalhadores que se encontravam em luta ou em greve e as feitas em apoio a companheiros trabalhadores e imigrantes em resposta a um chamado público de solidariedade. Mencionamos os seguintes casos:

– para os trabalhadores em greve das confeitarias BLE em Tessalônica;

– para os trabalhadores em greve dos Altos Fornos da Grécia em Asprópirgos;

– para os trabalhadores em greve da PHONEMARKETING;

– para os trabalhadores da fábrica autogestionada VIO.ME. em Tessalônica;

– para apoiar os fundos grevistas do sindicato de trabalhadores do ensino médio (ELME) da zona ocidental de Atenas (Peristeri);

– para o companheiro Panos Bijos, que nos abandonou recentemente, em sua luta contra o câncer;

– para o Comitê de Solidariedade com os Presos Políticos da Turquia e do Kurdistão em apoio à companheira Eminé, refugiada política da Turquia que esteve vários meses nos cárceres da Grécia;

– para Gabriel A., golpeado em um olho durante a manifestação antifascista de Keratsini em setembro de 2013;

– para as trabalhadoras da limpeza do Ministério da Economia despedidas;

– para a Associação Sindical de Trabalhadores em Livrarias, Papelarias e Editoras do Governo Provincial de Ática (Atenas-Grécia) para os gastos judiciais da companheira despedida da livraria “Eurípides” em Jalandri;

– para os refugiados sírios;

– para os gastos judiciais da trabalhadora despedida do Café Musical de Nea Smyrni;

– para a Associação Sindical de Trabalhadores em Livrarias, Papelarias e Editoras do Governo Provincial de Ática (Atenas-Grécia) para os gastos judiciais dos detidos durante a greve do setor do livro que foi atacada pela polícia às portas da livraria IANOS;

– para os gastos judiciais da companheira despedida da ONG NOSTOS;

– para uma companheira despedida no setor da hotelaria;

– para o apoio econômico dos centros sociais que acolhem refugiados sírios em dois bairros de Atenas;

– como colaboração com os gastos de envio da roupa recolhida no Centro Social Aftonomo Steki para os refugiados do campo de internamento de imigrantes de Leros;

– para o imigrante egípcio Wallid que foi maltratado por seu empresário em Salamina;

– para o Fundo de Solidariedade com os Presos Políticos.

Também realizaram-se muitas outras contribuições econômicas que não foram divulgadas a trabalhadores e imigrantes, todas elas depois de serem propostos e discutidos os respectivos casos na assembleia da ESE Atenas.

Além do Fundo Solidário, ESE arrecadou dinheiro para a luta das trabalhadoras de limpeza, despedidas do Ministério da Economia. Venderam-se cupons emitidos pela coordenadoria de demitidas e assim arrecadaram-se 1783 euros.

Recentemente, ESE Atenas decidiu em assembleia prolongar o funcionamento do Fundo Solidário, fazendo um chamado para que os membros da ESE de outras localidades da Grécia e qualquer outro companheiro trabalhador interessado possa tornar-se sócio do fundo.

Como nem todos tem as mesmas possibilidades (há pessoas desempregadas, outras que trabalham em jornada parcial e outras que são estudantes), decidimos que há três cotas para os sócios do fundo: 15 euros, 30 euros e 60 euros. Cada um pode colaborar segundo suas possibilidades. Além disso, as colaborações podem ser realizadas em 2 ou 3 prazos. Em qualquer caso, entrega-se um recibo.

Convidamos todos os companheiros a contribuir para dar uma maior extensão e eficácia a nosso fundo. Ajudemos na medida do possível a arrecadar dinheiro, com a filiação de novos sócios, com atos públicos, com a distribuição de nossa agenda ou de qualquer outra forma. Esforcemo-nos para que todos e cada um de nós se envolva o quanto possível na tomada de decisões, com propostas para a distribuição das ajudas econômicas, para atos, etc. Nossa intenção é que haja assembleias abertas da ESE específicas para discutir tudo relativamente ao Fundo Solidário.

Somos conscientes de que as necessidades de solidariedade e apoio mútuo são muito grandes e aumentam continuamente. Somos conscientes também de que nosso fundo não pode cobrir todas estas necessidades e de que nosso apoio tem um caráter meramente simbólico. Mas apesar de todas as dificuldades, estamos decididos a continuar levando esta desigual batalha, ao mesmo tempo que as batalhas que levamos a cada dia nas diferentes frentes da luta de classes. Convidamos a todos os coletivos do movimento dos trabalhadores e social a que criem fundos solidários similares.

Apoie o Fundo Solidário da ESE Atenas. Tornando-se sócio do Fundo Solidário. Para isso podes entrar em contato com qualquer membro da ESE. Podes realizar tua colaboração ao Fundo Solidário também através da seguinte conta bancária:

Piraeus Bank

Número de conta: 5087-070937-715

IBAN: GR86 0172 0870 0050 8707 0937 715, BIC: PIRBGRAA

União Sindical Libertária de Atenas (ESE – Grécia)

Tel: 00306941507846

E-mail: ese-ath@espiv.net

O texto em inglês:

http://verba-volant.info/en/some-words-about-the-solidarity-fund-of-the-libertarian-syndicalist-union-of-athens/

O texto em castelhano:

http://verba-volant.info/es/dos-palabras-sobre-el-fondo-solidario-de-la-union-sindical-libertaria-de-atenas/

Tradução > Sol de Abril

agência de notícias anarquistas-ana

A folha se vai
embarca em qualquer som
rio abaixo.

Masatoshi Shiraishi

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GREVE UFPR: A luta dos de baixo por educação de qualidade e para todos e todas!

20 quinta-feira ago 2015

Posted by litatah in Anarco-Comunismo, Anarcosindicalismo, Anarquia, Anti Capitalismo, Coletivo Anarquista Luta de Classe, Coletivo Quebrando Muros, Coordenação Anarquista Brasileira, Greve, Jornadas de Junho, Manifestos, Movimento Estudantil, Movimento Estudantil, Movimento Sindical, Notícias, Entrevistas, Atos, Manifestos, Organizações Anarquistas, Prática

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Fonte: Coletivo Anarquista Luta de Classe

Retirado de:  https://quebrandomuros.wordpress.com/2015/08/19/greve-ufpr-a-luta-dos-de-baixo-por-educacao-de-qualidade-e-para-todos-e-todas/

Não é de hoje que presenciamos inúmeros ataques dos de cima a nossos direitos básicos, conquistados pela luta dos movimentos sociais ao longo dos anos. Para piorar, em tempos de crise, são esses mesmos direitos que tentam nos tirar, demonstrando que o papel do Estado é o de legitimar e garantir os interesses da burguesia. Assim, em Agosto de 2015, os cortes de verbas sobre a educação já superam os 10 bilhões de reais, ameaçando concretamente a vida nas universidades, as condições de trabalho dos técnicos, docentes e a permanência de milhares de estudantes que necessitam de assistência para continuar seus estudos.

A resposta dos e das trabalhadores/as e estudantes a esse cenário não poderia ser diferente: é tempo de se mobilizar e resistir! Por isso, desde maio, servidores e docentes das instituições públicas federais de todo o país entraram em greve. Na UFPR, os servidores técnico-administrativos aderiram à greve desde o seu início; os professores, aderiram no último dia 6 à greve nacional da categoria.

Mas não são somente essas categorias que sentem na pele a necessidade da luta! No HC, as trabalhadoras terceirizadas da cozinha e limpeza paralisaram pela terceira vez esse ano. Sabemos das péssimas condições de trabalho a que estão submetidos os e as trabalhadoras terceirizadas e do risco de intensificação desse modelo de contratação com a aprovação da PL 4330. Por isso, nos colocamos lado a lado, em solidariedade de classe a todos os tercerizados que desempenham serviços tão necessários para a manutenção da universidade!

Entendemos que esses movimentos de luta são uma resposta dos trabalhadores e estudantes à precarização das condições de trabalho e estudo e ao sucateamento da educação. Com a história aprendemos que só a mobilização combativa traz conquistas e muda a vida! Aprendemos também que os estudantes muitas vezes tiveram papel fundamental em processos de luta por direitos e mudanças.

Sem título

Foi com a força da greve dos estudantes, unidos aos professores e servidores, que garantimos a gratuidade da universidade, barrando a cobrança de taxas como matrículas e protocolos, como no movimento de 2001. as políticas de permanência também são resultado da luta estudantil, que garantiu o aumento das bolsas, RU 7 dias por semana e três vezes ao dia, wi-fi, ampliação na frota do intercampi, incluindo o transporte para o litoral, auxílio-creche, ampliação na casa 3, entre tantas outras conquistas.

Nesse sentido, é que os estudantes da UFPR – reunidos na Frente de Mobilização Estudantil do Paraná – também já estão organizados e em luta desde o semestre passado, elencando pautas desde a base dos cursos até as reuniões gerais da FMEP . Hoje, diversos cursos já deflagraram greve estudantil, indicando que nossa luta vai se intensificar ainda mais.

Precisamos muito da união dos estudantes, servidores e professores para defender a educação pública. Para isso, o movimento precisa ser coletivo e construído desde a base dos cursos, através de assembleias de cursos e gerais. Precisamos demonstrar nossa força pela ação direta do movimento, ser criativo e ir para além dos atos e manifestações. a greve precisa ser forte e pressionar a Reitoria e o Governo Federal para conseguirmos conquistas reais!

Sem título

TODO APOIO À GREVE DOS TÉCNICOS, TERCEIRIZADOS E DOCENTES!

TODA APOIO À GREVE ESTUDANTIL!

PELA UNIFICAÇÃO DAS LUTAS!

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O golpe em curso se chama “Ajuste Fiscal”

20 quinta-feira ago 2015

Posted by litatah in #contratarifa, AIT, Anarco Ecologia, Anarco Feminismo, Anarco Primitivismo, Anarco Punk, Anarco-Comunismo, Anarcosindicalismo, Anarquia, Anarquia Verde, Análise de Conjuntura, Análise de Conjuntura, Partidos, Institucionalidade,, Anti Capitalismo, Anti Civilização, Anti Consumismo, Anti Fascismo, Anti Homofobia, Anti Machismo, Anti Misoginia, Anti Transfobia, Antirracismo, Aparelhos de reprodução ideológica, Aquecimento global - Mudanças climáticas, CAB, Código Aberto/Open Acess, CNT-FAI, Comunicação, Comunicação Libertária, Contra barragens, Coordenação Anarquista Brasileira, Copyleft, Correntes da Anarquia, Decrescimento, Democratização da comunicação, Ditadura, Ecofeminismo, Ecologia, Economia, Esquerda partidária, FAG, Feminismo e Transfeminismo, Feminismo intersecional, Gentrificação, Greve, Guerra às Drogas, Libertação animal, Manifestos, Mártires da Luta, Mobilidade Urbana, Municipalismo Libertário, Notícias, Entrevistas, Atos, Manifestos, Organização de base, Organizações Anarquistas, pós-capitalismo, Permacultura, Perseguição política, Perseguição política a anarquistas, Plataforma, PODEMOS, Prática, Presos Políticos, Presos políticos, Questão racial, Racismo, Racismo ambiental, Rafael Braga, Reforma agrária, Repressão, Software Livre, Squats e Okupas, Teoria, Todo Apoio aos 23, Veganismo, Violência, ZAD- Zonas a Defender

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mcp-1911

Fonte: Coletivo Anarquista Luta de Classe

Retirado de: https://www.facebook.com/FederacaoAnarquistaGaucha/posts/1057692934242264:0

Passe o que passe no andar de cima, a faca do ajuste nunca deixa de cortar na carne dos trabalhadores e setores populares. A recessão do país castiga, como sempre, as classes oprimidas. Corta direitos, salários e empregos e levam os serviços públicos à falência. Autoriza o saque do capitalismo de mercado sobre os bens púbicos e comuns, sobre a riqueza criada pelas sucessivas gerações de trabalhadores. “Administra” a pobreza pelos mecanismos criminais da justiça-polícia-prisão. Cria o sujeito indesejável, que perturba a segurança da ordem, o discurso punitivo que encarna o sentido comum do dia-a-dia e acomoda a banalização de uma guerra repressiva e genocida sobre negros e pobres, especialmente a juventude. Qualifica o bom e o mau protesto.

A briga desatada no palco do poder político passa longe do ajuste econômico e o Estado Penal. Em todos os cenários que podemos imaginar o sistema dominante trata de defender as medidas e as práticas de governo que empurram mais austeridade. Os trabalhadores brasileiros já estão pagando com o sacrifício dos sonhos e esperanças de dias melhores a farra financeira e criminal do capitalismo global. O fantasma das políticas miseráveis que castigam o povo grego, com desemprego em massa, arrocho salarial, perda de aposentadorias e demais direitos é um exemplo bem fresco.

Recessão e ajuste. O pacto social foi pro ralo.

O modelo que fez os ricos mais ricos e deu uma beirada de consumo, crédito e programas sociais para integrar os setores populares ao mercado já não tem mais vez. Só a indústria automotiva já demitiu 39 mil operários no primeiro semestre. A construção civil prevê 480 mil cortes de postos de trabalho durante o ano. O endividamento popular cresce e aperta o orçamento das famílias. A inflação criada pela subida dos preços administrados pelo Estado amplia a carestia de vida e corrói os salários. Não para por ai. O governo de Dilma e do PT condenou a juventude trabalhadora ao mexer nas regras do seguro-desemprego, esticando o tempo de trabalho para 18 meses. As burocracias sindicais arriaram uma bandeira histórica do movimento operário concertando com a indústria e o governo o programa de redução de jornada com redução salarial, o Pograma de Proteção ao Emprego (PPE), um plano de socorro dos patrões. Por sua vez, o lucro dos banqueiros tem recordes históricos às custas de uma dívida pública infame que arrocha investimentos na saúde, educação, moradia, etc.

No nível dos Estados e municípios a situação também é calamitosa. O achaque feroz da dívida pública, a sonegação e as insenções fiscais da patronal amordaçam o orçamento e os governos como no RS e em GO atacam o funcionalismo com congelamento e parcelamento de salários, corte de verbas sociais e planos de privatizações, concessões e extinção de órgãos e serviços públicos.

O pacto social que prometeu pela mão do desenvolvimento capitalista uma margem de melhorias sociais que chegassem na vida dos mais pobres fracassou. Com ele toda a narrativa triunfalista do crescimento que fez imaginário de uma pretensa prosperidade social fundada no sonho do consumo, no indivíduo flexível e “competitivo” ao gosto do mercado, na moral compensativa do trabalho precário e estafante, na privação dos espaços públicos e dos bens comuns em benefício de interesses especulativos. Quando as estruturas do poder e a riqueza ajustam o jogo todos sabemos onde é que a corda arrebenta.

A política como gestão dos controles do sistema.

De todos os lados a pressão ajoelha o governo do PT e o andar de cima cobra caro pela sobrevida. A rejeição cresce de pesquisa em pesquisa. A direita opositora se reagrupa pelo alinhamento de Eduardo Cunha com o PSDB, o DEM e os partidos que pulam do barco furado do governismo. Aparecem manobras judiciais pelo TCU e o TSE para criar uma situação política favorável ao impeachment ou empurrar a renúncia da presidente Dilma. Buscando jogar água nesse moinho, no último dia 16 de agosto mais uma vez o “antipetismo” foi às ruas por convocação de grupos liberais, conservadores e ultra-reacionários, ao que o governismo pretende contestar com a convocatória do dia 20 de agosto.

A operação Lava Jato, entre outros sentidos, tem reforçado a noção de uma solução judicial-repressiva para a crise. Juízes, promotores e agentes federais caídos nas graças da imprensa burguesa e das ruas. Políticos e altos burocratas do Estado e dos partidos na parede. Em menor medida, empresários graúdos figurando nos processos. Sem dúvidas ganha certa evidência um modus operanti que faz conexões entre as instituições políticas e o mundo corporativo empresarial. Mas há em tudo isso uma idéia sedutora, que faz vetor pro conservadorismo, de que a faxina deve ser feita pelos mesmos aparelhos de poder que punem implacavelmente a pobreza com as grades e o extermínio.

Em todos os casos, o sistema sempre reserva para si, bem longe dos mecanismos de participação popular, o direito de cortar cabeças seletivamente para não entregar o ouro. As redes de corrupção, sonegação e impunidade dos poderes políticos, econômicos e midiáticos são parte da estrutura, moeda corrente da representação burguesa. O que interessa ao andar de cima é deixar a política sempre no domínio privilegiado do parlamento, da justiça burguesa e/ou órgãos auxiliares. Normatizar os de baixo, quando muito, como eleitores.

Agenda de Renan e Levy. A ordem é arrumar uma saída pelo andar de cima.

A mão avarenta e fisiologista do PMDB, por conchavo das velhas raposas, segura, sabe-se lá por quanto tempo, o governismo na beira do precipício. Tudo tem seu preço. A arte de governar o país antes de tudo é a gestão estável dos interesses dos poderosos. As organizações patronais FIESP e FIRJAN além do Bradesco passaram o recado que querem, dentre todas as tramas para sair da crise política, um cenário que não toque no ajuste fiscal e na sua ofensiva sobre os direitos dos trabalhadores. Os editoriais de O Globo e Zero Hora assinam embaixo. Sangrar o governo Dilma e ajoelhar o PT até beijar os pés de quem pode mais agrada os senhores que não pretendem deixar o problema para a imprevisibilidade das ruas.

Nessa perspectiva, a Agenda Brasil anunciada na última semana é um pacote ao gosto das classes dominantes. Obra de um arranjo conservador do governo, tribunais e o senado, onde brilham Renan Calheiros, o PMDB e a política da tesoura do ministro Joaquim Levy. Consumação de uma virada governista ainda mais à direita, que reza missa pra aquelas imagens e lembranças da infame década de 1990 evocadas na campanha eleitoral de 2014. Chantagem barata que recrutava “voto crítico” no “menos pior”.

A saída que vem de cima faz agenda pelo ajuste e corta mais fundo. Com terceirizações e precarização do trabalho, ataque ao sistema gratuito e universal da saúde pública, desvio de receitas para o sistema da dívida. O atropelo de territórios indígenas, quilombolas, bens naturais e normas ambientais para a exploração brutal das mineradoras, construtoras e o agronegócio.

Para consagrar, tramita no congresso por ação do governo o projeto da Lei Antiterrorista. Endurecimento jurídico-represssivo sobre as rebeldias que não são canalizadas pela ordem. Punição dos militantes e das lutas que criam resistência e escapam dos controles burocráticos do Estado.

Luta sem governo, patrões e pelegos. Organizar a resistência dos de baixo

CABDos últimos 05 anos emerge uma nova onda de lutas que marcam o caminho por onde é preciso avançar para que os oprimidos construam, por sua própria força, uma saída do cenário de ataques que se agravam. Ocupações por direito a moradia, greves radicalizadas pela base que se voltam contra as direções burocráticas, governistas e patronais dos sindicatos, lutas da juventude por educação e transporte coletivo de qualidade, resistência combativa de indígenas e quilombolas.

A violenta ofensiva da patronal e dos governos contra os de baixo exige a construção de uma alternativa que se gesta nos locais de trabalho, estudo e moradia, que crie resistência e acumule forças para derrubar o andar de cima. Urge a necessidade de superar definitivamente a derrota trágica e inapelável de uma formação política nascida diretamente das organizações operárias e populares que dirigiu uma estratégia obstinada a chegar à presidência, custe o que custar; que afirmou premissas teórico-ideológicas que formaram o credo de toda uma geração da esquerda brasileira e que ainda hoje forma paisagem, inclusive, para setores da burocracia radicalizada que se opõe aos governos do PT por esquerda. Chegar ao “poder” pela via eleitoral, simplificar esse problema pela direção dos aparelhos estatais e atribuir ao Estado o caráter de uma máquina que funciona ao gosto de seus pilotos de turno, que não está penetrado por relações sociais de poder e dominação, mecanismos internos de reprodução de dinâmicas burocráticas e oligárquicas. Uma concepção viciada que se manifesta nos mais diversos conflitos em curso, em métodos que fazem das lutas uma mera força de pressão que visa “persuadir” um possível eleitorado por via de discursos, palavras de ordem e da promoção de lideranças carismáticas ao passo que marginaliza o protagonismo e a organização de base.

A saída para a situação que vem se colocando aos trabalhadores não é uma saída pela eleição de novas direções mas, fundamentalmente, pela organização de base e ação direta popular. Processo que não é uniforme, requer paciência, firmeza, ação metódica, trabalho de base, por vezes silencioso. Distante do barulho que grita uma “alternativa” política que se relaciona com a promoção de lideranças “caudilhistas” que pretendem se alçar como intermediários, fiadores do protesto popular. O lastro ideológico bastardo do petismo é vasto e faz com que ainda se tenha preferência, por exemplo, em atos com carros de som ou os reiterados “encontros” formais onde futuros presidenciáveis possam se manifestar, onde correntes se “cheiram”, procuram “enquadrar” aquelas que julgam “centristas”, fazem chamados e exigências umas as outras, tiram fotos e retornam às suas casas a um piquete ou bloqueio que tranque os serviços, a produção ou a circulação em áreas estratégicas, que ocupe espaços públicos ou privados. O protagonismo do partido na promoção da figura de seu dirigente ainda se sobrepõem ao protagonismo coletivo da classe, na avaliação, nos riscos assumidos, nas vitórias e derrotas.

A superação do legado reformista, social-democrata, que deixou o PT na esquerda ainda requer muito empenho, inserção social e luta política e ideológica a ser travada, fundamentalmente desde as mobilizações em curso. Um período de ofensiva dos de cima e resistência dos baixo requer, antes de mais nada, fortalecer a organização e o protagonismo de base em cada local de trabalho, estudo e moradia que estamos vinculados, acionando a mais ampla solidariedade de classe às lutas em curso, para que os de baixo se afirmem enquanto os verdadeiros protagonistas da construção de uma saída que barre o ajuste e acumule forças para a construção de uma nova sociedade, socialista e libertária.

Porto Alegre, 19 de Agosto de 2015
Federação Anarquista Gaúcha (FAG), Organização integrada à Coordenação Anarquista Brasileira (CAB).

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Noam Chomsky – O tipo de anarquismo em que acredito e o que há de errado com os libertários

18 terça-feira ago 2015

Posted by litatah in AIT, Anarcosindicalismo, Anarquia, Chomsky, CNT-FAI, Entrevistas, Notícias, Entrevistas, Atos, Manifestos, Prática, Teoria

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AIT, anarcossindicalismo, anarquia, anarquismo, Chomsky, CNT-FAI, Entrevista

NoamChomsky-647x530

Fonte: Contra Informação

Apresentamos a seguir a versão adaptada da entrevista que apareceu na revista Modern Success. [4]

Noam ChomskyComo tantas coisas já foram escritas e ditas pelo Prof. Chomsky, foi um desafio pensar em algo novo a perguntar a ele:  como o avô para o qual você não sabe o que dar de Natal porque ele já possui tudo.

Portanto eu escolhi ser um pouco egoísta e perguntar lhe algo que sempre quis perguntar.  Como um anarquista declarado, verdadeiro, vivo e respirando, eu queria saber como ele conseguia se alinhar a uma posição tão controversa e marginal.

Michael S. Wilson: Você é, entre outras coisas, um auto intitulado anarquista — mais especificamente um anarcossindicalista.  A maioria das pessoas pensam em anarquistas como punks marginais que atiram pedras em lojas de departamento, ou homens mascarados atirando bombas redondas em industriais gordos.  Essa visão corresponde à realidade?  O que anarquia significa para você?

Noam Chomsky: O anarquismo é basicamente, em meu ponto de vista, um tipo de tendência no pensamento humano que se apresenta de diferentes formas em diferentes circunstâncias, e que possui algumas características principais.  Primeiramente é uma tendência que é cética a respeito da dominação, da autoridade e da hierarquia. Ele procura por estruturas de hierarquia e dominação na vida humana em todo o seu espectro, se estendendo desde, digamos, famílias patriarcais até sistemas imperiais, e se pergunta se esses sistemas se justificam.  Ele assume que o ônus da prova para qualquer pessoa em uma posição hierárquica cabe a ela.  Sua autoridade não se auto-justifica.  Eles têm que dar uma razão para isso, uma justificativa.  E se eles não podem justificar essa autoridade, esse poder e esse controle, o que geralmente é o caso, então a autoridade deve ser desfeita e substituída por uma organização mais livre e mais justa.  E, como eu entendo, o anarquismo é apenas essa tendência.  Ele assume formas diferentes em épocas diferentes..

CNTO Anarcossindicalismo é uma forma particular de anarquismo que se preocupa primeiramente, não exclusivamente, mas primeiramente com o controle sobre o trabalho, sobre o local de trabalho, sobre a produção.  Ele assume que os trabalhadores deveriam ter o direito de controlar o seu trabalho, suas condições, [que] eles deveriam controlar as empresas em que trabalham, assim como as comunidades, de forma que eles deveriam se associar uns aos outros em associações livres, e a … democracia dessas instituições deveria ser o elemento fundante de uma sociedade mais livre em geral.  E então, você sabe, foram desenvolvidas ideias sobre como isso deveria se realizar, mas acredito que este seja o essencial do pensamento anarcossindicalista.  Quero dizer, de forma alguma é aquele quadro geral que você pintou — de pessoas correndo pelas ruas, você sabe, quebrando janelas de lojas — mas o anarcossindicalismo é a concepção de uma sociedade bem organizada, mas organizada desde baixo com participação direta em todos os níveis, com tampoucos controle e dominação quanto praticáveis, de preferência nenhum.

Wilson: Com o aparente desaparecimento do Estado capitalista, muitas pessoas estão procurando por outras formas de alcançarem sucesso, de viverem suas vidas, e eu estou imaginando o que você diria que a anarquia e o sindicalismo têm a oferecer, coisas que outras ideias — digamos, por exemplo, o Estado socialista — falharam em oferecer?  Por que deveríamos escolher a anarquia ao invés de, digamos, o libertarianismo?

Logo do Partido LibertárioChomsky: Bem aquilo que é chamado de libertário nos Estados Unidos, o que é um fenômeno especialmente restrito, não existe em nenhum outro lugar — em pequena parte na Inglaterra — permite um alto nível de autoridade e de dominação nas mãos do poder privado:  portanto o poder privado deve ser permitido a fazer aquilo que quiser.  O ponto de vista assumido é o de que, por algum tipo de mágica, o poder privado irá nos levar a uma sociedade mais livre e mais justa.  Na verdade já se acreditou nisso no passado. Em Adam Smith, por exemplo, um de seus principais argumentos em favor dos mercados foi a de que sob condições de liberdade perfeita, os mercados levariam à igualdade perfeita. Bem, nós não precisamos falar sobre isso! Este tipo de —

Wilson:  Que é uma controvérsia recorrente hoje em dia …

corporatocracyChomsky: Sim, tanto é assim que este tipo de libertarianismo, a meu ver, no mundo atual, é apenas uma chamada para um dos piores tipos de tirania, a saber a tirania privada sem restrições.  O anarquismo é bastante diferente disto.  Ele é um chamado pela eliminação da tirania, de todos os tipos de tirania.  Incluindo o tipo de tirania que acontece na concentração do poder privado.  Portanto por que deveríamos preferi-lo?  Bem eu acho que é porque liberdade é melhor que subordinação. É melhor ser livre do que ser escravo. É melhor ser capaz de tomar suas próprias decisões do que ter outra pessoa para tomá-las e obrigá-lo a observá-las.  Quero dizer, eu realmente acho que você não precisa de justificativa para isso.  Parece uma coisa … transparente.

A questão que precisa de uma explicação, e deve dar uma, é “Como melhor podemos caminhar nesta direção?”  E existem muitos caminhos para isso na sociedade atual.  Uma forma, incidentalmente,  é  através do uso do Estado, ao ponto em que seja democraticamente controlado.  Quero dizer que, a longo prazo, os anarquistas gostariam de ver o Estado extinto.  Mas ele existe, lado a lado com o poder privado, e o Estado está, pelo menos até certo ponto, sob o controle e influência públicos — entretanto poderia ser muito mais. E ele possui dispositivos para restringir as forças muito mais poderosas do poder privado.  Regras para a segurança e para a preservação da saúde no ambiente de trabalho, por exemplo.  Ou garantindo  que as pessoas possam dispor de cuidados de atenção à saúde, por exemplo.  Muitas outras coisas como estas.  Elas não existiriam se dependêssemos apenas do poder privado.  Muito pelo contrário.  Mas elas podem vir a existir através do uso do Estado sob mínimo controle democrático … para levar adiante medidas reformistas.  Eu acho que essas são coisas boas de se fazer. eles deveriam estar lutando por algo muito maior, muito além disso, — na verdade por uma democratização verdadeira de escala muito maior.  E isso não é possível apenas de se pensar, mas de se trabalhar a favor. Portanto um dos principais pensadores anarquistas, Bakunin, no século XIX, afirmou que era possível construir as instituições da sociedade futura dentro da sociedade atual.   E ele estava falando de uma sociedade bem mais autocrática que a nossa.  E isso está sendo feito.  Então, por exemplo empresas controladas pelos trabalhadores e pelas comunidades, são germes de uma sociedade futura dentro da atual sociedade. E estas não apenas podem, como estão Parecomicsendo desenvolvidas.  Há um trabalho importante a esse respeito sendo realizado por Gar Alperovitz que está envolvido nos sistemas de empresas ao redor de Cleveland que são controladas pelos próprios trabalhadores ou suas comunidades.  Há muita discussão teórica acerca de como fazer a coisa funcionar, escrita por várias fontes. Uma das ideias mais elaboradas estão naquilo que é chamado de “parecon” — economia participativa — em sua literatura e discussões.  E existem outras.  Estas estão no plano de abstração e planejamento.  E no nível da implementação prática, existem passos que podem ser tomados, ao mesmo tempo em que devemos fazer pressão para superar os piores … os maiores danos … causados pela … concentração do poder privado através do uso do sistema de Estado, enquanto o sistema atual ainda exista.  Portanto não existe escassez de objetivos a perseguir.

Quanto ao socialismo de estado, depende do que a pessoa quer dizer com o termo.  Se for uma tirania do gênero bolchevique (e dos seus descendentes), não precisamos perder tempo com isso.  Se for um Estado social democrata mais expandido, então se aplicam os comentários acima.  Se for qualquer outra coisa, então o quê?  Estará ele colocando o processo decisório nas mãos dos trabalhadores e das comunidades, ou nas mãos de alguma autoridade?  Se for a última opção, então — mais uma vez — a liberdade é melhor do que a subordinação, e a última alternativa carrega um fardo pesado para justificar.

Wilson: Muitas  pessoas o conhecem por causa do desenvolvimento do Modelo de Propaganda de sua autoria em parceria com Edward Herman.  Você poderia descrever sucintamente este modelo e por que ele pode ser importante para os estudantes [universitários]?

Chomsky: Vamos fazer uma pequena retrospectiva — uma pequena contextualização histórica — no final do século XIX,. começo do século XX, uma larga parcela de liberdade havia sido conquistada em algumas sociedades.  No topo de tudo isso estavam os Estados Unidos e a Grã Bretanha. De forma alguma poderiam ser consideradas sociedades livres, mas em termos comparativos eram bastante avançadas a esse respeito.  De fato eram tão avançadas, que os sistemas de poder — estatal e privado — começaram a reconhecer que as coisas haviam chegado a um ponto onde eles não podiam controlar a sociedade tão facilmente quanto antes e então tiveram que recorrer a outros meios de controle.  E o outro meio de controle se constituía no controle das crenças e atitudes.  A partir disso nasceu a indústria de Relações Públicas, que naqueles dias se descrevia honestamente como uma indústria de propaganda.

Edward BernaysO guru da indústria de RP, Edward Bernays — incidentalmente, ele não era um reacionário, mas um liberal do gênero Wilson-Roosevelt-Kennedy  — o livro de estreia da indústria de RP que ele escreveu nos anos 1920 se chamava Propaganda.  E neste livro ele descrevia, corretamente, o objetivo da indústria.  Ele dizia que seu objetivo era garantir que a “minoria inteligente” — e é claro, qualquer pessoa que escreva esse tipo de coisa faz parte dessa minoria inteligente por definição, por estipulação, então nós, a minoria inteligente, somos as únicas pessoas capazes de realizar coisas, e existe aquela grande população lá fora, a “massa fedida”, que, se forem deixados por conta irão apenas se meter em problemas:  então nós temos que, da forma que ele colocou, “trabalhar o seu consentimento”, buscar formas de garantir o seu consentimento ao nosso jugo e dominação.  E este é o objetivo da indústria de RP.  E ele funciona de várias formas.  Seu primeiro compromisso é com a propaganda comercial.  De fato, Bernays se tornou famoso justamente nesta época — no final dos anos 20 — ao realizar uma Lucy Strike Adcampanha de propaganda para convencer mulheres a fumarem cigarros:  as mulheres não estavam fumando cigarros, este grupo enorme de pessoas que a indústria do tabaco não é capaz de matar, então precisamos fazer algo a respeito.  Ele então realizou campanhas muito bem sucedidas que convenceram as mulheres a fumarem cigarros:  que aquilo seria, em termos modernos, a coisa maneira a se fazer, você sabe, esta é a forma de você se tornar uma mulher moderna e liberal. Ela fez enorme sucesso —

Wilson:  Existe alguma relação entre essa campanha e o que está acontecendo hoje com a grande indústria petrolífera e as mudanças climáticas?

Chomsky: Estes são apenas alguns exemplos.  Essa foi a origem daquilo que se tornou uma grande indústria de controle de comportamentos e de opiniões.  Hoje a indústria petrolífera e, de fato, o comércio mundial de modo geral, estão engajados em campanhas comparáveis que tentam minar esforços para lidar com um problema que é ainda maior que o assassinato em massa causado pela indústria do cigarro; o que se tratou mesmo de um assassinato em massa.  Nós estamos enfrentando uma ameaça, uma ameaça séria, de mudanças climáticas catastróficas. Isso não é brincadeira.  E [a indústria petrolífera está] tentando impedir medidas para lidar com isso por conta de seus interesses de curto prazo.  E isso não inclui apenas a indústria petrolífera, mas a Câmara Americana do Comércio — o principal lobby comercial — entre outros, que declararam bastante abertamente que estão conduzindo … eles não chamam isso de propaganda … mas o que correspondem a campanhas de propaganda para convencer as pessoas de que não existe perigo real e que não deveríamos fazer muito a esse respeito, e de que deveríamos nos concentrar em coisas realmente importantes como o déficit e o crescimento econômico — ou aquilo que eles definem como “crescimento” — e não nos preocuparmos com o fato de que a espécie humana está caminhando em direção a um abismo que pode se constituir em  algo como a destruição da espécie  [humana]; ou pelo menos a destruição da possibilidade de uma vida decente para uma grande parte das pessoas.  E existem muitas outras correlações.

No LogoDe fato, geralmente a propaganda comercial é fundamentalmente um esforço para sabotar mercados.  Nós devemos reconhecer isto.  Se você teve aulas de economia, você sabe que um mercado é representado por consumidores devidamente informados fazendo escolhas racionais.  Você dá uma olhada na primeira propaganda e se pergunta … é esse o seu objetivo?  Não, não é.  Seu objetivo é criar consumidores desinformados fazendo escolhas irracionais.  E estas mesmas instituições realizam campanhas políticas. É basicamente a mesma coisa:  você tem que minar a democracia tentando fazer as pessoas mal informadas realizarem escolhas irracionais. E este é apenas um aspecto da indústria de RP. O que Herman e eu estávamos discutindo era outro aspecto de todo o sistema de propaganda que se desenvolveu embrionariamente naquele período, e que é a “fabricação de consenso”, conforme era chamado, [consenso] em relação às decisões dos líderes políticos, ou líderes da economia privada, tentar garantir que as pessoas tenham as crenças certas e não tentem compreender a forma como são tomadas as decisões que não apenas possam prejudicá-las, mas prejudicar muitas outras pessoas. Isto é propaganda em seu sentido normal.  E então estávamos falando dos meios de comunicação em massa,  e da comunidade intelectual do mundo em geral, que está em grande medida dedicada a isso.  Não que as pessoas vejam a si mesmas como propagandistas, mas … que estão elas mesmas profundamente doutrinadas pelas crenças do sistema, o que as impede de perceber muitas coisas que estão ali na superfície, [coisas] que seriam subversivas ao poder se fossem entendidas. Nós demos muitos exemplos e existem muitos mais que você pode mencionar até o presente momento, exemplos cruciais de fato.  Esta é uma grande parte de um sistema geral de doutrinação e controle que funciona paralelamente ao controle de atitudes e … compromissos consumistas, e outros dispositivos para controlar as pessoas.

Greve Estudantil da UNAMVocê mencionou os estudantes.  Bem um dos maiores problemas para os estudantes hoje — um problema enorme — são os custos astronômicos dos financiamentos estudantis.  Por que nós possuímos financiamentos que são muito maiores que os de outros países, inclusive que os de nossa própria história?  Nos anos 50 os Estados Unidos era um país muito mais pobre do que é hoje, e ainda assim a educação superior era … basicamente gratuita, ou possuía taxas irrisórias ou eram gratuitas para um grande número de pessoas.  Não houve uma mudança econômica que tornou isso necessário, agora, para haver custos tão altos de financiamento, bem maiores do que quando éramos um país pobre.  E para esclarecer ainda melhor o ponto, se dermos uma olhadinha através das fronteiras, o México é um país pobre mas possui um bom sistema educacional com financiamento gratuito.  Houve um esforço por parte do governo mexicano para aumentar os custos de financiamentos, há talvez uns 15 anos atrás, o que levou a uma greve nacional de estudantes com grande apoio popular, e o governo voltou atrás. Agora isto acabou de acontecer no Quebec, do outro lado da fronteira.  Atravesse o oceano:  A Alemanha é um país rico.  Financiamento gratuito.  A Finlândia possui o sistema educacional mais bem colocado do mundo.  Gratuito … praticamente gratuito.  Então eu não acho que você pode usar a justificativa de que existem necessidades econômicas por trás do aumento econômico dos financiamentos. Eu acredito que são decisões sociais e políticas tomadas pelas pessoas que definem estas políticas. E [estes aumentos] são parte, a meu ver, da reação que se criou nos anos 70 contra as tendências liberalizantes dos anos 60. Os estudantes se tornaram muito livres, mais abertos, eles estavam protestando contra a guerra, a favor dos direitos civis, direitos das mulheres … e o país simplesmente se tornou livre demais. De fato, os intelectuais liberais condenaram isso, chamaram-na de uma “crise de democracia”:  temos  que moderar a democracia de alguma forma.   Eles pediram por, literalmente, mais comprometimento com a doutrinação dos jovens, sua frase era … temos que garantir que as instituições responsáveis pela doutrinação dos jovens façam o seu trabalho, para que assim não tenhamos mais toda essa liberdade e independência. E muitas coisas se desenvolveram a partir disso. Não acredito que tenhamos documentação suficiente em primeira mão para provar relações causais, mas você pode ver o que aconteceu. Uma das coisas que aconteceu foi o controle dos estudantes — na verdade, o controle dos estudantes pelo resto de suas vidas, simplesmente prendendo-os à armadilha da dívida.  Esta é uma técnica bastante eficiente de controle e doutrinação. E eu suspeito — não posso provar — mas suspeito que este é um grande motivo por detrás [do aumento dos financiamentos]. Muitas outras coisas aconteceram ao mesmo tempo. A economia como um todo mudou de formas significativas para concentrar poder, para acabar com os direitos e liberdades trabalhistas. De fato o economista que presidiu o Federal Reserve durante os anos Clinton, Alan Greenspan — St. Alan conforme era conhecido na época, o grande gênio da profissão econômica que estava administrando a economia, possuía altas honrarias — testemunhou orgulhosamente diante do congresso que o fundamento da grande economia que estava administrando era aquilo que ele chamava de “crescimento da insegurança do trabalhador”. Se os trabalhadores forem mais inseguros, eles não irão fazer coisas como exigir melhores salários e mais benefícios. E isso é saudável para a economia a partir de um certo ponto de vista, um ponto de vista que diz que os trabalhadores devem ser oprimidos e controlados, e de que a riqueza deveria ser concentrada nos bolsos de poucos. Então sim, isso é uma economia saudável, e precisamos aumentar a insegurança do trabalhador, e precisamos aumentar a insegurança dos estudantes por razões parecidas.  Eu acredito que todas essas coisas se encaixam como parte de uma reação geral — uma reação bipartidária, incidentalmente — contra tendências liberatórias que se manifestou nos anos 60 e tem continuado desde então.

Wilson:  [Para finalizar, estou considerando se você poderia [terminar com algum conselho para os estudantes universitários da atualidade].

Chomsky: Existe um sem número de problemas no mundo hoje, e os estudantes enfrentam um bom número deles, incluindo aqueles que mencionei — a falta de empregos, a insegurança e daí em diante.  Por outro lado, tem havido progresso.  A muitos respeitos as coisas são hoje muito mais livres e avançadas do que já foram … há não muitos anos atrás.  Muitas coisas que se tratavam de verdadeiras lutas, de fato algumas inclusive mal eram mencionadas, digamos, nos anos 60, hoje são … parcialmente resolvidas.  Coisas como os direitos das mulheres. Direitos dos gays.  Oposição à agressão.  Preocupação pelo meio ambiente — que não está nem um pouco perto de onde deveria estar, mas bem além dos anos 60.  Estas vitórias da liberdade não surgiram como presentes do céu.  Elas surgiram de pessoas que batalharam em condições piores às que existem hoje.   Hoje há repressão de Estado.  Mas isso não é nada comparado a, digamos, o Cointelpro nos anos 60.  Pessoas que não sabem sobre isso devem ler e refletir para entenderem isso.  E isso cria muitas oportunidades.  Estudantes, você sabe, são relativamente privilegiados se comparados ao resto da população.  Eles também estão em um período de suas vidas em que são relativamente livres. Isso provê condições para uma série de oportunidades. No passado, tais oportunidades foram aproveitadas por estudantes que estiveram na linha de frente das mudanças, e hoje eles possuem muito mais oportunidades. Nunca será fácil.  Haverá repressão. Haverá reação. Mas é dessa forma que a sociedade avança.

Veja mais histórias relacionadas a: chomsky [5]

Source URL: http://www.alternet.org/civil-liberties/noam-chomsky-kind-anarchism-i-believe-and-whats-wrong-libertarians

Links:
[1] http://www.modernsuccess.org
[2] http://www.alternet.org/authors/michael-s-wilson
[3] http://www.alternet.org/authors/noam-chomsky
[4] http://modernsuccess.org
[5] http://www.alternet.org/tags/chomsky
[6] http://www.alternet.org/%2Bnew_src%2B

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A Carta de Amiens – Um marco para o sindicalismo revolucionário

04 terça-feira ago 2015

Posted by litatah in Anarcosindicalismo, Anarquia

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anarcosindicalismo, carta de amiens, liga sindical operária e camponesa

anarcho-syndicalist_LSOC

Fonte: LSOC (Liga Sindical Operária Camponesa), em novembro de 2014

[TRECHO DO] PREFÁCIO DA IHS (INSTITUT D’HISTOIRE SOCIALE)

Em 13 de outubro de 1906, ao termo de um longo debate consagrado às “relações que devem existir entre as organizações econômicas e políticas do proletariado” (dito de outra maneira, entre os “sindicatos” e os “partidos”), o IXº Congresso da CGT adota uma “ordem do dia”,  cuja importância política só iria crescer ao longo do tempo.

No mês de fevereiro de 1912, o diretor da revista Le MouvementSocialiste, Hubert Lagardelle, então muito próximo dos sindicalistas revolucionários, qualifica o texto de Amiens como a “Carta constitutiva do sindicalismo”, e o Congresso da CGT, reunido em Havre em setembro, o considera como expressão da “constituição moral da classe operária organizada”.

A seguir apresenta-se o texto da Carta de Amiens com a lista de delegados que a propuseram à votação do Congresso.

Informamos que a IHS-CGT publicou uma edição crítica do relatório integral do Congresso de 1906.

A Carta de Amiens

IXº Congresso da CGT

Amiens (8-13 de outubro de 1906)

O Congresso confederal de Amiens confirma o artigo 2, constitutivo da CGT;

A CGT agrupa, fora de toda escola política, todos os trabalhadores conscientes da luta dirigida pela desaparição do assalariado e do patronato…;

O Congresso considera que esta declaração é um reconhecimento da luta de classes que opõe, no terreno econômico, os trabalhadores em revolta contra todas as formas de exploração e de opressão, tanto materiais quanto morais, colocadas em prática pela classe capitalista contra a classe operária;

O Congresso reforça, através dos seguintes pontos, tal afirmação teórica:

Por obra da reivindicação cotidiana, o sindicalismo procura a coordenação dos esforços obreiros, o aumento do bem-estar dos trabalhadores através da realização de melhorias imediatas, tais como a diminuição das horas de trabalho, o aumento dos salários, etc.;

Mas esta tarefa não é senão um flanco da prática do sindicalismo; ele prepara a emancipação integral; que não pode realizar-se senão através da expropriação capitalista; preconiza como meio de ação a greve geral e considera que o sindicato, hoje agrupamento de resistência, será no porvir o agrupamento de produção e de repartição, base da organização social;

O Congresso declara que esta dupla tarefa, a cotidiana e a do porvir, decorre da situação de assalariado que pesa sobre a classe operária e que faz com que todos os trabalhadores, sejam quais forem suas opiniões ou tendências políticas e filosóficas, tenham o dever de pertencera este agrupamento essencial, que é o sindicato.

Como consequência, no que concerne aos indivíduos, o Congresso afirma a total liberdade do afiliado participar, fora do agrupamento corporativo, das formas de luta que bem corresponderem à sua concepção filosófica ou política, reservando-se à solicitar-lhe, em reciprocidade, que não introduza nos sindicatos as opiniões que professa fora deste;

No que concerne às organizações, o Congresso decide que a fim de que o sindicalismo atinja seu máximo efeito, a ação econômica deve-se exercer diretamente contra o patronato, as organizações confederadas não devem, enquanto agrupamentos sindicais, lidar com partidos e seitas que, fora dele e ao lado dele, podem perseguir com total liberdade a transformação social.

SIGNATÁRIOS:

Damos o nome tal e qual escrito na ata seguido entre colchetes do nome verdadeiro e localidade.

Marie [Marie François, trabalhador tipógrafo de la Seine] ;

Cousteau [Cousteau M., trabalhador jardineiro] ;

Menard [MénardLudovic, operário ardoseiro deTrélazé] ;

Chazeaud [Chazeaud Jules, caldeireiro, Lyon] ;

Bruon [Bruon C., construção] ;

Ferrier [Ferrier Louis, serralheiro, Grenoble] ;

  1. David, B. d. T. Grenoble [David Eugène, pintor, Grenoble] ;

Latapie [Latapie Jean, metalúrgico, Paris] ;

Médard [Médard Jean-Baptiste] ;

Merrheim [Merrheim Alphonse, metalúrgico] ;

Delesalle [Delesalle Paul, metalúrgico de instrumentos de precisão, Paris] ;

Bled [Bled Jules, jardineiro, Seine] ;

Pouget [Pouget Emile] ;

Tabard E. [Tabard Etienne, cocheiro entregador, Paris] ;

Bousquet A. [Bousquet Amédée, padeiro, Paris] ;

Monclard [padeiro, Marseille] ;

Mazau [Mazaud Jacques, cocheiro de trem de praça, Seine] ;

Braun [Braun Joseph, operário mecânico] ;

Garnery [GarneryAuguste, ourives, Seine] ;

Luquet [Luquet Alexandre, barbeiro, Paris] ;

Dret [Dret Henri, sapateiro, Paris] ;

Merzet [Merzet Etienne, mineiro, Saône-et-Loire] ;

Lévy [Lévy Albert, empregado] ;

  1. Thil [Thil G., litógrafo] ;

Ader [Ader Paul, operário agrícola, Aude] ;

Yvetot [Yvetot Georges, tipógrafo, Seine] ;

Delzant [Delzant Charles, vidreiro, Nord] ;

  1. Galantus [Galantus Henri, latoeiro, Paris] ;

H.Turpin [Turpin H., viaturas] ;

  1. Samay, Bourse du Travail de Paris [Samay J.] ;

Robert [Robert Charles, curtidor de peles, Grenoble] ;

Bornet [Bornet Jules, lenhador, Cher] ;

  1. Hervier, Bolsa do Trabalho de Bourges [Hervier Pierre, Bourges] ;

Dhooghe, Têxtilde Reims [Dhooghe Charles, tecelão] ;

Roullier, Bolsa do Trabalho de Brest [Roullier Jules, eletricista, Finistère] ;

Richer, Bolsa do Trabalho de Mans [RicherNarcisse, trabalhador em sapatos] ;

Laurent L., Bolsa do Trabalho de Cherbourg [Laurent Léon] ;

Devilar, corretor de Paris [Devilar C.,] ;

Bastien, Têxtil de Amiens ;

Henriot, Allumettier, [Henriot H.] ;

  1. Morel de Nice [Morel Léon, empregado do comércio] ;

Sauvage [moldador de metal] ;

Gauthier [Gautier Henri, caldeireiro, Saint-Nazaire].

Resultado da votação: Pró: 830 – Contra: 8 – Branco: 1

 

Tradução:
JxPx
P/L.S.O.C.

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PARA ASTROGILDO PEREIRA LER

09 quinta-feira jul 2015

Posted by litatah in Anarco-Comunismo, Anarcosindicalismo, Anarquia, História

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anarco, anarco-comunismo, anarco-comunistas, anarco-sindicalismo, anarquia, História, história da anarquia, História do Anarquismo, História Social, História Social; Louise Michel, Marques da Costa, Núcleo de Pesquisa Marques da Costa

cam00389

 

Fonte: Núcleo de Pesquisa Marques da Costa

Por Marques da Costa

 

Distincto adversario!

Venho dar-te uma prova do meu leal reconhecimento pelos modos lhanos de que usaste para commigo na controversia que trata-mos há tempos a respeito de “anarquismo e bolxevismo” – e que, diga-se de passagem, deveria versar, consoante combinamos antes, sobre organização syndical.

Francamente, eu não podia deixar de reconhecer que foste um verdadeiro cavalheiro – ao contrario do que se esperava da banda de cá, onde só se dizia que eu ia defrontar-me com o “maior sophista do seculo”, com o mais cynico de todos os bolxevistas.

Fizeste-me algumas interpelações que logo julguei cavillosas, é certo tive a franqueza e a coragem necessarias para t’o dizer immediatamente, mas os modos como as justificas-te e, sobretudo, os conceitos nobres que expendes-te a respeito das ideas que me orgulho de professar – e que tambem já foram o teu orgulho – tudo sobrelevaram, fazendo com que se arraigasse mais em mim a idea que já tinha de que renegaste o anarquismo “por te haveres convencido da necessidade e da inevitabilidade da dictadura proletaria – e não porque descrêsses da praticabilidade do anarquismo”.

Isso, meu distincto adversario, faz-te respeitavel. Não te illiba de ataques pessoaes, como não te isenta da responsabilidade que de facto te cabe como chefe que és dum partido que, embora rotulado de proletario, foi mais prejudicial aos trabalhadores organizados no primeiro anno de sua existencia, que todos os partidos e grupos politico-burgueses com quem o proletariado brasileiro tem sido obrigado a defrontar-se; mas recommendo-te de algum modo aos nossos olhos, aos meus proprios olhos, que por mais de uma vez teem vislumbrado nos teus actos, nas tuas acções de “politico avançado”, os actos e as acções vulgares de “qualquer politico”…

Tu te houveste bem, portas-te-te como um homem culto, interpelaste-me e respondeste-me como era de esperar de ti. E é para que tu saibas que não passou despercebido semelhante procedimento resolvi escrever-te, para te dizer isto mesmo, para testemunhar-te a minha admiração.

Sei que não se procede sempre assim. Quando longe dos teus adversarios, para te fazeres “de grande” ou para arranjares as coisas a teu geito, mentes, falseias os acontecimentos… Mas desta vez mereces-te palmas e eu bato-as satisfeito.

Dou-te as peralças a que tem direito. Se não t’as desse arrepender-me-hia disso…

Se por um lamentavel descuido é que não te escrevi há mais tempo. Confesso: fui um descuidado. E se não fosse o teu correligionario Octavio, aquelle boticario da General Camara de cujo nome inteiro não me lembro agora, talvez ainda hoje não deixasse saldada esta divida…

Não tens que ficar obrigado. O que aqui faço não é mais que prestar honra ao mérito…

Além disso, eu quero que conste este gesto.

Faço tanta questão disso como faço questão de fazer constar qual foi a tua attitude, quaes os teus modos, as tuas affirmações como bolxevista (desculpa por não te chamar communista), na controversia que tivemos.

Foste um homem! És ainda, creio, um distincto adversario (oxalá não deixes de sê-lo); e eu não quero que de modo algum sejas confundido com um dos mais recentes recipendiarios do P.C., a quem pretendo sovar, pondo ao léo as suas gaifrenas e nigromancias de governalhomaniaco…

Era só o que tinha a dizer-te o adversario sincero.

Matéria publicada na Secção Trabalhista do jornal A Pátria (Rio de Janeiro), no dia 19 de abril de 1923.

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COMMUNISTAS (BOLCHEVISTAS) CONTRA ANARQUISTAS

09 quinta-feira jul 2015

Posted by litatah in Anarco-Comunismo, Anarcosindicalismo, Anarquia, Análise de Conjuntura, Partidos, Institucionalidade,, Correntes da Anarquia, História

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Por Marques da Costa

Fonte: Núcleo de Pesquisa Marques da Costa

A redacção da “A Patria” está sendo novamente assediada por cartas e recados, contendo ameaças ao “director” (?) desta secção a quem acusam de ser um refinado “anarquista”.

Não estranhamos nada disso. Há muito quem não nos “grame” neste posto e não são poucos os que têm tecido os seus “pausinhos” para conseguirem a minha substituição neste “rendoso” cargo…

O que estranhamos é que do meio de todos os que “estrilam” ninguem apareça a defender os anarquistas dos ataques e das emboscadas de que estão sendo victimas, por parte dos bolchevistas.

Ainda hontem, veio “um operario” (grifado e aspeado) protestando contra duas notas publicadas aqui por elementos bolchevistas. Por que?

E alega que há muitas secções de jornaes capazes de substituir a secção da “A Patria”…Por que alega isso?

Ora, que tolo!…

Já não há quem ligue a essas coisas, parecidas com ameaças!

As secções dos outros jornaes tambem soffrem do mesmo mal. A do “O Paiz”: Quanto ali se atesta contra os anarquistas e os bolchevistas!

Nem pode deixar de ser assim. Esta é que é a verdade!

A “Gazeta”, como “O Rebate”, tambem não nos poupa: casca em vós, bolchevistas, e em nós, anarquistas, sem dó nem piedade!

Por que? Simplesmente por isto: porque o seu redactor nem é uma coisa nem outra coisa.

Não é por isto mesmo?

Pois é! Podemos ter certeza.

Se lá estivesse um bolchevista – claro! – aí do lombo dos anarquistas!

Mas o caso, o mais importante deste caso, é que se me pretende responsabilizar pelo que os outros dizem! Não, isso não é sério!

Protesto!

Basta o que digo e o que faço, para a responsabilidade já não ser pequena.

Deixemo-nos destas intrigas, destas bisbilhotices e cartas anônimas! É feio, é ridículo e só prova que os argumentos reais e plausíveis são verdadeiramente poucos.

Matéria publicada na Secção Trabalhista do jornal A Pátria (Rio de Janeiro), no dia 26 de maio de 1923.

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Alexander Berkman – Algumas Remniscências de Kropotkin

16 terça-feira jun 2015

Posted by litatah in AIT, Alexander Berkman, Anarco Ecologia, Anarco Feminismo, Anarco Primitivismo, Anarco Punk, Anarco-Comunismo, Anarcosindicalismo, Anarquia, Anarquia Verde, Anti Homofobia, Anti Machismo, Anti Misoginia, Anti Transfobia, CNT-FAI, Comuna de Paris, História, Kropotkin, Teoria

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kropotkin-blog

Fonte: Literatura Anarquista

Isso foi por volta de 1890, quando o movimento anarquista na América ainda estava em sua infância. Até então contávamos com apenas meia-dúzia de jovens ardendo de entusiasmos por um sublime ideal,  disseminando apaixonadamente a boa nova entre a população de New York Ghetto. Nossas reuniões eram realizadas num obscuro salão na Orchard Street, mas considerávamos aqueles esforços altamente bem-sucedidos . Toda semana compareciam às reuniões um número cada vez maior de pessoas, manifestando um profundo interesse nos ensinamentos revolucionários, e ali eram debatidas noite adentro as questões mais vitais  com profunda convicção e visão jovial. Para muitos de nós, parecia que o capitalismo havia alcançado os limites de suas possibilidades demoníacas e a Revolução Social não poderia estar muito distante. Mas havia também um grande número de questões  e problemas intricados e difíceis de resolver envolvidos no crescimento do movimento, os quais já não conseguíamos resolver satisfatoriamente sozinhos. Desejávamos que nosso grande professor Kropotkin estivesse entre nós, ao menos por uma breve visita, a fim de esclarecer alguns pontos mais complexos e assim tirarmos proveito de sua inspiração e apoio intelectual. E então, quanto estímulo sua presença atrairia para o movimento!

Decidimos reduzir os custos de vida ao mínimo e devotar todos os ganhos para custear as despesas que envolviam o convite  de Kropotkin a uma viagem ao redor da América. O assunto foi debatido entusiasticamente nas reuniões do grupo pelos mais ativos e devotados camaradas; todos eram unânimes no grande plano. Uma longa carta foi enviada, convidando nosso professor a participar de um circuito de conferências na América, enfatizando a necessidade de sua presença.

Sua resposta negativa deu-nos um choque: tão certos que estávamos de sua aceitação, tão convencidos da necessidade de sua visita. Mas a admiração que sentíamos por ele apenas cresceu quando ouvimos as razões de sua recusa. Ele desejaria muito poder nos visitar– escreveu Kropotkin – e apreciava profundamente o espírito de nosso convite. Esperava visitar os Estados Unidos algum dia no futuro e sentiria grande prazer em estar junto à tão bons camaradas. Mas naquele momento, não poderia custear sua vinda por conta própria e não usaria o dinheiro do movimento para tal propósito.

Eu ponderei sobre suas palavras. Seu ponto de vista era justo, eu pensava, mas se aplicava apenas a circunstâncias ordinárias. Seu caso, no entanto, eu considerava excepcional, e lamentava profundamente a sua decisão de não vir. Mas para mim, suas razões simbolizavam a humanidade e a grandeza de sua natureza. Eu o imaginava como o ideal do revolucionário anarquista.

Anos depois, enquanto estava na Western Penitentiary of Pensylvania, a esperança de encontrar nosso Velho e Grande Kropotkin iluminou as trevas de minha cela alguns instantes. Amigos me notificaram que Peter havia chegado ao Estados Unidos pelo Canadá, onde havia participado de certo congresso de cientistas. Fui informado que Peter pretendia me fazer uma visita, e então passei a contar os dias e as horas aguardando  sua tão esperada vinda. Mas, ai!, a sorte concorria contra o encontro com meu professor e camarada. Ao invés de ser chamado para ter com meu querido visitante, fui solicitado pelo gabinete do Guarda*. Suas mãos seguravam uma carta na qual reconheci a nítida e pequena assinatura de Peter. Sobre o envelope, após o meu nome, Kropotkin havia escrito “Prisioneiro Político”.

O Guarda ficou furioso. “Não existem prisioneiros políticos em nosso país livre!”, ele rugiu. E de repente rasgou o envelope em pedaços. Eu enlouqueci com tal profanação. E pronunciei em seguida um caloroso argumento sobre a liberdade americana, no decurso do qual acabei chamando o Guarda de mentiroso. Ele considerou o fato como lesa majestade e exigiu que eu lhe pedisse desculpas. Recusei. O resultado foi que ao invés de encontrar Peter, fui sentenciado a 7 dias de solitária, numa cela de dois por quatro pés, absolutamente escura, 15 pés abaixo da terra, tendo uma mísera fatia de pão como ração diária.

Isso foi por volta do ano de 1895. Nos anos seguintes, Peter Kropotkin visitou a América repetidas vezes, mas nunca tive a oportunidade de vê-lo, sobretudo porque cumpria pena, na qual por dez anos fui privado de visitas e não me sendo permitido ver quem quer que seja. Um quarto de século teve de se passar antes que eu pudesse tomar as mãos da minha companheira entre as minhas. Foi na Rússia, em março de 1920 que me encontrei com Kropotkin pela primeira vez. Ele residia em Dmitrov, uma cidadezinha à 60 verats de Moscou. Eu me encontrava então em Petrogrado (Leningrado), e as condições da ferrovia eram tais que viajar do Norte à Dmitrov estava fora de cogitação. Depois, tive oportunidade de visitar Moscou, onde fiquei sabendo que o Governo havia arranjado uma visita para o editor do London Daily Herald, George Lansbury e um de seus colaboradores à Kropotkin em Dmitrov. Juntamente aos camaradas A. Schapiro e Emma Goldman, tirei proveito da situação.

O encontro com “celebridades” é geralmente desapontador: raramente a realidade bate com a figura de nossa imaginação. Mas no caso de Kropotkin não foi assim; ambos fisicamente e espiritualmente ele correspondia quase  exatamente ao retrato mental que eu possuía dele. Aparentava notoriedade como em sua fotografia, com seu olhar amável, seu sorriso doce e sua barba farta. Cada vez que Kropotkin adentrava a sala, parecia iluminá-la com sua presença. Sua marca de idealista era tão impressionante que a espiritualidade de sua personalidade podia quase ser sentida. Mas chocava-me a visão de seu definhamento e debilitamento.

Kropotkin recebia a merenda acadêmica, consideravelmente superior à ração destinada aos cidadãos comuns. Mas longe do suficiente para manter-se vivo era uma verdadeira batalha para afugentar o lobo da fome porta afora. Questões de gasolina e iluminação também eram matéria de agitação constante. Os invernos eram severos e a madeira muito escassa; querosene difícil de conseguir, e era considerado luxúria queimar mais do que uma lamparina por casa. Esta carência era particularmente sentida por Kropotkin; e gravemente interferiu em seu labor literário.

A família de Kropotkin foi desalojada de sua residência em Moscou diversas vezes, pois as dependências eram requisitadas [sic] a fins governamentais. Foi então que se decidiram mudar para Dmitrov. Ficava apenas à meia centena de verats da capital, se bem que poderia distar mil milhas, tamanho  o isolamento em que vivia Kropotkin. Seus amigos raramente podiam visitá-lo; notícias do mundo Ocidental, trabalhos científicos, ou publicações estrangeiras eram inalcançáveis. Naturalmente, Kropotkin sentia profundamente a falta de companhia intelectual e relaxamento mental.

Eu estava ansioso para me instruir acerca de suas perspectivas sobre a situação da Rússia, mas logo entendi que Peter não se sentia livre para se expressar na presença dos visitantes ingleses. A conversação, portanto, foi de caráter geral. Mas uma de suas observações foi muito significativa e me deu a chave de sua atitude. “Eles mostraram”, disse ele se referindo aos Bolcheviques, “como a Revolução não deve ser feita”. Eu sabia, naturalmente, que enquanto anarquista, Kropotkin não aceitaria nenhuma posição de Governo, mas queria saber o porque dele não participar da reconstrução econômica da Rússia. Apesar de velho e fraco fisicamente, suas sugestões e conselhos poderiam ser muito úteis à Revolução, e sua influência de grande vantagem e encorajamento para o movimento anarquista. Acima de tudo, eu tinha interesse em escutar suas idéias positivas sobre a conduta da Revolução. Pois o que tinha ouvido até então da oposição revolucionária, em sua maioria, eram apenas críticas, carecendo da útil construtividade.

Aquela manhã se passou numa conversa desconexa sobre as atividades no front, sobre o crime do bloco aliado em recusar remédios aos doentes e a disseminação de doenças como resultado das condições insalubres e da escassez de alimentos. Kropotkin aparentava cansaço, parecia exausto pela mera presença dos visitantes. Estava velho e fraco; e eu temia que, sob tais condições, não conseguisse viver por muito mais tempo. Estava claramente subnutrido, embora tenha dito que os anarquistas da Ucrânia tentavam tornar sua vida mais fácil, enviando suprimentos de farinha e outros produtos. Quando Makhno ainda mantinha relação amigável com os Bolcheviques, também se habilitou a enviar provisões. Para Peter não se cansar tanto, o deixamos a sós mais cedo.

Alguns meses depois, tive outra chance de visitar nosso velho camarada. Era verão e Peter parecia ter rejuvenescido com a ressurreição da Natureza. Parecia mais jovem, com boa saúde e cheio de espírito de juventude. Sem a presença de estranhos, como o jornalista inglês, ele se sentia em casa, e conversávamos livremente sobre as condições russas e sobre suas atitudes e perspectivas para o futuro. Era o genial e Velho Peter novamente, com um refinado senso de humor, afiadas observações e a mais generosa humanidade. Em primeiro momento ele repreendeu-me pela postura anti-Guerra, mas rapidamente mudou o assunto para canais menos periculosos. A Rússia era o nosso principal ponto de discussão. As condições eram terríveis, como todos concordavam, e a Ditadura era o maior dos crimes Bolcheviques. Mas não havia razão para perder a fé, ele me assegurava. A Revolução e as massas são maiores do que qualquer Partido político e suas maquinações. Este último poderia triunfar temporariamente, mas o coração das massas russas era incorruptível e chegaria por si mesma ao claro entendimento do mal da Ditadura e da tirania Bolchevique. A atual vida russa, dizia ele, é uma condição artificial forçada pela classe governante. O governo de um pequeno Partido, assentado sobre falsas teorias, métodos violentos, erros medonhos e ineficácia geral. Eles estavam suprimindo a expressão da vontade e iniciativa do povo, que sozinhas bastariam para reconstruir a arruinada vida econômica do país. A estúpida atitude dos Poderes Aliados, o bloqueio e os ataques à Revolução pelos intervencionistas ajudavam a reforçar o poder do regime Comunista. Mas as coisas mudariam quando as massas despertassem para a compreensão de que ninguém, nenhum Partido político ou grupelho governamental, deveria ter a permissão de, no futuro, monopolizar a Revolução, controlá-la, ou dirigi-la, pois tal intento resultaria inevitavelmente na morte da própria revolução.

Naquela ocasião, discutimos várias outras fases da Revolução. Kropotkin enfatizava particularmente o lado construtivo das revoluções, especialmente que a organização da vida econômica deveria ser tratada como a primeira e a maior necessidade de uma revolução, como fundamento de sua existência e de seu desenvolvimento. Este pensamento, ele quis imprimir mais forçosamente nos próprios camaradas, para que servisse de guia nas grandes batalhas vindouras do proletariado internacional.

Minhas visitas a nosso querido Peter foram um  enorme prazer intelectual e espiritual . Eu estava de partida da Ucrânia em direção a uma longa viagem em prol do Museu da Revolução de Petrogrado, mas ainda esperava muitas outras visitas a nosso velho e bravo professor de coração e cérebro tão maravilhosos. Não era para ser. Ele morreu alguns meses depois, em 8 de fevereiro de 1921. Só pude alcançar seu leito de morte a tempo de dizer meu último adeus. Um grande Homem, um grande anarquista havia partido.

Nota do Editor: 

* O Guarda (The Warden) é o governador da prisão e seu ditador absoluto.

This page has been accessed by visitors outside of Pitzer College times since February 12, 2000.
This manuscript is part of the International Institute of Social History’s Alexander Berkman Archive and appears in Anarchy Archives with IISH’s permission.

Atualizado: 03/07/2011

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A anarquia como alternativa ideológica à esquerda partidária cooptada.

15 segunda-feira jun 2015

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Por Gilson Moura Henrique Junior

Pra discutir anarquismo e organização social na conjuntura atual é preciso primeiramente definir um quadro de raro crescimento da anarquia como ideologia no interior da sociedade brasileira desde os primeiros anos do século XX, arrisco dizer.

A partir do entendimento da dimensão histórica do crescimento do ideário anarquista na sociedade brasileira após décadas de hegemonia quase absoluta do pensamento socialista partidário podemos começar a avaliar os desafios desse tipo de crescimento para coletivos e organizações anarquistas.

Primeiro porque se esse crescimento efetivamente atua no rastro do vácuo que a cooptação dos partidos de esquerda pela institucionalidade deixa, ele também compete com a ocupação deste vácuo por forças conservadoras.

Além disso, a ocupação de espaços da esquerda partidária nas periferias, comunidades, universidades e sindicatos torna anarquistas e autonomistas inimigos prioritários das forças partidárias de esquerda, até mais inimigos que as forças conservadoras, dado quea lógica de exercício da política a partir da ocupação de espaços é eixo central da metodologia de efetivação da política partidária. Perdendo espaço dentro do seu campo clássico de atuação, a esquerda partidária passa a ter de disputar capital político em duas frentes, no espaço externo a seu terreno prioritário de atuação com a direita tradicional e no interior de seu espaço “natural” de ocupação com a esquerda não partidária.

Acostumada à hegemonia absoluta, aesquerda partidária atua de forma flagrantemente truculenta na disputa poíltica no interior de seu campo, utilizando detodas as manobras possíveis para realizar a manutenção desta hegemonia. Para completar, ao ler que capital político se reflete em voto e a ocupação do aparato institucional e estatal é objetivo estratégico e não só tático (seja no parlamento ou em sindicatos,grêmios e DAs), a esquerda partidária acaba entendendo que a defesa do Estado e da “república” é objetivo a priori, com esse entendimento entra em conflito com a ideia de revolução e passa a uma contradição inerente entre discurso e prática,onde defende ruptura no discurso e na prática atua na manutenção do status quo, usando como álibi a defesa do estado de direito como parte da defesa dos direitos humanos fundamentais.

Essa contradição fica mais gritante quando essa defesa do estado de direito como parte da defesa dos DH acaba por pouco fazer para protegê-los quando as vítimas das violações de DH são inimigas deseus objetivosem seu próprio campo,e ai começa o debâcle.

Esse débâcle da esquerda partidária ocorre com sua degeneração ética, moral e política. E não ocorre apenas aqui.

A omissão internacional dos partidos socialistas com relação à perseguição do estado a anarquistas é o fundo do poço da forma partido e a cereja do bolo cuja receita é conciliar na institucionalidade enquanto ataca toda força política contra hegemônica fora da institucionalidade.

Hoje os partidos socialistas (do Syriza ao PSOL, do Bloco de esquerda de Portugal ao PODEMOS) são a medida entre a conciliação com a direita pra tentar uma vaga no estado e o serviço sujo de ser sócia do estado da criminalização da esquerda não partidária. No fim das contas a esquerda partidária mundo afora elegeu a esquerda não partidária como inimiga e a centro direita liberal como aliada.

Hoje a esquerda partidária é parte do capital e não apenas na utilização do estado para construir seus nichos de poder e na conciliação com a direita liberal paragarantir direitos no plano comportamental ou que não incorrem diretamente com corte de classes claro. A esquerda partidária também é parte do capital ao estruturar-se de forma fordista na sua organização interna.

Ao tornar-se uma reprodução do estado e da organização fordista em sua organização interna a esquerda partidária concorre para a manutenção das desigualdades, da hierarquia, da concentração de poder e da opressões. Reproduzindo em seu interior a hierarquia, a divisão de classes, a especialização e a separação entre tipos diferentes de trabalho (divisão entre intelectuais e base operária e trabalhadora),típicas do fordismo e da hierarquia do capital, a esquerda partidária atua como linha auxiliar rebelde da hegemonia de pensamento capitalista.

Por isso nela o peso da defesa do estado e da república, da centralização e da hierarquia, é superior que a defesa da descentralização, da desierarquização, da desestatização e da produção nuclear do poder, dinamitando a hierarquia. Por issoquequem defendealgo similar étornado inimigo,enquanto liberais são mais que aliados, são co-formadores de política e programa.

Assim é cristalino que a defesa difusa dos DH, direitos LGBT, do feminismo e racismo, apartados de sua discussão enquanto elemento de luta para superação transversal e estrutural do arcaísmo da sociedade e infectado obviamente pela questão de classe, torna-se eixo central da política que a esquerda partidária leva a cabo, sem jamais discutir tudo isso com o necessário corte de classes e com a necessária horizontalização para que o Estado, fiador de todas as opressões, deixe de existir junto com toda a hierarquia.

Quando vemos o debate sobre direitos LGBT praticamente centrado na defesa do direito ao casamento; o debate sobre prostituição centrado na defesa do direito liberal das mulheres a se prostituírem; o debate sobre racismo pautado basicamente na defesa de reparação pelo estado; o debate ambiental centrado em sustentabilidade, e não na superação do capital como um todo (Da sanha produtivista à centralização causadora da ruptura metabólica do meio ambiente), que permite que se denuncie danos ambientais sem mexer com combustíveis fósseis, matriz energética e centralização da produção com o parte fundamental do debate ambiental; e toda discussão sobre indígenas e quilombolas passando ao largo de todo processo de sua identidade cultural e visão política, da lógica não hierárquica de muito de suas organizações e de percepções díspares da cultura hegemônica, quando vemos tudo isso o que vemos é a aliança política entre esquerda e liberais na produção de política, com abandono inclusive de toda pauta de debate da própria esquerda socialista que inclui nisto tudo a revolução e a superação sistemática do capital,dentro e fora de todas estas questões.

E no que a anarquia (E o autonomismo e toda ideologia libertária horizontalizante) pode ser alternativa ideológica à esta esquerda? Primeiro deixando de centrar-se no combate ao voto, reproduzindo com sinal inverso a ideologia do Estado como parte estrutural do debate político. Em segundo lugar deixando de entender-se de forma iluminista como salvadora da humanidade e percebendo a diversidade da produção teórica e de ação política sobrevivente e alternativa aos mantras quase teológicos do marxismo-leninismo. Dai em diante anarquistas, autonomistas,etc devem exercitar a ação horizontalizadora e desierarquizante das ideias produzidas dentro deste marco ideológico. Construindo núcleos de ação popular nas diversas localidades, classes,bairros,etc e atuando de forma a produzir do local pro geral uma ideia de sociedade sem amos,nem um pouco interessada na construção de figuras públicas para eleição de prefeitos, deputados ou outros cargos mantenedores das finanças da burocracia.

Base teórica pra construir essa política não falta, além de não ser refém de leituras estanques do início do século XX.

O importante é perdermos o medo de sair pras ruas e ocupar espaços abandonados enfrentando o estado em todas as suas formas, fugindo da ditadura de uma suposta unidade filha dileta da centralização hierarquizante que busca uma síntese opressora vivida e construida por consensos falsamente construídos ou por votações manobradas.

É fundamental construir coletivamente saídas que contemplem cada localidade e que sejam ferramentas de avanços locais que concorram para unidades percebidas horizontal e coletivamente sem perda de direitos e de propostas,cujo consenso ou sua ausência sejam resolvidos sem a hierarquização repressora.

Não há receita de bolo, cada povo,cadarua,cada cidade tem seus modos de ver,sentir e agir. Transformá-los em um Estado, um país,um Estado-Nação,falantes de uma só língua, já foi uma violência opressora. Dar a eles saídas que não são deles seria outra.

É preciso que sejamos alternativa, até para resistirmos à opressão coletiva do estado e de seus aliados,partidos de esquerda incluídos.

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Nossos sonhos não cabem em suas Urbes

11 quinta-feira jun 2015

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Por Agropunk e AltDelCtrl

«A cidade se apresenta
centro das ambições
para mendigos ou ricos
e outras armações.
Coletivos, automóveis,
motos e metrôs,
trabalhadores, patrões,
policiais, camelôs.»

(Chico Science & Nação Zumbi, A Cidade.)

Fonte: Protopia


Nos dias de hoje, a maior parte da humanidade faz das cidades, especialmente as grandes metrópoles, o centro “natural” de suas vidas,[1] da mesma forma que considera “naturais” as sociedades divididas em classes e toma por “natural” a divisão do mundo entre espaços urbanos e rurais. Muitas pessoas acreditam que as urbes são por excelência espaços da cultura, da técnica e da política, enquanto o meio rural representa atraso, a ausência de civilidade; como um celeiro, um lugar pleno de recursos e minimamente povoado. Nessa lógica, viver em áreas ruais é considerado falta de oportunidades de vida e, portanto, alcançar uma vida melhor passa necessariamente por ir para a cidade.

Hegemônico, tal entendimento não se dá apenas entre os habitantes das cidades, mas também entre as populações dos próprios espaços rurais. Não é raro que estes últimos assumam para si a posição de inferioridade em relação àqueles que vivem nos meios urbanos, menosprezando a sabedoria ligada a conhecimentos tradicionais. Fundamental ao modo de ser das atuais sociedades de classe, esta visão de mundo pode ser chamada “urbanocentrismo”.


Origens

Ainda que a vida nas cidades se mostre tão antiga quanto as primeiras “civilizações”, a divisão dos espaços entre áreas urbanas e rurais não fez parte do entendimento dos povos por incontáveis gerações. Profundamente relacionados com as mais diversas paisagens e territórios, possuindo amplo conhecimento em relação a eles, muitos povos surgiram e desapareceram alheios a esta classificação e ordenamento do espaço que para todos efeitos é recente, datado da era moderna, de origem européia.

Mesmo o significado do termo “cidade” vem sendo tomado enquanto generalização para todos os tipos de aglomerados humanos mais ou menos permanentes, de extensão ampla e densamente povoado, se comparados com o contexto em que se encontram. As mais antigas cidades conhecidas foram fundadas na chamada “idade do ferro pré-histórica”. Grandes ruínas e resquícios em pedra e argila, assim como textos da antiguidade, comprovam a existência destas sociedades citadinas em locais hojes cobertos por desertos e selvas.[2]

As cidades surgiram em muitos contextos históricos, apoiadas em duas formas de opressão correlacionadas: a escravidão pela guerra e a posse exclusiva e permanente da terra. Os primeiros povoados sedentários, muito anteriores às cidades, surgiram como uma provável vantagem estratégica, uma inovação que uns poucos povos recorreram com a meta de garantir o monopólio sobre locais. Surgiram em locais onde potencialmente existiam recursos alimentícios e matérias primas para ferramentas, ou ainda vias importantes entre pontos de estadia e espaços considerados sagrados.[3]

Como consequência lógica destes pequenos monopólios, outros grupos, geralmente não-sedentários, que antes partilhavam do mesmo território e se utilizavam dos mesmos recursos, foram permanentemente privados destes recursos. Esta privação provavelmente intensificou a ocorrência de guerras por territórios, com fortificações sendo construídas e aperfeiçoadas para os povos em guerra e seus povoados permanentes pudessem existir e prevalecer.

Via de regra, escravos de guerra tornaram-se a mão de obra explorada na construção das antigas civilizações, e em menor medida somaram-se a eles os escravos por dívida.[4] Esta correlação de sujeição entre povos diferentes é uma das mais prováveis origens da desigualdade entre castas e estamentos, e um importante precedente deste processo que nos últimos séculos deu forma às sociedades divididas em classes. E esta divisão é inerente ao processo de construção da vida em cidades.

O que genericamente denominamos “cidade” na antiguidade e entre sociedades não-ocidentais foi chamado de formas distintas, conforme sua organização sociopolítica. Na contemporaneidade, o termo “cidade” abrange tanto o que os gregos antigos chamavam de “pólis”, quanto o que etruscos e romanos denominavam “urbe” e “civitas”. No entanto, estes termos se referem a contruções distintas, o que evidencia a transformação e a manipulação dos termos de acordo a certos interesses históricos. Enquanto a “pólis” grega, ainda que baseada na premissa do trabalho escravo, era o espaço de existência e exercício de autonomia de uma coletividade, a “civitas” etrusca fazia menção à liga de fratrias e estruturas familiares que possuíam em comum o culto a antepassados e ao lar. Para os etruscos “urbe” era o nome dado aos espaços físicos rituais em que se realizavam conciliábulos e importantes reuniões, e onde se mantinha o fogo sagrado de um “civitas”.

Os romanos não apenas herdaram esta terminologia etrusca, como também lhe conferiram novos significados. No entendimento romano “urbe” inicialmente foi o nome dado ao espaço intermuros da cidade de Roma. Posteriormente “urbe” passou a designar todo aglomerado humano e seu suporte material, construído ou dominado pelos romanos. “Civitas” entre os romanos era um conjunto heterogêneo de civis (romanos e romanizados) com posses e escravos reunidos e estabelecidos em determinado espaço. As palavras “civilização”, “civil”, “cidade”, “cidadão”, “urbe” e “urbano” são evidências linguísticas da amplitude do legado romano nas atuais sociedades européias e ocidentais.

Os romanos possuíam ainda um outro termo em sua classificação socioespacial: “Ager” é geralmente traduzido como “terra” ou “rural”. Mas diferente do termo “rural” da atualidade, ao “ager” não se contrapõe a “urbes” e “civitas”, mas as contém. “Ager públicus” era o nome dado à totalidade das terras tomadas das populações dominadas por Roma e possuída pelos patrícios, e muitas vezes se confundia com os próprios domínios imperiais. Era familiar aos romanos, não só a noção de posse e utilitarismo em relação à terra, como também a supremacia da “urbe” em relação à “ager” na qual estava contida. Estes são importantes precedentes da dicotomia entre urbano e rural que na atualidade encontra-se consolidada e naturalizada.

Inicialmente baseado no sentimento de superioridade que as sociedades industriais têm de si próprias em comparação com outras sociedades, o conceito de “civilização” foi extendido para toda sociedade que tenha seu modo de vida baseado em hierarquizações – social, técnica, religiosa e científica -, e cujas instituições se concentrem majoritariamente em cidades. A ideia de superioridade entre os civilizados tem origem no sentimento de superioridade das elites européias em relação as populações das classes baixas. Generalizado através de propaganda patriota no âmbito de uma região, servindo para o surgimento dos estados nacionais modernos. Desde então, este mesmo sentimento de superioridade tem sido a base ideária para dominação de povos geografica e culturalmente distantes dos europeus modernos, legitimando desta forma seus ímpetos de colonização.[5]

“Bárbaros” foi a expressão pejorativa que os “civilizados” impuseram a diferentes povos que se contraporam violentamente à intenção de submissão característica das civilizações, conseguindo mesmo em alguns casos, derrubá-las. No que tange a violência, a principal diferença entre barbárie e civilização está na capacidade dos civilizados em organizar o exercício da violência de forma calculada, torná-lo mais cirúrgico e estratégico.

Via de regra as civilizações são muito mais violentas que os povos que as cercam, uma vez que se preocupam constantemente em encontrar e manter em seu poder os meios para dominar povos que lhes são vizinhos.[6] E não seria a barbárie, para além da diferença de costumes, uma reação característica dos povos à violência das civilizações que sobre eles desejam se sobrepor para enfim dominá-los? Não seria a barbárie também um esforço incondicional de libertação e contraposição a esta opressão?

«Anarquismo não é uma fábula romântica mas a realização consciente, baseada em cinco mil anos de experiência, de que não podemos confiar o gerenciamento de nossas vidas a reis, padres, políticos, generais e executivos”»

(Edward Abbey, A Voice Crying in the Wilderness, 1989)

Di-visões

O urbanocentrismo se dá em certa compreensão de mundo na qual a dimensão do “humano” (chamada de “sociedade” ou “cultura”) encontra-se apartada de tudo mais que existe independente das ações e vontades humanas (a este “tudo mais” chamou-se “natureza”). Esta visão de mundo fundada na separação foi fundamental para que uns poucos grupos humanos, que por muitas eras foram uma parte insignificante da humanidade, pudessem expandir o domínio de sua perspectiva, se apropriar e modificar os elementos das paisagens, para sua própria comodidade e conveniência.

Cada vez mais indiferentes aos processos e ciclos “naturais”, as únicas restrições para a propagação desta perspectiva exploratória residiam nos limites impostos pelas limitações da técnica. No entanto, após a ascensão da burguesia no ocidente que através de sua revolução industrial – que colocou a serviço do capital não só as ciências modernas, mas os saberes acumulados por milhares de anos – estas restrições foram gradativamente diminuindo. O avanço das técnicas permitiu a estes “humanos” colocarem suas vontades e ambições sobre o “natural”, impondo também esta perspectiva a tantas outras formas de ser “humanos”. Desta forma o urbanismo e a dicotomia urbano/rural consolidaram-se enquanto projeto político de formatação espacial dos poderes da contemporaneidade.

«As metrópoles contemporâneas formam os pontos de concentração máximos das técnicas políticas do capitalismo (…) Um meio no qual tudo é feito para que o humano apenas interaja consigo próprio, cresça separadamente das outras formas de existência, que as frequente e as utilize sem nunca as encontrar.»

(A Chamada)


Defender que nossos sonhos não cabem em suas urbes não implica numa apologia à vida no meio rural, seja em sua forma positivada – idílica e romantizada – ou na forma “realista” – por efeito das forças políticas dominantes que definem o que é o “real”. O que chamamos de “rural” é apenas o resultado da formatação, da redução das paisagens, relevos e biomas pela política espacial urbanocentrica capitalista, em áreas de extração de recursos e alimentos. O ruralismo é uma política que serve à urbanicidade. Esta política se coloca de forma que tudo (e todos) que não é urbano seja reduzido a simples reserva de matéria prima (e mão de obra) a ser (constante e eternamente) explorada em favor da vida nas cidades.

Se posicionar contra o urbanocentrismo não implica também em uma refutação a tudo quanto exista no meio urbano. Mas passa por entender que as cidades se tornaram invólucros luminosos para relações e práticas, que apenas pela arbitrariedade da tradição se definem sumamente “urbanas”. Este entendimento implica em reconhecer o caráter de aprisionamento destas mesmas práticas e relações consideradas dependentes dos espaços urbanos.

Com a divisão urbano/rural sendo incontestável, a ideologia da cidade alcançou a pretensão de englobar (e se sobrepor a) todas as diferenças. É justamente no meio urbano guiado pelo princípio dogmático do crescimento econômico infinito, o contexto em que o capitalismo se mostra mais “desenvolvido”.

A naturalização da urbe é constantemente produzida e reforçada pela máquina capitalista de administração de desejos. Seu poder é tão grande que, atualmente, poucos homens e mulheres conseguem perceber as formas mais ostensivas de controle e dependência a que estão submetidos nas grandes cidades. Obrigados a consumir bens, serviços e comodidades produzidas por corporações, submetidos a instituições estatais que sobretaxam cada aspecto de suas vidas, muitos estão condenados a uma vida de dependência do trabalho assalariado. Positivado e cultuado (e não apenas entre os “burgueses”) o trabalho assalariado nada mais é do que uma forma sofisticada de escravidão por dívida. A maior parte das funções assalariadas são tediosas e desgastantes. Boa parte se dá em ambientes quase totalitários, uma vez que no capitalismo a ilusão democrática jamais deu o ar de sua graça na organização dos grandes meios de produção.

«O desenvolvimento do meio urbano é a modelação capitalista do espaço. Representa a escolha de uma certa materialização do possível, com exclusão de outras… é imposto através da chantagem da utilidade (…) este modo de habitação, não é criado pelas pessoas, mas sem elas e contra elas.»

(Attila Kotanyi e Raul Vaneigem – Programa elementar da oficina de urbanismo unitário)


Os processos de produção são extremamente poluentes e comprometem extensões de água, ar e solo cada vez maiores. Para tornar os produtos mais duráveis e atraentes, industriais fazem uso de um sem número de substâncias tóxicas, submetendo bilhões de pessoas a epidemias de câncer e outras doenças degenerativas. As causas das doenças não são questionadas pela medicina, sequestrada pelo capital, e epidemias tornam-se sinônimo de lucro irrestrito das grandes farmacêuticas corporativas.

A conformação dos espaços só pôde se dar através da administração dos desejos. Através das mídias de massa a população global se submete a uma espetacular vitrine brilhante – filmes românticos em Nova York, promessas de felicidade em Paris, cartões postais do Rio de Janeiro – grandes carga de propaganda e ilusão que oculta os grandes horrores dos nossos dias: o emaranhado de ganância, técnica e inconsequência que não só compromete a qualidade de vida desta geração, como também torna mais e mais difícil a expectativa de vida das gerações futuras!


Colaboracionismo

O urbanocentrismo não se sustenta por uma vontade consciente, mas por restrições imaginativas, essencialização das fragilidades e fechamentos para outras possibilidades – elementos que se encontram presentes em todas populações nas cidades. Mesmo entre aquela parte da população que se mostra descontente com o atual estado das coisas, mesmo entre os poucos que se dizem “revolucionários”, são poucos os que reconhecem e questionam as arbitrariedades capitalistas na formatação socioespacial por trás da divisão urbano/rural.

O reformismo não é de exclusividade dos reformistas, e há mesmo aqueles que se dizendo “revolucionários”, e acreditando atuar pelo surgimento de movimentos massivos, limitam suas lutas a demandas frente às autoridades estatais e capitalistas, apelam para direitos constitucionais, a pleitos por acesso a serviços estatais, demandas de amenizações nas formas de exploração entre classes, e abrandamentos da repressão estatal.

Esta forma de “ação revolucionária” tem levado não poucos militantes a constante frustração. Frente ao poder de indução da máquina capitalista de administração de desejos, suas estratégias (baseadas em pressupostos do século XIX) têm se mostrado por décadas ineficazes. E as “massas” que buscavam, tanto as populações urbanas quanto rurais, não enxergam nestes grupos, mesmo que contrários ao capitalismo, soluções concretas para as demandas mais simples de suas vidas cotidianas.

Entre a maior parcela destes “revolucionários” a formatação socioespacial imposta por este sistema quase nunca é questionada. Para além da militância – assembleias, encontros, manifestações, e ações de propaganda – grande parte deles também vive nas cidades e está submetida à máquina capitalista de administração dos desejos, aprisionada através das comodidades e convenções da vida urbana. A dependência imbricada na urbanidade gera zonas de conforto onde muitas fragilidades são cultivadas. Vira-se a cara para as consequências escondidas das facilidades e confortos urbanos, e no cotidiano assume-se as mesmas escolhas colaboracionistas. Estes opositores do capitalismo encontram-se presos aos ciclos de trabalho assalariado, aos pagamentos de impostos para o estado, e ao consumo de bens produzidos pelo capital. Nesse processo, abre-se mão da (incômoda) crítica à escravidão do salário, e é adiada – quando não ignorada – a busca coletiva pela autonomia.

O que são políticas de inclusão numa sociedade essencialmente excludente, senão uma forma arrojada de sadismo institucional e domesticação disfarçada? (Para não falarmos do que está por de trás de derrotas) o que está implicado nas vitórias que estes grupos opositores alcançam? São elas meios para a transformação social, para a instituição de uma sociedade igualitária e livre em que as formas de autoritarismos para além do estado e do capital sejam abolidas? Não seriam estas vitórias mecanismos de legitimação do capital e do estado, que baseando-se em reformas ínfimas garantem a continuidade e o avanço de uma sociedade cada vez mais opressiva e desigual?

«…para livrar-se dos estados (…) (e dos capitais) é preciso unicamente não participar em nada, basta não sustentá-los e então cairão aniquilados. (…) E para não participar em nada dos estados nem sustentá-los é preciso estar livre da fragilidade que arrasta os homens ao laço dos estados (e dos capitais) que lhes fazem seus escravos ou seus cúmplices.»

(Liev Tolstoi)

Não-colaboração e autonomia

«Piratas
plantados
na carne da aventura
desertaremos as cidades
ilhas de destroços»

(Roberto Piva)

Revolucionário é efetivamente não colaborar em nada com o capital ou com o estado, não se submeter às ciladas de sua política de formatação espacial. É desta forma que tudo é reduzido a recursos disponíveis e conforma o mundo em espaços rurais ou urbano. No atual contexto, nos encontramos em uma situação de grande dependência sistêmica, a não-colaboração dificilmente poderia ser assumida como premissa. No entanto, se buscada como um objetivo coletivo, a não-colaboração não só pode ser possível, mas está ao alcance de muitos de nós.

A não-colaboração decorre principalmente da efetivação de potencialidades criativas, da constituição de meios de produção próprios (independentes dos meios capitalistas), da criação de organizações de ajuda mútua capazes de tornar obsoletos e desnecessários os serviços prestados pelo estado. Só assim será possível que cada vez mais pessoas não precisem se submeter a trabalhos assalariados para benefício do capital ou do estado, não mais necessitarem de seus produtos e serviços, e se fazerem fortes o bastante para não se render ao pagamento de impostos.

«Eu vim para a cidade no tempo da desordem, quando a fome reinava. Eu vim para o convívio dos homens no tempo da revolta e me revoltei ao lado deles.»

(Bertold Brecht, Aos que virão depois de nós)


De fato, para além dos holofotes e das vitrines do ativismo urbano convencional, na última década têm surgido discretamente um número considerável de iniciativas coletivas e pessoais, se organizado e agido na busca por autonomia, indo contra as convenções (políticas e espaciais) impostas pelo estado e capital. Não compartilham de um programa ou de uma via única, ainda que possuam pontos em comum: se organizam em redes de mutualidade, são adeptos da ação direta e da propaganda pela ação, estão engajados na constituição de espaços comunais, e buscam coletivamente alcançar formas de autonomia em diversos contextos, se preparando da forma como podem para resistir e levar ao colapso a sociedade de classe.

Parte destes grupos tem sua origem nos espaços libertários urbanos: okupas, centros sociais e espaços culturais libertários. Outra parte vem do movimento de ecovilas, da ecologia social[7] Há ainda os grupos surgidos da junção do anarquismo com o sobrevivencialismo.

«A única alternativa é a utopia ou o caos. (…) os sintomas do desmoronar da civilização podem ser vistos por todas as partes e são bem mais agudos que aqueles percebidos nos últimos anos do império romano. No entanto, nem todos estes sintomas são necessariamente patológicos. O mundo contemporâneo se vê afetado por duas tendências opostas: uma que tende a sua destruição social, a outra que anuncia o nascimento de uma nova sociedade.»

(Kenneth Rexroth)


É a partir deste universo de importantes experiências coletivas que cada qual, conforme a sua trajetória, vem refletindo e agindo sobre limites impostos pela urbanicidade. A esta tendência criativa e às questões – táticas e técnicas – em torno de sua concretização, uma pequena parte destes grupos denomina “protopia”. Muitos compartilham a intenção de romper com o modo de vida das cidades, o desejo de reterritorialização, a busca pelo melhor dos mundos futuros possíveis, sem deixar de se prepararem para a possibilidade de que o pior dos mundos se realize.

Referências

  1. ↑ Segundo dados da Organização das Nações Unidas, desde 2008 as populações urbanas em escala global, pela primeira vez na história, superaram as populações rurais, se constituindo pela primeira vez na história. Deve-se notar também que um terço das populações urbanas vivem atualmente em favelas.

  2. ↑ É muito provável que tenham existido cidades ainda mais antigas que essas, porém não deixaram maiores vestígios por serem construídas, em sua quase totalidade, em madeira ou bambu. A existência prévia de algumas destas cidades se insinua apenas por alterações sutis nas paisagens.

  3. ↑ Temos como obra de referência as reflexões de Élie Reclus sobre o surgimento da sociedades estamentais e origem dos estados através da força trazidos em sua obra Os Primitivos. Irmão mais do famoso geógrafo Elisee Reclus, Élie Reclus foi provavelmente o primeiro antropólogo declaradamente anarquista, no entanto, sua contribuição até hoje permanece esquecida ou ignorada, tanto pela maior parte dos anarquistas quanto pelo campo da Antropologia e demais Ciências Sociais.

  4. ↑ Ver Debt: The First 5.000 Years de David Graeber.

  5. ↑ A definição de civilização aqui apresentada tem base nas ideias de Norbert Elias em “O Processo Civilizador”.

  6. ↑ Consequentemente, uma boa definição de colonialismo seria o processo pelo qual civilizações impõem sistemas de dominação, exploração e valores a povos que lhes são geografica e culturalmente distantes.

  7. ↑ Ecologia social é um conceito criado pelo geógrafo libertário Elisée Reclus em fins do século XIX, apropriado como base de reflexão pelo filósofo Murray Bookchin na década de 1960. Afirma que problemas ambientais atuais são causados fundamentalmente pelos problemas sociais decorrentes de sistemas políticos e sociais hierarquizados, em particular pela aceitação cega do dogma do desenvolvimento econômico e da hipercompetitividade naturalizada.

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Pérolas

09 terça-feira jun 2015

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23 presos, a anarquia é a mais alta expressão de ordem, anarco, anarco-sindicalismo, anarcoecologia, anarcofemin, anarcofeminismo, anarcoprimitivismo, anarcopunk, anarcos, anarquia, anarquia e ordem

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“A luta política, dentro dos quadros legais do capitalismo, é uma luta essencialmente burguesa” – Jaime Cubero – Anarquista brasileiro (1926-1998).

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(Republica Checa) Solidariedade com os presos da “Operação Fénix”

09 terça-feira jun 2015

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bannerFonte: Coletivo Libertário Évora

“Nenhuma repressão pode parar o nosso desejo de liberdade!”

Com a “Operação Fénix” teve lugar a maior onda repressiva contra anarquistas e o movimento radical de esquerdas na história recente checa.

Detenção de pessoas durante a madrugada, acusações de preparação de actos terroristas e confiscação de um servidor, o qual mantém várias páginas de activistas, tudo isso aconteceu na “Operação Fénix”, que começou na terça-feira, 28 de Abril. A policia anti-extremistas está activamente a tentar assustar os anarquistas e a cena da esquerda anti-autoritária e guardando informações durante a operação.

Este é o nosso apelo ao auxílio da solidariedade internacional. A polícia estabeleceu um embargo informativo durante a operação, ainda que alguns detalhes tenham sido filtrados aos meios de informação.

Hoje ainda há 3 pessoas sob custódia policial. Três outras foram acusadas de planear actos terroristas e outros delitos graves.

As tácticas policiais não terão êxito. Não nos vamos deixar assustar e continuaremos com a nossa acção politica.

Se nos desejas ajudar ficaremos muito agradecidos com qualquer solidariedade política ou económica.

Ver como aqui: http://www.alasbarricadas.org/noticias/node/34448

aqui (blogue de apoio aos presos da operação fénix, em várias línguas) : http://antifenix.noblogs.org/

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Resenha: “From Bakunin to Lacan: Anarquismo Lacaniano e a Esquerda”

09 terça-feira jun 2015

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Bakunin, Foucault, lacan, o que é amar por bakunin, pós-esquerda, pós-estruturalismo, pós-modernismo, Teoria, teorias anarquistas, Todd May

61MHVzF1dcL._SL1360_Por Todd May

Fonte: Literatura Anarquista

Resenha: Saul Newman, De Bakunin à Lacan: Anti-Autoritarismo e Deslocamento do Poder (Lexington Press).

1. O objetivo mais geral do novo livro de Saul Newman, From Bakunin to Lacan: Anti-Authoritarianism and the Dislocation of Power, é oferecer uma crítica ao modo pelo qual o poder, e especificamente o poder político, é comumente concebido. Ele evita a abordagem padrão a tais discussões que giram em torno de um abraço ou uma modificação de Marx, voltando-se, ao invés, à desprezada arena do anarquismo e articulando-a com pensadores atuais associados ao termo “pós-estruturalismo”. Newman argumenta que aquilo que ele chama de “local do poder”, a idéia de que os tratamentos dados ao poder parecem freqüentemente constrangê-lo conceitualmente a uma certa região ou tipo – com efeito, essencializando o poder numa categoria natural – não condiz com a verdadeira operação do poder. O poder, como tantos pensadores recentes argumentaram, é mais difuso e incircunscrito do que foram capazes de reconhecer os tratamentos progressistas tradicionais dados ao tema, especialmente o marxismo.

2. O livro se inicia com um tratamento do marxismo, mostrando que, para os marxistas, o local do poder é sempre na economia, e abordagens não-economicistas ao poder são desconsideradas. Aqui a discussão foca a idéia de que, desde que os marxistas freqüentemente pensaram o Estado como sendo determinado pelo poder econômico, não se embaraçaram em assumir o controle do Estado a fim de mudança nas relações econômicas. As conseqüências de tal pensamento, longamente criticado pelos anarquistas, manifestaram-se durante toda a história de nosso século.

3. Em contraste, o anarquismo vê acertadamente que o marxismo perdeu de vista o papel do poder de Estado nas relações sociais. Infelizmente, os anarquistas parecem querer colocar todo poder no nível do Estado, e assim simplesmente substituir um local de poder pelo outro. Ao seu ver, o Estado é o local do poder, e a resistência reside nos impulsos naturais de uma humanidade não-contaminada por tal poder. Elimine o estado, e as deletérias relações de poder cairão por si mesmas.

4. Nesse ponto, Newman volta-se, num interessante desvio das explicações padrão, ao anarquista Max Stirner, a fim de criticar o tipo de humanismo inerente ao pensamento de tantos outros anarquistas. Para Stirner, o humano não é um recurso natural de resistência não-contaminado, mas um local vazio, um projeto a ser realizado. Este projeto pode ser realizado igualmente por meios opressivos ou não-opressivos. A questão, então, é como conceber o poder e a resistência se nenhum deles encontra-se num local natural.

5. Michel Foucault começa esse processo através da análise dos meios polimorfos pelos quais opera o poder. Entretanto, vacila, pois, ao enxergar o poder em todo lugar, parece prescindir da possibilidade de conceitualizar a resistência sem retornar a um lugar externo e não-contaminado pelo poder. Esse lugar seria tão essencialista como aquele oferecido pelo anarquismo.

6. Deleuze e Guatarri, buscando novas categorias conceituais para o poder, minam a idéia de locais distintos para o poder e a resistência, especialmente com seu conceito de “máquina de guerra”. Entretanto, contrapondo o desejo ao social, acabam retornando à muitas categorias que sua obra pretende resistir.

7. Derrida, deslocando muito da estrutura oposicional que caracteriza o pensamento político (e outros), oferece uma abertura para re-conceber o poder e a resistência. Se o poder e a resistência estão entrelaçados a ponto de prescindir de uma separação em dois locais distintos, então um pensamento envolvendo categorias derrideanas, como differance e infra-estrutura, poderia ser mais apropriado para compreender esta operação. Derrida, entretanto, não oferece um tratamento ao sujeito da resistência, ao ator político.

8. Aqui, finalmente, Lacan, o verdadeiro herói de Newman neste livro, se torna relevante. Para Lacan, o poder contém sua própria falta. O significante é internamente fendido, permitindo que a resistência ocorra no poder e não fora dele. Se o sujeito lacaniano é incrustado no e resistente ao poder em sua estrutura mesma, então ambos poder e resistência existem sem locais distintos e essenciais, são dispersos e polimorfos, e podem ser pensados sem os problemas que caracterizaram os tratamentos dados de Marx à Deleuze e Guatarri. Um pensamento pós-anarquista, que leva a sério o impulso anti-autoritário do anarquismo, ao passo que se livra do tratamento humanista dado ao poder e a resistência, inicia-se a partir daqui.

9. Newman acredita que usando um framework lacaniano, também usado na obra de Ernesto Laclau, na sua discussão sobre a lógica do significante vazio, pode ao mesmo tempo abraçar uma ética da crítica e evitar qualquer caráter essencializante aos quais os termos da crítica poderiam prestar-se. Se isto soa como uma abordagem desconstrutiva de Derrida à linguagem, deveria. O que Newman busca fornecer é uma abordagem ao pensamento progressista que parte do anarquismo e do pós-estruturalismo, e não do marxismo, e vê nos impulsos por trás destes movimentos não só uma abordagem para conceber o poder, mas também, indissociavelmente, uma abordagem à linguagem.

10. Há diversos aspectos de From Bakunin to Lacan que particularmente o recomendam. Em primeiro, diferentemente de tantas explicações referentes aos citados pensadores, o livro é claro e coerente. As visões sumárias que fornece de filósofos tão difíceis como Lacan e Deleuze são ambas acuradas e legíveis. É uma virtude difícil de alcançar nesse tipo de trabalho. Em segundo, Newman afunilou uma vasta gama de visões num único programa de teoria política. Não se lê o livro como um conjunto de capítulos desconectados, mas como um movimento progressivo atravessando diversas visões em direção a uma abordagem teórica coerente em torno de uma concepção política. Finalmente, em contraste com minha própria obra, que focava Foucault, Deleuze e Lyotard em contraste a Derrida e Lacan, o livro de Newman busca articular um anarquismo alinhado a elementos desconstrutivos do pensamento francês atual.

11. A questão que resta para mim é se tal intento logrou êxito. Eu acredito que não, sobretudo pelas razões que, num primeiro momento, motivaram o meu afastamento de Derrida e Lacan. Não estou convencido de que utilizando uma abordagem desconstrutiva à linguagem e à política, haveria lugar para o tipo de ação coletiva que parece necessária ao sucesso político. A indeterminação, no meu entender, é uma base fraca para o pensamento e para a organização política. Ele tende a afastar as pessoas e não a juntá-las. Eu entendo que Newman põe em causa, e corretamente, que juntar também traz o risco de abraçar novamente conceitos essencializantes e formas autoritárias de poder. Para mim, parece que uma abordagem política adequada não pode se furtar a esse risco; sua tarefa é articular uma concepção de linguagem que enxergue o significado – e as categorias políticas que daí ascendem – como determinado, mas contingentemente, e não como necessariamente indeterminado. A escolha, em suma, me parece não residir unicamente entre a indeterminação derrideana/lacaniana (ou determinação sempre ameaçada) e uma determinação autoritária essencializante. Uma terceira possibilidade, e na minha opinião a mais acertada, seria a de uma determinação contingente, uma determinação que pode flutuar em volta das margens, ser criticada e alterada pela crítica genealógica ou outra crítica, mas que retenha seu poder de fornecer o tipo de margem ética que Newman busca (mas me parece não encontrar) em Derrida e Lacan.

12. Dito isto, recomendo altamente o livro a pesquisadores do pensamento progressista. Newman, para mim, parece estar correto em seu alvo, enxergando o anarquismo e não o marxismo como o ponto de partida apropriado para a teoria política progressista; e nisso, além do mais, seu trabalho está em consonância com a tendência atual dos movimentos anti-globalização ao redor do mundo. Se escolhemos finalmente Foucault/Deleuze/Lyotard ou Derrida/Lacan como herdeiros e modificadores do pensamento anarquista clássico, continua em aberto. Que Newman está fornecendo uma perspectiva interessante e original, enraizada no local certo, não pode ser negado.

Todd May é Professor de Filosofia na Clemson University. Escreveu consideravelmente sobre o pensamento de Michel Foucault e Gilles Deleuze. Seu quinto livro, Our Practices, Our Selves, Or, What it Means to be Human, foi recentemente publicado pela Penn State Press. Ele pode ser encontrado em mayt@clemson.edu

Fonte: Project Muse
http://muse.jhu.edu/login?uri=/journals/theory_and_event/v006/6.1may.html

May, Todd, 1955-
Lacanian Anarchism and the Left
Theory & Event – Volume 6, Issue 1, 2002

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Nova colecção digital de textos sobre anarquismo

08 segunda-feira jun 2015

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a anarquia é a mais alta expressão de ordem, anarquia, anarquia e ordem, Anarquia em Portugal, Évora

capturar14Fonte: Coletivo Libertário Évora

O projecto MOSCA (sobre o Movimento Social Crítico e Alternativo), sedeado na Universidade de Évora, editou um primeiro texto de uma nova colecção sobre anarquismo, em formato digital. Trata-se do texto de João Freire, ANARQUISMO E SOCIOLOGIA (2005), consistindo numa introdução sua a um debate organizado pelo Centro de Estudos Libertários naquela data, apenas ligeiramente retocado para a sua actual difusão. Cada uma das apresentações dos 4 “andamentos” foi seguida de debate com os circunstantes e suportada pela prévia distribuição de uns “textos de apoio”, a que se fazem algumas referências.

O texto encontra-se no arquivo do MOSCA e pode ser descarregado a partir desta ligação: http://mosca-servidor.xdi.uevora.pt/arquivo/index.php?p=digitallibrary%2Fdigitalcontent&id=1601&q=Jo%C3%A3o+Freire

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Emma Goldman & Alexander Berkman – Sacco e Vanzetti

04 quinta-feira jun 2015

Posted by litatah in #desarquivandobr, Alexander Berkman, Anarco-Comunismo, Anarcosindicalismo, Anarquia, Anti Capitalismo, Anti Fascismo, Antirracismo, Ditadura Argentina, Ditadura Franquista, Emma Goldman, Emma Goldman & Alexander Berkman, Experiências anarquistas, Fascismo, História, Internacional anarquista, Manifestações, Mártires da Luta, Organização de base, Perseguição política, Perseguição política a anarquistas, Prática, Presos Políticos, Presos políticos, Repressão, Sacco e Vanzetti, Teoria

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Alexander Berkman, anarquia, Emma Goldman, História, história da anarquia, História Social, manifestantes presos, presos, presos político, presos políticos, Sacco & Vanzetti, Sacco e Vanzetti

alastrosFonte: Literatura Anarquista

Os nomes do “bom sapateiro e do pobre peixeiro” já cessaram de representar meramente dois trabalhadores italianos. Por todo o mundo civilizado, Sacco e Vanzetti se tornaram símbolos, o shibboleth* da Justiça esmagada pela Força. Esse foi o grande significado histórico desta crucificação do século XX, e as palavras de Vanzetti foram verdadeiramente proféticas ao declarar “O último momento pertence a nós – essa agonia é o nosso triunfo”.

Sempre ouvimos as pessoas falarem a respeito de um grande progresso, querendo dizer com isso melhorias de vários tipos, na maior parte das vezes descobertas salva-vidas ou invenções poupa-trabalhos, quando não, reformas na vida política e social. Mas todas estas coisas podem ou não representar um avanço real, pois as reformas não significam necessariamente progresso.

É inteiramente falsa e viciosa a concepção de que a civilização consistiria de mudanças políticas ou mecânicas. Por si mesma, nenhuma melhoria indica progresso real: ela simplesmente simboliza o seu resultado. A verdadeira civilização, o progresso real consiste em humanizar a humanidade, em fazer do mundo um lugar decente para viver. Desse ponto de vista, apesar de todas as reformas e aperfeiçoamentos, ainda estamos muito distantes de sermos civilizados.

O verdadeiro progresso é uma luta contra a inumanidade de nossa existência social, contra a barbaridade das concepções dominantes. Em outras palavras, o progresso é uma luta espiritual, uma luta para libertar o homem de sua herança bestial, de sua condição primitiva de crueldade e medo. Romper os grilhões da superstição e da ignorância; libertar o homem do apego às idéias e práticas escravizantes; extinguir a escuridão de seu espírito e o terror de seu coração; levantando-o de sua postura abjeta à estatura plena do homem – essa é a missão do progresso. Só assim o homem, individual e coletivamente, se tornará verdadeiramente civilizado e nossa vida social mais proveitosa e humana.

Esta luta é a que traça a história real do progresso. Seus heróis não são Napoleões nem Bismarcks, nem generais nem políticos. Seu caminho foi trilhados pelas valas-comuns dos Saccos e Vanzettis da humanidade, por aqueles agraciados com o auto-da-fé, as câmaras de tortura, os cadafalsos e a cadeira elétrica. À estes mártires da liberdade e da justiça são a quem devemos o pouco de civilização e progresso real que temos hoje.

O aniversário da morte de nossos camaradas, portanto, de maneira alguma representa uma ocasião de luto. Pelo contrário, deveríamos nos regozijar, pois neste tempo de degradação e depreciação, de histeria por conquista e ganho a qualquer custo, ainda existem homens que ousam desafiar o espírito dominante e levantar a  sua voz contra a inumanidade e a reação: Que ainda há homens que mantém as chamas da razão e da liberdade acesas, e que possuem a coragem de morrer, e de morrer triunfalmente, pela sua ousadia. Pois Sacco e Vanzetti morreram, como todo mundo sabe hoje, porque eram anarquistas. Isto é, porque pregavam e acreditavam na fraternidade e na liberdade humana. E como tais, não podiam esperar receber nem justiça, nem humanidade. Por elas, os Mestres da Vida perdoariam qualquer crime ou ofensa, mas nunca um intento de minar sua segurança diante das massas. Portanto Sacco e Vanzetti tiveram que morrer, não obstante os protestos ao redor do mundo. Mas Vanzetti estava certo ao declarar que sua execução seria seu maior triunfo, pois por toda a história os mártires do progresso é que triunfaram ultimamente. Onde estão os Césares e Torquemadas de hoje em dia? Quem se lembrará do nome dos juízes que condenaram Giordano Bruno e John Brown? Os Parsons, os Ferrers, os Saccos e Vanzettis vivem eternamente e seus espíritos ainda marcham.

Que nenhum desespero entre em nossos corações diante dos túmulos de Sacco e Vanzetti. O que a eles devemos pelo crime de permitir que sua execução acontecesse é manter sua memória verde e o estandarte do seu ideal anarquista ao alto. E que nenhum míope pessimista confunda e desconcerte os verdadeiros fatos da história do homem, de sua ascensão à maior humanidade e liberdade. Na longa batalha das trevas à luz, na antiga luta por maior liberdade e bem-estar, foram os rebeldes, os mártires que venceram. A escravidão cedeu, o absolutismo foi suplantado, o feudalismo e a servidão passaram, os tronos foram suprimidos para as repúblicas se estabelecerem em seu lugar. Inevitavelmente, foram os mártires e suas idéias que triunfaram, apesar de todos os cadafalsos e cadeiras elétricas. Inevitavelmente, os povos, as massas é que venceram seus mestres, e agora mesmo as tantas fortalezas da Força, do Capital e do Estado, estão sob ameaça. A Rússia nos mostrou a direção do progresso com a sua tentativa de eliminar ambos os mestres, políticos e econômicos. Mas esse experimento inicial fracassou, pois como todas as grandes revalorações sociais demandam repetidos esforços para sua concretização. Mas esse magnificente fracasso histórico é similar ao martírio de Sacco e Vanzetti – é o símbolo e a garantia do triunfo final.

Contudo, para que seja claramente lembrado; nos primeiros intentos nas mudanças sociais fundamentais, o fracasso sempre se deve ao falso método de tentar estabelecer o Novo pelas práticas e meios do Velho. O Novo só pode conquistar por meio de seu próprio espírito novo. Tirania vive pela supressão; Liberdade medra em liberdade. O erro fatal da grande Revolução Russa foi tentar estabelecer novas formas de vida social e econômica sobre o velho fundamento de coerção e força. O pleno desenvolvimento da sociedade humana acontece longe da coerção e do governo, longe da autoridade, e em direção a maior liberdade e independência. Nessa luta, o espírito da liberdade foi vencido. Mas na mesma direção reside o êxito. A história mostra, e a Rússia é a demonstração recente mais convincente disso. Que, então, aprendamos a lição e que estes grandes esforços em prol de um novo mundo de humanidade e liberdade nos inspirem, e que o triunfal martírio de Sacco e Vanzetti possa nos dar grande força e coragem nesta luta estupenda.

França: Julho, 1929

Notas do Tradutor:

* Shibboleth é palavra hebraica, do vocabulário bíblico, significa divisa, racha, para demarcar e separar. N.T.

Disponível em: <http://theanarchistlibrary.org/sacco-and-vanzetti&gt;. Acesso em: 21 nov. 2009, 16:20:01.
Notes: Published in The Road to Freedom (New York), Vol. 5, Aug. 1929. Source: Retrieved on March 15th, 2009 from http://sunsite.berkeley.edu/Goldman/Writings/Essays/sacco.html

Revisado: 07/07/2011

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[Reino Unido] Brighton: Crônica da manifestação em solidariedade com os presos no estado espanhol

31 domingo maio 2015

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23 presos, anarquia, anarquia e ordem, anarquia na Espanha, anarquia no reino unido, estado repressor, manifestantes presos, perseguição, perseguição do estado, perseguição internacional, perseguição política, perseguição política a anarquistas, presos, presos político, presos políticos, repressão na espanha

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Fonte: ANA – Agência de Notícias Anarquistas

No domingo, 12 de abril, aproximadamente 40 pessoas participaram de um protesto contra a repressão na Espanha. A manifestação aconteceu em resposta a recente “Operação Piñata”, onde houve uma enorme (e barulhenta) incursão policial contra o movimento anarquista na Espanha. No momento, cinco pessoas permanecem detidas em regime de isolamento.

Desde as 18 horas, as pessoas foram chegando à praça central da Clock Tower. Com faixas e distribuindo folhetos, os manifestantes explicaram a quem passava por ali a situação repressiva na Espanha e o caso específico dos nossos companheiros. Também foram ecoados gritos contra a repressão e contra a polícia e as prisões (alguns em espanhol).

Meia hora após o início da concentração, os ativistas decidiram bloquear o tráfego por alguns minutos, caminhando até a Churchill Square. Lá, foi lido um comunicado em frente do Banco Santander e da O2 (Telefônica), duas das principais multinacionais espanholas. O grupo, então, voltou para a Clock Tower, onde terminou a ação.

A concentração contou com um número significativo de imigrantes do estado espanhol residente em Brighton e de companheiros de vários movimentos sociais da cidade. Grupos como Brighton-SolFed, Brighton Antifascists, Brighton Anarchist Black Cross e o Cowley Clube mostraram sua solidariedade.

Esta ação foi organizada por um grupo de ativistas preocupados com a situação na Espanha. Enquanto as condições de vida estão piorando, a classe dominante do país responde com a criminalização dos movimentos sociais e dos que lutam.

Agora, a solidariedade internacional é especialmente importante. Temos de mostrar que não temos medo, que estamos alertas e que nossos companheiros não estão sozinhos. A solidariedade continua.

Espanha cheira a Estado Policial!

Liberdade presos anarquistas!

Conteúdo relacionado:

http://noticiasanarquistas.noblogs.org/post/2015/04/02/alemanha-berlim-solidariedade-com-detidos-na-operacao-pinata/

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Anarquismo, parlamentarismo e democracia, por Miguel Amorós

10 domingo maio 2015

Posted by litatah in Anarcosindicalismo, Anarquia, Anti Fascismo, Bakunin

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anarcossindicalismo, anarquismo, Bakunin, estado

miguel-amoros(1)

Miguel Amorós

Fonte: La Haine

Quando durante a Revolução Francesa se tratou de instituir a democracia como poder do “povo” ou da nação – entendido como o poder do “terceiro estado” -, surgiram imediatamente graves problemas entre a maioria do tal “povo” e o Governo, nomeados como seus “representantes” eleitos.

A democracia popular baseada em clubes, seções e assembleias entrava em contradição com a democracia parlamentar jacobina. O Governo, a Convenção, as instituições nacionais, as leis e o sufrágio não garantiam a liberdade e a igualdade mais do que as classes possuidoras. Um setor radical dos “descamisados” de Paris (o povo parisino), os “Enragés”, no manifesto que apresentou na câmara de deputados no dia seguinte após ter sido votada a Constituição, no dia 25 de junho de 1793, afirmaria que: “A liberdade não é mais que um fantasma vão, quando um tipo de gente pode matar de fome a outra, impunemente. A igualdade não é mais que um fantasma vão, quando o rico, graças ao monopólio, dispõe do direito à vida e à morte sobre seus semelhantes”.

O experimento constitucional e parlamentar fracassaria devido à forte oposição entre os interesses das classes detentoras e os das classes populares. O “povo” não era mais que algo irreal. No parlamento não se manifestava nenhuma “vontade popular” senão os interesses da classe dominante. Não podia ter liberdade real sem igualdade econômica e a fonte de tal desigualdade radicava na propriedade. “O que é a propriedade? A propriedade é um roubo”, responderia Proudhon. E seguia: “a liberdade é igualdade, porque a liberdade não existe senão no estado social”. A questão da propriedade dividiu os democratas revolucionários e alcançou sua maior amplitude quando entrou em cena o proletariado e os “democratas sociais” – Marx, Proudhon e Bakunin se chamaram assim – identificaram seus interesses com os de todos os oprimidos. A tão desgastada vontade popular não seria outra coisa que não o interesse “da imensa maioria”, a saber, os operários. A “democracia social” equivaleria a um regime cujo protagonista principal seria a classe operária. Para uns, esse regime seria comunista. O jovem Marx acreditava que “o comunismo era a solução ao enigma da história”. Proudhon, em contrapartida, rechaçava as formulações autoritárias dos primeiros comunistas e se inclinava pela “organização das forças econômicas sob a lei suprema do contrato”, ou seja, pela propriedade cooperativa ou coletiva dos meios de produção, das “associações operárias organizadas democraticamente” e livremente federadas. Frequentemente, levaram-lhe pouco em consideração e o colocaram ao lado dos “utópicos”, isso quando não lhe tacharam de representante do “socialismo burguês”, tal como lhe qualificara injustamente Marx no Manifesto. Entretanto, Proudhon foi o primeiro que formulou uma crítica social especificamente proletária e a ele corresponde a crítica política do sistema parlamentar burguês mais incisiva, a que deu impulso ao ideário operário anarquista.

Para Proudhon, a autoridade chamada de Governo ou Estado, existente por cima da “vontade popular”, representava o mesmo despotismo dos reis, pois “o que compõe a realeza não é o rei, não é a herança; é o acúmulo dos poderes; é a concentração hierárquica de todas as faculdades políticas e sociais em uma só e indivisível função, que é o governo, este representado por um príncipe hereditário, ou também por um ou vários mandatários imóveis e eleitos”. A falha do sistema representativo estava na delegação de poderes, causa da separação entre governantes e governados: “Hoje mesmo, temos exemplos vivos de que a democracia mais perfeita não garante a liberdade. E isso não é tudo: o povo rei não pode exercer a soberania por si mesmo; está obrigado a delegá-la aos encarregados do poder. Se estes funcionários são cinco, dez, cem, mil, que importa o número ou o nome? Sempre será o governo do homem, o império da vontade e do favoritismo”. Se nenhum indivíduo reconhecesse mais autoridade que ele mesmo, se o povo inteiro quisesse realmente governar, não haveria governados. A impossibilidade de refletir-se a vontade do povo em uma autoridade delegada, exterior a ele, é o que forçava Proudhon a se declarar anarquista, partidário da abolição de qualquer forma de autoridade e chamar de “anarquia” o regime dos homens livres e iguais: “anarquia, ausência de amo, de soberano, tal é a forma de governo à que cada dia nos aproximamos”. A vontade popular somente podia se manifestar sem mediações, de modo direto. O governo do povo era uma falácia; se havia governo, não havia povo e vice-versa; se realmente um povo conseguisse se constituir, exercendo o poder diretamente, sem mediações, o governo não existiria. A anarquia era o governo de todos, e, portanto, o de ninguém: “a fórmula revolucionária não pode ser nem a legislação direta, nem governo direto, nem governo simplificado; a fórmula é nada de governo”. Bakunin contribuiu bem pouco para a análise proudhoniano. Partindo da premissa de que o governo tinha opção de ser verdadeiramente popular e representativo só se estava controlado pelo povo, como tal controle era fictício não existiu em nenhum país, concluía que a liberdade sob tal regime era irreal: “Todo o sistema do governo representativo é uma imensa fraude que se apoia nesta ficção: que os corpos legislativo e executivo, eleitos em sufrágio universal pelo povo, devem ou até podem representar a vontade do povo”. Esses poderes promoviam unicamente os poderes da burguesia. O sufrágio universal, dadas a desigualdade e a opressão em que se encontrava o povo trabalhador, era uma zombaria; votando, cada um elegia seu patrão. Devido a sua miséria, a sua falta de formação, à pouca disponibilidade de tempo, à ausência de informação, à inexistência de espaços de discussão etc., o povo não podia formular uma opinião geral e, por conseguinte, não podia utilizar o sufrágio universal “para a conquista da igualdade econômica. Sempre será de forma necessária um instrumento hostil ao povo, que de fato apoia a ditadura de fato da burguesia”. Malatesta chegou a dizer que “o direito eleitoral é o direito de renúncia aos próprios direitos”. O mesmo raciocínio circular há em Bakunin e Malatesta como em Proudhon: o governo não podia ser representativo porque a vontade popular não podia se formular através dele; si o fizesse, seria representativo, mas já não seria governo. A identidade entre governantes e governados, essência verdadeira da democracia, não podia se realizar mediante um governo parlamentar senão mediante sua abolição. As ideias proudhonianas de autonomia operária inspiraram os internacionalistas durante a Comuna de Paris (1871). Tanto Bakunin como o próprio Marx viram na Comuna a democracia proletária e a negação do Estado.

Na Espanha, país pouco afetado pela revolução industrial, e portanto, com um proletariado pouco desenvolvido, as ideias igualitárias e “socialistas” (contrárias à propriedade privada) foram filtradas pelos movimentos radicais da burguesia. A palavra “democrata”, em seus inícios, designava na política algo parecido com anarquista. No “Dicionário dos Políticos” (1855), do monarquista Juan Rico e Amat, dizia-se que “o democrata puro é inimigo acérrimo de tudo o que se relacione ao governo”; o democrata confiava na insurreição como método para alcançar seu objetivo, a igualdade política: “Se pertence à classe mediana, nunca usa “senhor”; sempre se chama fulano de tal apenas: gosta de tratar por “você” e de dar a mão aos de classe baixa, e nos pronunciamentos, chama de cidadãos os homens e de cidadãs as mulheres”. Uma fração dos democratas, os republicanos federais, trataram de conciliar o problema da mediação entre o povo e o Estado recorrendo à descentralização administrativa.

Nas palavras de Pi e Margall, tradutor de Proudhon: “Na atual organização, o Estado administra tudo; na federação, o Estado, a Província e o Município são três entidades igualmente autônomas, ligadas por pactos sinalagmáticos e concretos. Tem cada uma determinada sua esfera de ação pela mesma índole que os interesses que representa e podem todos moverem-se livremente sem que se entrechoquem”. A República Federal, governo do povo soberano, não seria mais do que a soma federada desses pactos. Mas para se constituir o povo primeiro teria que se romper o Estado monárquico, de forma que seus fragmentos autônomos decidissem livremente se confederarem. O partido federal, ao propugnar o desmembramento do Estado, se situava contra todos os demais partidos, mas mantinha distância do proletariado. Acreditava na harmonia das classes, respeitava a propriedade e era inimigo das greves e demais manifestações da luta social, e por isso bastou apenas que surgisse a Associação Internacional de Trabalhadores na Espanha para que perdesse o apoio dos militantes operários. Sua oportunidade histórica sumiu com o fracasso da Primeira República, a de 1873; não obstante, a ideia do município como célula da sociedade livre penetrou tão fundo como o pensamento de Bakunin, transmitido aos trabalhadores espanhóis pelos internacionalistas.

A distância entre As Cortes espanholas e a realidade social foi tão grande durante o século XIX que as massas populares, normalmente alheias à política, receberam as ideias anarquistas com agrado. O sistema político da Restauração baseado na alternância de dois partidos monarquistas artificiais não fez senão contribuir à identificação entre política, corrupção e coronelismo [em espanhol, caciquismo, que significa, segundo a RAE “Intromissão abusiva de uma pessoa ou uma autoridade em determinados assuntos, valendo-se de seu poder ou influência”; nota do tradutor]. Não obstante, um setor do movimento operário, o partido socialista, aceitou as regras do jogo e exerceu oposição junto com as minorias republicanas, enquanto à margem se desenvolvia um potente sindicalismo revolucionário. Entre 1916 e 1923 a CNT foi capaz de desenvolver uma democracia operária alheia completamente à política e consolidada pela solidariedade de classe, a base de assembleias sindicais, plenárias, palestras e congressos, o que alarmou tanto as classes detentoras que estas substituíram sua democracia coronelista [em espanhol, caciquista; cf. nota n°1] pela ditadura militar do general Primo de Rivera. A clandestinidade arruinou as possibilidades do sindicalismo revolucionário e arrastou seus dirigentes ao terreno das conspirações políticas e do possibilismo. A CNT entrou nela dividida entre moderados e revolucionários, para não pretender mais do que ser bucha de canhão em uma coalizão de partidos e personalidades opostas à ditadura e à monarquia, que abandonadas por seus aliados, caíram. A Segunda República não tratou bem os trabalhadores. A posição a respeito da República e a seu sistema parlamentar dividiu os anarcossindicalistas entre partidários de uma linha insurrecional e partidários da permanência dentro da legalidade republicana. Para os segundos, o abstencionismo, as alianças políticas ou inclusive a participação institucional eram questões táticas, não princípios. Enquanto isso, o avanço do proletariado tinha dividido a burguesia em duas metades opostas: uma, reformista, representada por partidos republicanos, e outra, militarista e clerical, representada pelo partido radical e pela direita. Quando a aliança direitista subiu ao poder – graças a umas eleições nas que as mulheres votavam pela primeira vez – teve de se enfrentar duas tentativas de insurreição, que terminaram enchendo as prisões de operários. Os anarquistas tiveram que atar novamente relações com seus inimigos de ontem, a burguesia republicana, parar separar do poder a outros muito piores, a burguesia fascista. Então renunciaram ao seu tradicional abstencionismo, e, embora não hajam convocado o voto em fevereiro de 1936, tampouco convocaram a abstenção. Entre os anarquistas se impunha uma tendência revolucionária que considerava a participação eleitoral como uma tática destinada a resistir ao fascismo. Durruti o expressou claramente com a seguinte instrução: “estamos diante da revolução ou da guerra civil. O operário que não votar e ficar também em sua casa, será outro contrarrevolucionário”.

A questão principal não era o temido triunfo da direita, mas sim o fracasso eleitoral que impulsionaria o golpe de estado. Para Durruti, o triunfo eleitoral dos socialistas e republicanos permitia ganhar tempo, mas somente um movimento revolucionário poderia detê-las de fato: “O fascismo, ou Revolução Social”, tal era sua conclusão. Como tanto a sublevação militar como a revolução social triunfaram meio a meio e se desencadeou uma guerra civil ficando o proletariado isolado internacionalmente, o “antifascismo” deixou de ser uma tática antiburguesa para acontecer colaboracionismo de classes. O Estado, o Governo, a Nação, as instituições democráticas, as leis, os partidos, a própria burguesia, foram valorados de modo diferente como habitualmente o haviam sido. O anarquismo saiu profundamente alterado da guerra civil e nunca se recompôs desde então.

O sistema parlamentar voltou à Espanha em 1977 como prolongamento da ditadura franquista. A vontade popular só podia se formular em torno da democracia proletária das assembleias. Unicamente o proletariado constituído politicamente como classe em coordenações ou conselhos operários podia encarnar o interesse da imensa maioria. Mas quem realmente se constituiu como nação, como “povoado”, foi a burguesia franquista. Longe de dissolver as instituições fascistas, pactuou a desativação do movimento operário em troca de um espaço político para a oposição. O exílio pôde regressar sem compensações, sequer morais: a oposição tinha assinado também um pacto de silêncio: o esquecimento do genocídio do pós-guerra civil e dos anos de perseguições e sofrimentos. O franquismo anistiado legalizou os partidos e sindicatos e convocou eleições, livrando-se de cadáveres como As Cortes, a CNS ou o Movimento Nacional, mas guardou íntegro seu aparato, que se transformou no aparato da nova “democracia”. A polícia, a Justiça, a Monarquia, a guarda civil, o Exército, os deputados, os governos civis e militares, as capitanias, a diplomacia, a administração, os serviços secretos…; tudo, absolutamente tudo, permaneceu intocável. Nem as eleições, nem o processo constituinte nascido delas afetaram à burocracia estatal ou à burguesia. Um partido nascido do franquismo, a UCD, comandou o processo de “transição” – ou acordou a “reforma” – em suma, o sobrevir democrático da ditadura, auxiliado pela oposição: esse foi o “contrato social” da democracia espanhola. O advento da “democracia” – as eleições municipais, as duas câmaras, o sindicalismo reformista, os Pactos da Moncloa, a constituição, os estatutos de autonomia – foi uma sinistra comédia que teve como preço a liquidação da democracia socialista esboçada pelos trabalhadores. Representou-se quando o sistema parlamentar no mundo subsistia como caricatura. O Parlamentarismo espanhol teve todas as misérias dos demais e nenhuma de suas glórias. Todos os partidos eram partidos de ordem burguesa. Votar significou em seu primeiro momento adoecer voluntariamente de amnésia e colaborar com a farsa, legitimá-la, sujar-se com o sangue dos mortos que até o fim acompanharam o franquismo. O anarquismo precisava de uma revisão a fundo de sua experiência que queria passar a borracha naquelas datas cruciais. Ao não o fazer, não pôde renovar sua crítica, nem tornar concreta uma tática, e não influenciou nos acontecimentos. Acabou sem se inteirar de nada, convertido numa ideologia autista e contemplativa, apoiada em um relato sem contradições de um passado histórico mutilado. Os efeitos foram paralizadores.

A transformação da classe operária em massa sem classe acabou com a possibilidade de que ela mesma pudesse alçar-se como representante do interesse geral e encarnar a vontade popular nas formas da democracia direta que tinha conseguido pôr de pé nas fábricas e nos bairros. O reino indiscutível do capital transformou em pouco tempo a sociedade graças a um desenvolvimento acelerado da tecnologia. As características próprias das massas, como a atomização, a movimentação frenética, o consumismo e o confinamento na vida privada, se acentuaram na sociedade tecnológica, eliminando os restos de sociabilidade e potenciando o controle social totalitário. Ao ganhar preponderância o mercado mundial sobre os Estados, os parlamentos perderam o escasso poder que conservavam. Nem sequer serviam para formular o interesse específico da classe dominante; este se formava diretamente nas instituições mundiais do mercado capitalista. A maioria parlamentar de tal ou qual partido podia introduzir mudanças no espetáculo político, mas na verdade essas mudanças afetavam o poder real. Os aspectos técnicos do parlamentarismo – a campanha, a recontagem de votos, os debates televisivos, as votações nas câmaras, as moções, as comissões etc. – foram conservados, mas o que progredia era o monólogo da dominação, a tecnovigilância, a erosão do direito, a criminalização da dissidência e a população carcerária. Nesse momento se concluía um ciclo: os partidos deixavam de representar opções distintas da mesma ordem para não representar mais do que interesses particulares e de particulares, o que bastaria para explicar a extensão do fenômeno da corrupção política. Por sua parte, o sistema parlamentar deixava de se diferenciar da ditadura fascista. Fascismo tão suave como se queira dizer, fascismo tecnológico, mas fascismo. Na etapa globalizadora as liberdades aparentes pouco a pouco se afogam num estado de exceção e o estado tecno-democrático se dirige para o Estado penal. A política do ano 200 é a do “panóptico” de Bentham ou a do “Big brother”, o Grande Irmão do qual falava Orwell. Nestas circunstâncias a abstenção é mero reflexo da dignidade dos oprimidos. As razões táticas do tipo “para que não ganhe a direita” não atrasam a marcha do totalitarismo, ou como sempre se disse, do “fascismo”, mas sim contribuem com ela. Tal como estamos agora, quando dizem “cidadão”, é preciso entender “fascista”, pois quem acredita nas instituições, confia no novo totalitarismo. A cidadania satisfeita é a base do fascismo moderno. Não há direita nem esquerda porque não há política. Os assuntos do poder se resolvem em outra parte, são extraparlamentares. A luta social também o será.

Aqueles núcleos de discussão que sobrevivem ou se organizam têm sobre suas costas a missão de reconstruir retalhos de vida pública e de democracia direta dentro de uma sociedade massificada que não sejam efêmeros experimentos. E a partir deles forjar opiniões, discutir, informar, instruir, enfim, ligar à memória esquecida e às tradições perdidas de luta. É o conhecimento com que se terá de enfrentar à classe dominante e seu totalitarismo tecnófilo. Saberão interpretar as questões tecnológicas como problemas políticos e sociais da maior magnitude, pois lutam contra um regime totalitário fascista com roupagem liberal e nos sistemas desse tipo as verdadeiras questões aparecem como se fossem problemas técnicos. “A tecnologia é o futuro”, dizem os servos. O anarquismo, se souber escapar das armadilhas da ideologia, será o instrumento teórico mais adequado para forjar uma crítica radical da sociedade, porque é o único ideário que insistiu na democracia direta como fórmula emancipadora. Enquanto que as teorias comunistas puseram em destaque a igualdade como condição necessária da liberdade humana, sem que a travessia por fases autoritárias as afetasse, em troca, o anarquismo proclamou que sem liberdade não pode ter igualdade, e, por conseguinte, o caminho da emancipação estará fecundado por ela.

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De Chiapas a Rojava: mais do que apenas coincidências

24 sexta-feira abr 2015

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Curdistãi, kurdistan, Municipalismo Libertário, Murray Bookchin, zapatistas

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06 Feb 2015 Por Petar Stanchev
Kurdish Question: From Chiapas to Rojava – more than just coincidences

Tradução Talita Rauber, Co-Tradução e revisão: Andreza Cassolatto

Autonomia reúne duas revoluções: na esquerda e de baixo.

“Poder para o povo” só pode
ser posto em prática quando o poder exercido pelas elites sociais é
dissolvido nas pessoas. ”
-Murray Bookchin,Anarquismo pós-escassez

e63eba4a60c5a7383338249762b2606c_L_602x298Em grande parte desconhecida até recentemente, a cidade curda de Kobane atraiu a atenção mundial à sua forte resistência [i] contra a invasão do Estado Islâmico, e tornou-se um símbolo internacional, comparada à defesa de Madrid e Stalingrado. A bravura e heroísmo das Unidades de Defesa Popular e das Unidades de Defesa da Mulher (YPG e YPJ) foram elogiados por grande parte de grupos e indivíduos – anarquistas, esquerdistas, liberais e até mesmo direitistas expressaram solidariedade e admiração pelos homens e mulheres de Kobane em sua batalha histórica contra o que foi frequentemente considerado “fascismo” do Estado Islâmico. A grande mídia foi forçada a quebrar o silêncio sobre a autonomia curda, e logo vários artigos e notícias foram transmitidos e publicados, muitas vezes retratando a “dureza” e determinação dos combatentes curdos com uma certa dose de exotismo, é claro. No entanto, essa atenção foi muitas vezes seletiva e parcial – a verdadeira essência do projeto político em Rojava (Curdistão ocidental) foi deixada de lado e a mídia preferiu apresentar a resistência em Kobane como alguma exceção estranha à suposta barbárie do Oriente Médio. Sem surpresa, a estrela vermelha, brilhando nas bandeiras vitoriosas do YPG/YPJ não era uma imagem agradável aos olhos das potências ocidentais e dos seus meios de comunicação. Os cantões autônomos de Rojava representam uma solução caseira para os conflitos no Oriente Médio, que engloba a democracia de base e direitos étnicos, sociais e de gênero, e tudo isso sendo rejeitado tanto pelo terror do Estado Islâmico como também pela democracia liberal e pela economia capitalista. Embora o Ocidente tenha preferido ficar em silêncio sobre esta questão, este fundamento ideológico é a chave para a compreensão do espírito que escreveu a epopeia de Kobane, e que fascinou o mundo, como o ativista curdo e acadêmico, Dilar Dirik, afirmou recentemente [ii].

Enquanto as batalhas em cada rua e canto da cidade intensificava, Kobane deu um jeito de cativar a imaginação da esquerda e, especificamente, da esquerda libertária como um símbolo de resistência e luta, e logo isso estava posto no panteão de algumas da mais emblemáticas batalhas da humanidade, assim como a defesa de Madrid contra os fascistas nos anos 1930. Não foi à toa que o Grupo Turco Marxista Leninista (MLKP) se juntou às YPG/YPJ no campo de batalha, levantou a bandeira da república espanhola sobre das ruínas da cidade no dia de sua libertação e chamou pela formação das Brigadas Internacionais[iii], seguindo o exemplo da revolução espanhola. Não era apenas pela batalha de Kobane em si, mas pela essência libertária dos cantões de Rojava, pela implementação de uma democracia de base de direta, pela participação das mulheres e dos diferentes grupos étnicos dentro de um governo autônomo que se deram as comparações à revolução espanhola. Outra associação brevemente mencionada em vários artigos – a revolução em Rojava e seu governo autônomo foi comparado aos Zapatistas e sua autonomia no sul do México. A importância dessa comparação pode ser crucial para entender o paradigma da luta revolucionária no Kurdistão e o que isso significa para aqueles que acreditam que outro mundo é possível.

O movimento zapatista é provavelmente um dos elementos mais simbólicos e influenciadores da imaginação revolucionária no mundo após a queda dos regimes estado-socialistas no final dos anos 80 e início dos anos 90. Na manhã de 1º de Janeiro de 1994, uma guerrilha armada e desconhecida, composta por indígenas maias, tomou as principais cidades da parte sul do estado do México – Chiapas. A operação militar foi levada adiante com uma brilhante estratégia somada à inovação da internet, o que facilitou que a mensagem se espalhasse aos revolucionários, que ecoou no globo para inspirar a solidariedade internacional e fazer emergir o movimento de Alter-Globalização. Os Zapatistas se rebelaram contra o capitalismo neoliberal e contra o genocídio cultural e social da população indígena do México. Ya Basta, Já Basta, era seu grito de guerra que emergiu na noite dos “500 anos de opressão”, como dito na Primeira Declaração da Selva Lacandona. Os Zapatistas revoltaram-se quando o capital global estava celebrando o “fim da história” e a ideia de que a revolução social parecia ser um anacronismo romântico que pertencia ao passado. O Exército Zapatista de Libertação Nacional (EZLN) foi forçado para fora das cidades em 12 dias de intensas batalhas com o exército federal, mas mostrou-se que a profunda organização horizontal das comunidades indígenas não poderia ser erradicada por qualquer intervenção militar ou terror. O porta-voz mascarado do exército rebelde, Subcomandante Marcos, desafiou a noção de vanguarda histórica como oposta à revolução de base, que não tem objetivo de tomar o poder, mas abolir o poder, e esse conceito se tornou central para a maioria dos movimentos anti-capitalistas de massa desde então – das ocupações em Seattle e Genova à Syntagma e Puerta del Sol e, inclusive, o Movimento Occupy.

Onde estão as semelhanças com a revolução de Rojava?

Do Marxismo-Leninismo à Autonomia – uma trajetória histórica compartilhada

As raízes da autonomia democrática em Rojava pode ser entendida apenas através da história do Partido dos Trabalhadores do Curdistão (PKK), organização que tem sido central no movimento de libertação curda desde sua criação em 1978. O PKK foi estabilizado como uma organização guerrilheira Marxista Leninista no Norte do Curdistão, parte do estado turco, combinando as ideologias de libertação nacional e social. Ele cresceu para ser uma força guerrilheira significativa sob a liderança de Abdullah Ocalan e desafiou o segundo maior exército da OTAN em um conflito que revindicou a vida de mais de 40 mil pessoas. O estado turco desalojou centenas de milhares e supostamente usou tortura, assassinatos e estupros contra a população civil, mas não foi bem sucedido ao quebrar o pilar da resistência curda. Desde sua implementação, o PKK expandiu sua influência tanto na Turquia como nas outras partes do Curdistão. A força de liderança política na Revolução de Rojava – o Partido da União Democrática (PYD) é filiado ao PKK através da União das Comunidades Curdas (CKC), organização de cúpula que abrange vários grupos politico revolucionários, compartilhando ideias do PKK. A ideologia, que une diferentes grupos civís e revolucionários ao KCK, é chamada de confederalismo democrático e é baseada nas ideias do anarquista estadunidense chamado Murray Bookchin, que argumentou a favor de uma sociedade não-hierárquica baseada na ecologia social, no municipalismo libertário e na democracia direta.

Embora os Zapatistas sejam famosos pelo seu governo autônomo e pela rejeição da noção de vanguarda histórica, as raízes da organização também são relacionadas ao marxismo-leninismo e, assim como no caso do PKK, a ideia de auto-governo e revolução vinda de baixo foram um produto de uma longa evolução histórica. O EZLN foi fundado em 1983 por um grupo de guerrilhas urbanas, predominantemente marxista-leninistas, que decidiram começar uma célula revolucionária entre a população indígena em Chiapas, organizar uma força de guerrilha e tomar o poder através da guerra de guerrilha. Logo eles perceberam que seu dogma ideológico não era aplicável às realidade indígenas e começaram a aprender as tradições comunitárias de governo do povo indígena. Assim, o Zapatismo nasceu como uma fusão entre o Marxismo, a experiência e o conhecimento da população nativa que têm resistido ambos contra a Espanha e, mais tarde, contra o estado mexicano.

Essa trajetória ideológica compartilhada demonstra uma virada histórica na compreensão do processo revolucionário. O levante e o estabelecimento zapatista da autonomia em Chiapas marcou uma ruptura com as estratégias de guerrilha tradicionais, inspirada predominantemente pela revolução cubana, esta se fez mais do que clara na carta do porta-voz do EZLN, Subcomandante Marcos, escreveu para a organização do Movimento de Libertação Nacional Basco, ETA:

“Eu cago em todas as vanguardas revolucionárias neste planeta. [iv]”

Não era a vanguarda para liderar o povo agora; era o próprio povo para construir a revolução a partir de baixo e sustentá-la como tal. Esta é a lógica que o PKK tem encaminhado na última década sob a influência de Murray Bookchin e essa mudança demonstra uma evolução da organização de um “movimento para o povo” a “um movimento do povo”.

Cantões e Caracóis – liberdade aqui e agora

Provavelmente, a semelhança mais importante entre a revolução em Rojava e em Chiapas é a reorganização social e política que está acontecendo em ambos os lugares, a qual é baseada na ideologia libertária das duas organizações.

A autonomia zapatista em sua forma atual origina-se do fracasso das negociações de paz com o governo mexicano, após a revolta em 1994. Durante as negociações de paz, os rebeldes exigiram que o governo aderisse aos acordos de San Andres, que dão aos povos indígenas o direito à autonomia, autodeterminação, educação, justiça e de organização política, com base na sua tradição bem como no controle conjunto sobre a terra e os recursos das áreas que pertencem a eles. Esses acordos nunca foram implementadas pelo governo e, em 2001, o presidente Fox apoiou uma versão editada que foi votada no Congresso, mas que não atendia às exigências dos zapatistas e dos outros grupos de resistência. Este evento foi rotulado como “traição” e levou o EZLN a declarar dois anos depois a criação das cinco zonas rebeldes, centradas em cinco Caracoles (caracóis) que servem como centros administrativos. O nome Caracoles veio para mostrar o conceito revolucionário do Zapatistas – estamos fazendo-o nós mesmos, nós aprendemos no processo e nós avançamos, lentamente, mas avançamos. Os Caracoles [v] incluem três níveis de governo autônomo – comunidade, município e Conselho do Bom Governo. Os dois primeiros são baseados em assembleias de base enquanto que os Conselhos de Bom Governo são eleitos, mas com a intenção de obter o maior número possível de pessoas para participar do Governo ao longo dos anos através de um princípio de rotação. A autonomia tem o seu próprio sistema educacional, de saúde e de justiça, bem como as cooperativas, produzindo café, gado, artesanato etc.

Aprendemos enquanto fazemos as coisas, nós não conhecíamos sobre autonomia e nem sabíamos que iríamos construir algo parecido. Mas nós aprendemos e melhoramos coisas, e aprendemos com a luta – disse-me o meu Zapatista guardião Armando, quando visitei o território autônomo no final de 2013. A liberdade só poderia ser praticada aqui e agora, e revolução foi um processo de desafiar constantemente o status-quo e construir alternativas a isso.

Os cantões de Rojava realmente lembram a autonomia em Chiapas. Eles foram proclamados pela PYD dominante em 2013 e funcionam através das assembleias populares e conselhos democráticos estabelecidos. Mulheres participam igualmente na tomada de decisão e estão representadas em todos os cargos eletivos, que são sempre compartilhados por um homem e uma mulher. Todos os grupos étnicos são representados no governo e suas instituições. Saúde e educação também são garantidas pelo sistema de Confederalismo democrático e, recentemente, a primeira universidade de Rojava, a Academia Masepotamia, abriu as suas portas com planos para desafiar a estrutura hierárquica da educação, e para fornecer uma abordagem diferente à aprendizagem.

Assim como é no caso dos zapatistas, a Revolução em Rojava vislumbra-se como uma solução para os problemas em todo o país, não como uma expressão de tendências separatistas. Este sistema democrático genuíno, como alegado pela delegação de acadêmicos da Europa e da América do Norte [vi], que visitou Rojava recentemente, aponta para um futuro diferente do Oriente Médio, baseado na participação direta, a emancipação das mulheres e na paz étnica.

Revolução das Mulheres

O gênero sempre foi central para a revolução zapatista. A situação das mulheres antes da disseminação da organização e da adoção de liberação das mulheres como central para a luta, foi marcada pela exploração, marginalização, casamentos forçados, violência física e discriminação. É por isso que Marcos alega que a primeira revolta não foi aquela de 1994, mas a adoção da Lei Revolucionária das mulheres’, em 1993, configurando um enquadramento para a igualdade de gênero e justiça e garantindo os direitos das mulheres no território rebelde para autonomia pessoal, emancipação e dignidade. Hoje as mulheres participam de todos os níveis de governo e têm suas próprias cooperativas e estruturas econômicas para garantir sua independência económica. As mulheres formavam e ainda formam uma grande parte das fileiras da força de guerrilha zapatista e tomam posições elevadas em seu mandamento. A tomada de San Cristobal de las Casas, a cidade mais importante que as tropas zapatistas capturou durante a revolta em 1994, também foi comandada por mulheres, encabeçada por Comandanta Ramona, que também foi o primeiro Zapatista a ser enviado para cidade do México para representar o movimento.

Não é difícil comparar o envolvimento em massa de mulheres indígenas de Chiapas nas fileiras Zapatistas à participação das mulheres na defesa de Kobane e na YPJ – as Unidades de Proteção a Mulheres, ambos descritos de maneira sensacionalista [vii] pela mídia ocidental nos últimos meses. Entretanto, sua coragem e determinação na guerra contra o Estado Islâmico é um produto de uma longa tradição da participação feminina na luta armada pela libertação social no Kurdistão. Mulheres desempenharam um papel central no PKK e isso está, sem dúvida, conectado à importância do gênero na luta curda. A Revolução Rojava tem uma forte ênfase na libertação das mulheres como indispensável para a libertação social. O quadro teórico que colocou o desmantelamento do patriarcado no coração da luta é chamado “jinealogia”, um conceito desenvolvido por Abdullah Ocalan. A aplicação deste conceito resultou em um nunca visto fortalecimento da mulher não apenas no contexto do Oriente Médio, mas também no contexto do feminismo liberal ocidental. As assembleias das mulheres, estruturas cooperativas e milícias femininas são o coração da revolução, que é considerada incompleta se não destruir a estrutura patriarcal da sociedade, que é um dos fundamentos do capitalismo. Janet Biehl, uma artista e escritora independente, escreveu após sua recente viagem a Rojava que mulheres da revolução curda tem o papel ideológico do proletariado das revoluções século XX.

A ecologia da liberdade

A ecologia da liberdade é, provavelmente, o mais importante dos trabalhos de Bookchin e seu conceito de ecologia social foi adotado por revolucionários em Rojava. Sua Idea de que “a noção de dominação da natureza pelo homem vem da real dominação do homem pelo homem” liga patriarcado, destruição ambiental e capitalismo e aponta para a abolição deles como o único meio para uma sociedade justa. Como uma abordagem holística também é defendida e implementada pelos Zapatistas. Sustentabilidade tem sido um importante ponto de ênfase, especialmente depois da criação dos Caracoles em 2003. O governo autônomo tem tentado recuperar sabedoria ancestral, relacionada ao uso sustentável da terra, e combinar isso com outras práticas ecológicas. Esta lógica não é apenas uma questão de melhorar as condições de vida nas comunidades e evitar o uso de agroquímicos, é a rejeição de toda uma noção de que agricultura industrial em larga escala é superior à forma “primitiva” do povo indígena de trabalhar com a terra, e como isso é um poderoso desafio da lógica de neoliberalismo.

O caminho até a autonomia – o novo paradigma revolucionário

As similaridades entre o sistema de confederalismo democrático que está sendo desenvolvido no Curdistão ocidental e a autonomia em Chiapas vão muito além de poucos pontos que acentuei neste artigo. De slogans como “Ya Basta” adaptado em curdo como “êdî bese” até a democracia de base, estruturas econômicas comunitárias e participação das mulheres, a trajetória similar que o Movimento Curdo e os Zapatistas tem trilhado demonstra a ruptura decisiva com a noção vanguardista do Marxismo-Leninismo e uma nova abordagem para a revolução, que vem de baixo e almeja a criação e uma sociedade livre e não-hierárquica.

Embora ambos movimentos receberam algumas censuras ásperas [viii] de integrantes sectários de esquerda, o fato de que os únicos importantes e bem sucedidos experimentos em mudança social radical originam-se de grupos não ocidentais, marginalizados e colonizados vem como um tapa na cara dos “revolucionários” brancos e dogmaticamente privilegiados do norte do globo que dificilmente tem sido bem sucedidos em desafiar a opressão em seus próprios países mas tendem a acreditar em seus julgamentos de que o que é ou não uma real revolução.

A revolução em Rojava e Chiapas são poderosos exemplos para o mundo, demonstrando a enorme capacidade de organizações de base a e importância de ligações comunitárias como opositores a atomização capitalista social. Por último, mas não menos importante, Chiapas e Rojava devem fazer muitos da esquerda, incluindo alguns anarquistas, jogarem no lixo sua mentalidade colonial e dogmatismo ideológico.

Um mundo sem hierarquia, dominação, capitalismo e destruição ambiental ou, como dizem os Zapatistas, um mundo onde cabem muitos mundos, é frequentemente descrito como “utópico” e “impraticável” pela grande mídia, estruturas educacionais e políticas. Entretanto, não é uma miragem futura que vem dos livros – ele está acontecendo aqui e agora e os exemplos dos Curdos e Zapatistas são uma poderosa arma para fazer valer nossa capacidade de imaginar uma mudança radical real em uma sociedade, assim como um modelo com o qual podemos aprender em nossas lutas. As estrelas vermelhas que brilham sobre os Chiapas e Rojava vertem luz sobre o caminho à libertação e, se precisarmos resumir em uma palavra o que junta estas duas lutas, ela seria, definitivamente, Autonomia.

Notas:

[i] Dicle, Amed (2015) Kobane Victory, How it Unfolded. URL: http://kurdishquestion.com/index.php/insight-research/analysis/kobane-victory-how-it-unfolded.html

[ii] Dirik, Dilar (2015) Whi Kobane Did Not Fall. URL: http://kurdishquestion.com/index.php/kurdistan/west-kurdistan/why-kobani-did-not-fall.html

[iii] International Brigades Form in Rojava (2014) URL: http://beforeitsnews.com/alternative/2015/01/international-brigades-form-in-rojava-no-pasaran-video-3100250.html

[iv] Marcos (2003) I Shit on All Revolutionary Vanguards on This Planet. URL: http://roarmag.org/2011/02/i-shit-on-all-the-revolutionary-vanguards-of-this-planet/

[v] Oikonomakis, Leonidas (2013) Zapatistas Celebrate 10 Years of Autonomy With Escuelita.   http://roarmag.org/2013/08/escuelita-zapatista-10-year-autonomy/

[vi] Joint Statement of the Academic Delagation to Rojava. URL: https://zcomm.org/znetarticle/joint-statement-of-the-academic-delegation-to-rojava/

[vii] Dirik, Dilar (2014) Western Fascination With “Badass” Kurdish Women. URL:http://www.aljazeera.com/indepth/opinion/2014/10/western-fascination-with-badas-2014102112410527736.html

[viii] Anarchist Federation Statement on Rojava (2014)  URL: http://www.afed.org.uk/blog/international/435-anarchist-federation-statement-on-rojava-december-2014.html

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1 de Maio – Dia do trabalhador – Dia de Luto e luta

22 quarta-feira abr 2015

Posted by litatah in AIT, Anarcosindicalismo, Anarquia, Anti Capitalismo, Anti Consumismo, Anti Fascismo, Antirracismo, CNT-FAI, Cultura, Ditadura, Eventos e Atos, Greve, História, Internacional anarquista, Manifestos, Mártires da Luta, Prática, Primeiro de Maio

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1º de maio, anarco-sindicalismo, anarcos, Federação Nacional dos Trabalhadores Rurais de Portugal, História, história da anarquia, História Social, luta sindical, O TRABALHADOR RURAL, Primeiro de Maio, trabalhadores, trabalhadores rurais

1-de-maio

Fonte: Anarkio.Net

1º de Maio é dia do TRABALHADOR!

“Um dia de rebelião, não de descanso! Um dia não ordenado pelos vozeros arrogantes das instituições que tem aprisionado o mundo do trabalhador! Um dia em que o trabalhador faz suas próprias leis e tem o poder de executá-las! Tudo sem o consentimento nem aprovação dos que oprimem e governam. Um dia em que com tremenda força a unidade do exército dos trabalhadores se mobiliza contra os que hoje dominam o destino dos povos de toda nação. Um dia de protesto contra a opressão e a tirania, contra a ignorância e a guerra de todo tipo. Um dia para começar a desfrutar oito horas de trabalho, oito horas de descanso, oito horas para fazer o que nos dê vontade.”

Essa era a convocatória do 1° de maio de 1886, dia em que 5.000 greves com 340.000 grevistas, se espalharam pelos Estados Unidos. Chicago foi palco de muita luta, repressão, mortes e injustiças. É importante resgatar a memória do 1º de Maio e recuperar a história para entender que o Dia do trabalhador não é dia de festas é o dia de lembrar nossos mortos, dia de luta e resistência!

Trouxemos pⒶra voc’s a história do 1º de Maio, como nasceu este dia e porque(m) ele é comemorado. Este pequeno vídeo relata a verdadeira história do primeiro de Maio e como as lutas dos trabalhadores anarquistas conseguiram a redução da jornada, 8 horas de trabalho, 8 horas de lazer, 8 horas de repouso.

Ao contrário do que os partidos, os sindicatos pelegos, os burgueses e os Estados tentam nos fazer acreditar com seu revisionismo histórico, o primeiro de maio é um dia de origem anarquista, decorrente das agitações pela jornada de trabalho de 8 horas, à qual 5 anarquistas de Chicago deram suas vidas. Há vasta literatura sobre os fatos reais do primeiro de maio, então reproduzimos abaixo um texto sucinto mas bastante informativo.

Maio já foi um mês diferente de qualquer outro. No primeiro dia desse mês as tropas e as polícias ficavam de prontidão, os patrões se preparavam para enfrentar problemas e os trabalhadores não sabiam se no dia 2 teriam emprego, liberdade ou até a vida.

Hoje, tudo isso foi esquecido. A memória histórica dos povos é pior do que a de um octogenário esclerosado, com raros momentos de lucidez, intercalados por longos períodos de amnésia. Poucos são os trabalhadores, ou até os sindicalistas, que conhecem a origem do 1° de maio. Muitos pensam que é um feriado decretado pelo governo, outros imaginam que é um dia santo em homenagem a S. José; existem até aqueles que pensam que foi o seu patrão que inventou um dia especial para a empresa oferecer um churrasco aos “seus” trabalhadores. Também existem – ou existiam – aqueles, que nos países ditos socialistas, pensavam que o 1° de maio era o dia do exército, já que sempre viam as tropas desfilar nesse dia seus aparatos militares para provar o poder do Estado e das burocracias vermelhas.

As origens do 1° de maio prendem-se com a proposta dos trabalhadores organizados na Associação Internacional dos Trabalhadores (AIT) declarar um dia de luta pelas oito horas de trabalho. Mas foram os acontecimentos de Chicago, de 1886, que vieram a dar-lhe o seu definitivo significado de dia internacional de luta dos trabalhadores.

No século XIX era comum (situação que se manteve até aos começos do século XX) o trabalho de crianças, grávidas e trabalhadores ao longo de extenuantes jornadas de trabalho que reproduziam a tradicional jornada de sol-a-sol dos agricultores. Vários reformadores sociais já tinham proposto em várias épocas a ideia de dividir o dia em três períodos: oito horas de trabalho, oito horas de sono e oito horas de lazer e estudo, proposta que, como sempre, era vista como utópica, pelos realistas no poder.

Com o desenvolvimento do associativismo operário, e particularmente do sindicalismo autônomo, a proposta das 8 horas de jornada máxima, tornou-se um dos objetivos centrais das lutas operárias, marcando o imaginário e a cultura operária durante décadas em que foi importante fator de mobilização, mas, ao mesmo tempo, causa da violenta repressão e das inúmeras prisões e mortes de trabalhadores.

Desde a década de 20 do século passado, irromperam em várias locais greves pelas oitos horas, sendo os operários ingleses dos primeiros a declarar greve com esse objetivo. Aos poucos em França e por toda a Europa continental, depois nos EUA e na Austrália, a luta pelas oitos horas tornou-se uma das reivindicações mais freqüentes que os operários colocavam ao Capital e ao Estado.

Quando milhares de trabalhadores de Chicago, tal como de muitas outras cidades americanas, foram para as ruas no 1° de maio de 1886, seguindo os apelos dos sindicatos, não esperavam a tragédia que marcaria para sempre esta data. No dia 4 de maio, durante novas manifestações na Praça Haymarket, uma explosão no meio da manifestação serviu como justificativa para a repressão brutal que seguiu, que provocou mais de 100 mortos e a prisão de dezenas de militantes operários e anarquistas.

Alberto Parsons um dos oradores do comício de Haymarket, conhecido militante anarquista, tipógrafo de 39 anos, que não tinha sido preso durante os acontecimentos, apresentou-se voluntariamente à polícia tendo declarado: “Se é necessário subir também ao cadafalso pelos direitos dos trabalhadores, pela causa da liberdade e para melhorar a sorte dos oprimidos, aqui estou”. Junto com August Spies, tipógrafo de 32 anos, Adolf Fischer tipógrafo de 31 anos, George Engel tipógrafo de 51 anos, Ludwig Lingg, carpinteiro de 23 anos, Michael Schwab, encadernador de 34 anos, Samuel Fielden, operário têxtil de 39 anos e Oscar Neeb seriam julgados e condenados. Tendo os quatro primeiros sido condenados à forca, Parsons, Fischer, Spies e Engel executados em 11 de novembro de 1887, enquanto Lingg se suicidou na cela. Augusto Spies declarou profeticamente, antes de morrer: “Virá o dia em que o nosso silêncio será mais poderoso que as vozes que nos estrangulais hoje”.

Este episódio marcante do sindicalismo, conhecido como os “Mártires de Chicago”, tornou-se o símbolo e marco para uma luta que a partir daí se generalizaria por todo o mundo.

O crime do Estado americano, idêntico ao de muitos outros Estados, que continuaram durante muitas décadas a reprimir as lutas operárias, inclusive as manifestações de 1° de maio, era produto de sociedades onde os interesses dominantes não necessitavam sequer ser dissimulados. Na época, o Chicago Times afirmava: “A prisão e os trabalhos forçados são a única solução adequada para a questão social”, mas outros jornais eram ainda mais explícitos como o New York Tribune: “Estes brutos [os operários] só compreendem a força, uma força que possam recordar durante várias gerações…”

Seis anos mais tarde, em 1893, a condenação seria anulada e reconhecido o caráter político e persecutório do julgamento, sendo então libertados os réus ainda presos, numa manifestação comum do reconhecimento tardio do terror de Estado, que se viria a repetir no também célebre episódio de Sacco e Vanzetti.

A partir da década de 90, com a decisão do Congresso de 1888 da Federação do Trabalho Americana e do Congresso Socialista de Paris, de 1889, declararem o primeiro de maio como dia internacional de luta dos trabalhadores, o sindicalismo em todo o mundo adotou essa data simbólica, mesmo se mantendo até ao nosso século como um feriado ilegal, que sempre gerava conflitos e repressão.

Segundo o historiador do movimento operário, Edgar Rodrigues, a primeira tentativa de comemorar o 1 de maio no Brasil foi em 1894, em São Paulo, por iniciativa do anarquista italiano Artur Campagnoli, iniciativa frustrada pelas prisões desencadeadas pela polícia. No entanto, na década seguinte, iniciaram-se as comemorações do 1 de maio em várias cidades, sendo publicados vários jornais especiais dedicados ao dia dos trabalhadores e números especiais da imprensa operária comemorando a data. São Paulo, Santos, Porto Alegre, Pelotas, Curitiba e Rio de Janeiro foram alguns dos centros urbanos onde o nascente sindicalismo brasileiro todos os anos comemorava esse dia à margem da legalidade dominante.

Foram décadas de luta dos trabalhadores para consolidar a liberdade de organização e expressão, que a Revolução Francesa havia prometido aos cidadãos, mas que só havia concedido na prática à burguesia, que pretendia guardar para si os privilégios do velho regime.

Um após outro, os países, tiveram de reconhecer aos novos descamisados seus direitos. O 1° de maio tornou-se então um dia a mais do calendário civil, sob o inócuo título de feriado nacional, como se décadas de lutas, prisões e mortes se tornassem então um detalhe secundário de uma data concedida de forma benevolente, pelo Capital e pelo Estado em nome de S. José ou do dia, não dos trabalhadores, mas numa curiosa contradição, como dia do trabalho. Hoje, olhando os manuais de história e os discursos políticos, parece que os direitos sociais dos trabalhadores foram uma concessão generosa do Estado do Bem-Estar Social ou, pior ainda, de autoritários “pais dos pobres” do tipo de Vargas ou Perón.

Quanto às oitos horas de trabalho, essa reivindicação que daria origem ao 1º de maio, adquiriu status de lei, oficializando o que o movimento social tinha já proclamado contra a lei. Mas passado mais de um século, num mundo totalmente diferente, com todos os progressos tecnológicos e da automação, que permitiram ampliar a produtividade do trabalho a níveis inimagináveis, as oitos horas persistem ainda como jornada de trabalho de largos setores de assalariados! Sem que o objetivo das seis ou quatro horas de trabalho se tornem um ponto central do sindicalismo, também ele vítima de uma decadência irrecuperável, numa sociedade onde cada vez menos trabalhadores terão trabalho e onde a mutação para uma sociedade pós-salarial se irá impor como dilema de futuro. Exigindo a distribuição do trabalho e da riqueza segundo critérios de eqüidade social que o movimento operário e social apontou ao longo de mais de um século de lutas.
*Membro do Centro de Estudos Cultura e Cidadania – Florianópolis (CECCA)

1ª de maio por Eduardo Galeano.

“A desmemoria/4

Chicago está cheia de fábricas. Existem fábricas até no centro da cidade, ao redor do edifício mais alto do mundo. Chicago está cheia de fábricas, Chicago está cheia de operários.
Ao chegar ao bairro de Haymarket, peço aos meus amigos que me mostrem o lugar onde foram enforcados, em 1886, aqueles operários que o mundo inteiro saúda a cada primeiro de maio.
– Deve ser por aqui – me dizem. Mas ninguém sabe. Não foi erguida nenhuma estátua em memória dos mártires de Chicago na cidade Chicago. Nem estátua, nem monólito, nem placa de bronze, nem nada.
O primeiro de maio é o único dia verdadeiramente universal da humanidade inteira, o único dia no qual coincidem todas as histórias e todas as geografias, todas as línguas e as religiões e as culturas do mundo; mas nos Estados Unidos, o primeiro de maio é um dia como qualquer outro. Nesse dia, as pessoas trabalham normalmente, e ninguém, ou quase ninguém, recorda que os direitos da classe operária não brotaram do vento, ou da mão de Deus ou do amo.
Após a inútil exploração de Haymarket, meus amigos me levam para conhecer a melhor livraria da cidade. E lá, por pura curiosidade, por pura casualidade, descubro um velho cartaz que está como que esperando por mim, metido entre muitos outros cartazes de música, rock e cinema.
O cartaz reproduz um provérbio da África: Até que os leões tenham seus próprios historiadores, as histórias de caçadas continuarão glorificando o caçador.”
Página 115/116, “O livro dos Abraços”.

DIA DE MAIO – DIA INTERNACIONAL DO TRABALHO – A HISTÓRIA

1 de Maio, Dia Internacional dos Trabalhadores, comemora a luta histórica da classe trabalhadora em todo o mundo, e é reconhecido na maioria dos países. Os Estados Unidos da América e Canadá estão entre as exceções. Isso apesar do fato de que o feriado começou na década de 1880 nos EUA, ligadas a batalha pela jornada de oito horas , e os anarquistas de Chicago .

A luta pela jornada de oito horas começou na década de 1860. Em 1884, a Federação de Negócios organizada e Sindicatos dos Estados Unidos e do Canadá , organizado em 1881 (e mudando seu nome em 1886 para Federação Americana do Trabalho ) aprovou uma resolução que afirmava que “oito horas constituirão um dia de trabalho legal de partir e após 1 de Maio de 1886, e que nós recomendamos para organizações de trabalho em todo este distrito que eles assim direcionar suas leis como se conformar com esta resolução ” . No ano seguinte, a Federação repetiu a declaração de que um sistema de oito horas era para entrar em vigor em 1 de Maio de 1886. Com trabalhadores sendo forçados a trabalhar dez, doze e quatorze horas por dia, apoio ao movimento de oito horas cresceu rapidamente . Nos meses anteriores a 1 de Maio de 1886, milhares de trabalhadores, organizados e não organizados, os membros da organização Cavaleiros do Trabalho e da federação, foram atraídos para a luta. Chicago foi o principal centro da agitação por um dia mais curto. Os anarquistas estavam na vanguarda do Sindicato Central de Chicago, que consistia de 22 sindicatos em 1886, entre eles os sete maiores da cidade.

Durante as greves da estrada de ferro de 1877, os trabalhadores haviam sido violentamente atacada pela polícia e exército dos Estados Unidos. Uma tática semelhante de terrorismo de Estado foi preparado pela burocracia para combater o movimento de oito horas. A polícia e da Guarda Nacional foram aumentados em tamanho e recebeu armas novas e poderosas financiados por empresários locais. Do Clube Comercial de Chicago comprou uma metralhadora $ 2000 para a Guarda Nacional de Illinois para ser usado contra os grevistas. No entanto, até 1 º de maio, o movimento já havia vencido os ganhos para muitos trabalhadores de Chicago. Mas em 3 de maio de 1886, a polícia disparou contra uma multidão de grevistas no McCormick Harvester Machine Company, matando pelo menos um atacante, ferindo gravemente cinco ou seis outros, e ferindo um número indeterminado. Anarquistas convocaram uma reunião em massa no dia seguinte em Haymarket Square para protestar contra a brutalidade.

A reunião transcorreu sem incidentes, e pelo tempo que o último orador estava na plataforma, a reunião das chuvas já estava terminando, com apenas cerca de duas centenas de pessoas restantes. Foi então uma coluna policial de 180 homens marcharam para a praça e ordenou a reunião a se dispersar. Ao final da reunião, uma bomba foi atirada na polícia, matando um instantaneamente, outras seis pessoas morreram depois. Cerca de setenta policiais foram feridos. A polícia respondeu disparando contra a multidão. Quantos civis foram feridos ou mortos desde bullits polícia nunca foi apurado exatamente. Embora nunca foi determinado que jogou a bomba, o incidente foi usado como uma desculpa para atacar os anarquistas e do movimento dos trabalhadores em geral. Polícia saquearam as casas e escritórios dos suspeitos radicais, e centenas foram presos sem acusação. Um reinado de terror da polícia varreu Chicago. Encenação “raids” nos bairros operários, a polícia arredondado para cima todos os anarquistas conhecidos e outros socialistas. “Faça as incursões em primeiro lugar e olhar para cima a lei depois!” aconselhou publicamente o advogado do Estado.

Os anarquistas, em especial, foram perseguidos, e oito de Chicago de mais ativos foram acusados ​​de conspiração para assassinato em conexão com o bombardeio de Haymarket. Um tribunal canguru encontrados todos os oito culpados, apesar da falta de evidência de ligar qualquer um deles para a bomba-chamas, e eles foram condenados a morrer. Em 09 de outubro de 1886, a revista semanal Cavaleiros do Trabalho publicado em Chicago, realizada na página 1 o seguinte anúncio: “Na próxima semana vamos começar a publicação das vidas dos anarquistas anunciados em outra coluna.”

O anúncio, realizado na página 14, leia-se: ” A história de anarquistas , contadas por eles próprios; Parsons, Spies, Fielden, Schwab, Fischer, Lingg, Engle, Neebe A única verdadeira história dos homens que afirmam que eles são. condenado a sofrer a morte para o exercício do direito de liberdade de expressão : a sua associação com o trabalho, socialista e anarquista Sociedades, seus pontos de vista quanto aos objetivos e objetos dessas organizações, e como eles esperam para realizá-los, também a sua ligação com o Chicago Haymarket caso . Cada homem é o autor de sua própria história, que aparecerá apenas nos “Cavaleiros do Trabalho” , durante os próximos três meses, – o grande papel de trabalho dos Estados Unidos, um de 16 páginas semanário, que contém todas as últimas estrangeira e notícias de trabalho doméstico do dia, histórias, dicas domésticas, etc Um papel cooperativo possuído e controlado por membros dos Cavaleiros do Trabalho , e mobilado para a pequena quantia de US $ 1,00 por ano . Adress todas as comunicações para Cavaleiros do Trabalho Publishing Company , 163 Washington St., Chicago, Illinois ” Ainda este jornal e do papel de alarme publicou as autobiografias dos homens Haymarket.

Albert Parsons, August Spies, Adolf Fischer e George Engel foram enforcados em 11 de Novembro de 1887. Louis Lingg se suicidou na prisão. As autoridades entregue os corpos para os amigos para o enterro, e um dos maiores cortejos fúnebres da história do Chicago foi realizada. Estima-se que entre 150.000 a 500.000 pessoas alinharam a rota seguida pelo cortejo fúnebre dos mártires de Haymarket. Um monumento aos homens executados foi revelado 25 de junho de 1893 no cemitério Waldheim em Chicago. Os três restantes, Samuel Fielden, Oscar Neebe e Michael Schwab, foram finalmente perdoados em 1893.

Em 26 de junho de 1893, o governador de Illinois, John Peter Altgeld, emitiu a mensagem perdão em que ele deixou claro que ele não estava concedendo o perdão, porque ele acreditava que os homens tinham sofrido o suficiente, mas porque eles eram inocentes do crime para o qual havia sido julgado, e que eles e os homens enforcados haviam sido vítimas de histeria, os júris embalados e um juiz preconceituoso. Ele observou que os réus não foram provados culpados, porque o Estado “nunca descobriu quem foi que jogou a bomba que matou o policial, e as evidências não mostram qualquer ligação entre os réus eo homem que atirou nele.”

Dia Internacional dos Trabalhadores é a comemoração do evento Revolta de Haymarket , em Chicago , em 1886. Em 1889, o primeiro congresso da Segunda Internacional, reunião em Paris para o centenário da Revolução Francesa e da Exposição Universal (1889) , na sequência de uma iniciativa do Federação Americana do Trabalho , convocaram protestos internacionais em 1890 aniversário dos protestos de Chicago. Estes foram tão bem sucedidos que May Day foi formalmente reconhecida como um evento anual no segundo congresso da Internacional em 1891.

Não é de surpreender que o Estado, líderes empresariais, dirigentes sindicais mainstream, e os meios de comunicação querem esconder a verdadeira história do Primeiro de Maio. Na sua tentativa de apagar a história eo significado do Dia de maio, o governo dos Estados Unidos declarou 01 de maio como “Lei Day”, e deu os trabalhadores em vez do Dia do Trabalho, a primeira segunda-feira de Setembro – um feriado desprovido de qualquer significado histórico.

No entanto, em vez de suprimir os movimentos operários e anarquistas, os acontecimentos de 1886 ea execução dos anarquistas de Chicago, os porta-vozes do movimento para a jornada de oito horas, mobilizou muitas gerações de radicais. Emma Goldman, um jovem imigrante na época, depois apontou para o caso de Haymarket como o seu nascimento político. Em vez de desaparecer, o movimento anarquista apenas cresceu na esteira de Haymarket.

Como trabalhadores, devemos reconhecer e comemorar o Dia de maio, não só pela sua importância histórica, mas também como um tempo para organizar em torno de questões de importância vital de hoje para a classe trabalhadora em sentido lato, ou seja, as bases – as pessoas vistas como uma classe em contraste com os superiores de renda e / ou classificação – economicamente e / ou políticos / administrativos.

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As Origens Trágicas e Esquecidas do Primeiro de Maio

22 quarta-feira abr 2015

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Por Jorge E. Silva – Membro do Centro de Estudos Cultura e Cidadania – Florianópolis (CECCA)

Fonte: Insurgentes

Maio já foi um mês diferente de qualquer outro. No primeiro dia desse mês as tropas e as polícias ficavam de prontidão, os patrões se preparavam para enfrentar problemas e os trabalhadores não sabiam se no dia 2 teriam emprego, liberdade ou até a vida.

Hoje, tudo isso foi esquecido. A memória histórica dos povos é pior do que a de um octogenário esclerosado, com raros momentos de lucidez, intercalados por longos períodos de amnésia. Poucos são os trabalhadores, ou até os sindicalistas, que conhecem a origem do 1° de maio. Muitos pensam que é um feriado decretado pelo governo, outros imaginam que é um dia santo em homenagem a S. José; existem até aqueles que pensam que foi o seu patrão que inventou um dia especial para a empresa oferecer um churrasco aos “seus” trabalhadores. Também existem – ou existiam – aqueles, que nos países ditos socialistas, pensavam que o 1° de maio era o dia do exército, já que sempre viam as tropas desfilar nesse dia seus aparatos militares para provar o poder do Estado e das burocracias vermelhas.

As origens do 1° de maio prendem-se com a proposta dos trabalhadores organizados na Associação Internacional dos Trabalhadores (AIT) declarar um dia de luta pelas oito horas de trabalho. Mas foram os acontecimentos de Chicago, de 1886, que vieram a dar-lhe o seu definitivo significado de dia internacional de luta dos trabalhadores.

No século XIX era comum (situação que se manteve até aos começos do século XX) o trabalho de crianças, grávidas e trabalhadores ao longo de extenuantes jornadas de trabalho que reproduziam a tradicional jornada de sol-a-sol dos agricultores. Vários reformadores sociais já tinham proposto em várias épocas a idéia de dividir o dia em três períodos: oito horas de trabalho, oito horas de sono e oito horas de lazer e estudo, proposta que, como sempre, era vista como utópica, pelos realistas no poder.

Com o desenvolvimento do associativismo operário, e particularmente do sindicalismo autônomo, a proposta das 8 horas de jornada máxima, tornou-se um dos objetivos centrais das lutas operárias, marcando o imaginário e a cultura operária durante décadas em que foi importante fator de mobilização, mas, ao mesmo tempo, causa da violenta repressão e das inúmeras prisões e mortes de trabalhadores.

Desde a década de 20 do século passado, irromperam em várias locais greves pelas oitos horas, sendo os operários ingleses dos primeiros a declarar greve com esse objetivo. Aos poucos em França e por toda a Europa continental, depois nos EUA e na Austrália, a luta pelas oitos horas tornou-se uma das reivindicações mais freqüentes que os operários colocavam ao Capital e ao Estado.

Quando milhares de trabalhadores de Chicago, tal como de muitas outras cidades americanas, foram para as ruas no 1° de maio de 1886, seguindo os apelos dos sindicatos, não esperavam a tragédia que marcaria para sempre esta data. No dia 4 de maio, durante novas manifestações na Praça Haymarket, uma explosão no meio da manifestação serviu como justificativa para a repressão brutal que seguiu, que provocou mais de 100 mortos e a prisão de dezenas de militantes operários e anarquistas.

Alberto Parsons um dos oradores do comício de Haymarket, conhecido militante anarquista, tipógrafo de 39 anos, que não tinha sido preso durante os acontecimentos, apresentou-se voluntariamente à polícia tendo declarado: “Se é necessário subir também ao cadafalso pelos direitos dos trabalhadores, pela causa da liberdade e para melhorar a sorte dos oprimidos, aqui estou”. Junto com August Spies, tipógrafo de 32 anos, Adolf Fischer tipógrafo de 31 anos, George Engel tipógrafo de 51 anos, Ludwig Lingg, carpinteiro de 23 anos, Michael Schwab, encadernador de 34 anos, Samuel Fielden, operário têxtil de 39 anos e Oscar Neeb seriam julgados e condenados. Tendo os quatro primeiros sido condenados à forca, Parsons, Fischer, Spies e Engel executados em 11 de novembro de 1887, enquanto Lingg se suicidou na cela. Augusto Spies declarou profeticamente, antes de morrer: “Virá o dia em que o nosso silêncio será mais poderoso que as vozes que nos estrangulais hoje”.

Este episódio marcante do sindicalismo, conhecido como os “Mártires de Chicago”, tornou-se o símbolo e marco para uma luta que a partir daí se generalizaria por todo o mundo.

O crime do Estado americano, idêntico ao de muitos outros Estados, que continuaram durante muitas décadas a reprimir as lutas operárias, inclusive as manifestações de 1° de maio, era produto de sociedades onde os interesses dominantes não necessitavam sequer ser dissimulados. Na época, o Chicago Times afirmava: “A prisão e os trabalhos forçados são a única solução adequada para a questão social”, mas outros jornais eram ainda mais explícitos como o New York Tribune: “Estes brutos [os operários] só compreendem a força, uma força que possam recordar durante várias gerações…”

Seis anos mais tarde, em 1893, a condenação seria anulada e reconhecido o caráter político e persecutório do julgamento, sendo então libertados os réus ainda presos, numa manifestação comum do reconhecimento tardio do terror de Estado, que se viria a repetir no também célebre episódio de Sacco e Vanzetti.

A partir da década de 90, com a decisão do Congresso de 1888 da Federação do Trabalho Americana e do Congresso Socialista de Paris, de 1889, declararem o primeiro de maio como dia internacional de luta dos trabalhadores, o sindicalismo em todo o mundo adotou essa data simbólica, mesmo se mantendo até ao nosso século como um feriado ilegal, que sempre gerava conflitos e repressão.

Segundo o historiador do movimento operário, Edgar Rodrigues, a primeira tentativa de comemorar o 1 de maio no Brasil foi em 1894, em São Paulo, por iniciativa do anarquista italiano Artur Campagnoli, iniciativa frustrada pelas prisões desencadeadas pela polícia. No entanto, na década seguinte, iniciaram-se as comemorações do 1 de maio em várias cidades, sendo publicados vários jornais especiais dedicados ao dia dos trabalhadores e números especiais da imprensa operária comemorando a data. São Paulo, Santos, Porto Alegre, Pelotas, Curitiba e Rio de Janeiro foram alguns dos centros urbanos onde o nascente sindicalismo brasileiro todos os anos comemorava esse dia à margem da legalidade dominante.

Foram décadas de luta dos trabalhadores para consolidar a liberdade de organização e expressão, que a Revolução Francesa havia prometido aos cidadãos, mas que só havia concedido na prática à burguesia, que pretendia guardar para si os privilégios do velho regime.

Um após outro, os países, tiveram de reconhecer aos novos descamisados seus direitos. O 1° de maio tornou-se então um dia a mais do calendário civil, sob o inócuo título de feriado nacional, como se décadas de lutas, prisões e mortes se tornassem então um detalhe secundário de uma data concedida de forma benevolente, pelo Capital e pelo Estado em nome de S. José ou do dia, não dos trabalhadores, mas numa curiosa contradição, como dia do trabalho. Hoje, olhando os manuais de história e os discursos políticos, parece que os direitos sociais dos trabalhadores foram uma concessão generosa do Estado do Bem-Estar Social ou, pior ainda, de autoritários “pais dos pobres” do tipo de Vargas ou Perón.

Quanto às oitos horas de trabalho, essa reivindicação que daria origem ao 1º de maio, adquiriu status de lei, oficializando o que o movimento social tinha já proclamado contra a lei. Mas passado mais de um século, num mundo totalmente diferente, com todos os progressos tecnológicos e da automação, que permitiram ampliar a produtividade do trabalho a níveis inimagináveis, as oitos horas persistem ainda como jornada de trabalho de largos setores de assalariados! Sem que o objetivo das seis ou quatro horas de trabalho se tornem um ponto central do sindicalismo, também ele vítima de uma decadência irrecuperável, numa sociedade onde cada vez menos trabalhadores terão trabalho e onde a mutação para uma sociedade pós-salarial se irá impor como dilema de futuro. Exigindo a distribuição do trabalho e da riqueza segundo critérios de eqüidade social que o movimento operário e social apontou ao longo de mais de um século de lutas.

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Milton Lopes. “Anarquismo e Primeiro de Maio no Brasil”

22 quarta-feira abr 2015

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1-de-maio-no-rj-1919-revista-da-semana-10-de-maio-1919

Fonte: Instituto de História e Teoria Anarquista

À partir da análise da relação do Primeiro de Maio, o movimento operário e o anarquismo no Brasil, Lopes debate criticamente as apropriações e as construção de significados nessa data, tendo como pano de fundo momentos-chaves e dilemas políticos da classe trabalhadora no país. Servindo-se de um amplo corpus documental de jornais, periódicos operários e anarquistas, o pesquisador analisa a conformação da data no Rio de Janeiro, São Paulo, Rio Grande do Sul, Paraná, Recife, Amazonas e outros estados. Da consolidação das primeiras comemorações do Primeiro de Maio na Primeira República (1889-1932), às divergências internas com os comunistas, passando pelos deslocamentos de sentido operados pela disputa com o Estado getulista (1932-1945) e a tentativa de retomada dos significados anarquistas e sindicalistas revolucionários da data (1946-1964), o texto explicita a importância do elemento simbólico como um aglutinador de determinados projetos políticos.

* Baixe o artigo completo aqui: Milton Lopes – Anarquismo e Primeiro de Maio no Brasil

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